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A ESCRAVA ISAURA - BERNARDO GUIMARAES

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maluquices.<br />

— Malucos são vocês. O meu jogo é este... mas quanto me dão para<br />

descobri-lo? Olhem que é coisa curiosa.<br />

— Queres-nos atiçar a curiosidade para nos chuchar alguns cobres, não é<br />

assim?... pois desta vez afianço-te da minha parte, que não arranjas nada. Vai-te<br />

aos diabos com o teu jogo, e deixa-nos cá com o nosso. As cartas, meus amigos, e<br />

deixemos o Martinho com suas maluquices.<br />

— Com suas velhacarias, dirás tu... não me pilha.<br />

— Ah! Toleirões! — exclamou o Martinho, — vocês ainda estão com os<br />

beiços com que mamaram. Andem cá, andem, e verão se é maluquice, nem<br />

velhacaria. Enfim quero mostrar-lhes o meu jogo, porque desejo ver se a opinião de<br />

vocês estará ou não de acordo com a minha. Eis aqui a minha bisca. — concluiu<br />

Martinho mostrando um papel, que sacou da algibeira; — não é nada mais que um<br />

anúncio de escravo fugido.<br />

— Ah! Ah! Ah! Esta não é má!...<br />

— Que disparate!... decididamente estás louco, meu Martinho.<br />

— A que propósito vem agora anúncio de escravo fugido?...<br />

— Foste acaso nomeado oficial de justiça ou capitão-do-mato?<br />

Estas e outras frases escapavam aos mancebos de envolta, em um coro de<br />

intermináveis gargalhadas, que competiam com a orquestra do baile.<br />

— Não sei de que tanto se espantam, — replicou frescamente o Martinho;<br />

— o que admira é que ainda não vissem este grande anúncio em avulso, que veio<br />

do Rio de Janeiro, e foi distribuído por toda a cidade com o jornal do Comércio.<br />

— Porventura somos esbirros ou oficiais de justiça, para nos embaraçarmos<br />

com semelhantes anúncios?<br />

— Mas olhem que o negócio é dos mais curiosos, e as alvíssaras não são<br />

para se desprezarem.<br />

— Pobre Martinho! Quanto pode em teu espírito a ganância de ouro, que<br />

faz-te andar à cata de escravos fugidos em uma sala de baile! — pois é aqui que<br />

poderás encontrar semelhante gente?...<br />

— Olé... quem sabe?!... tenho cá meus motivos para desconfiar que por<br />

aqui mesmo hei de achá-la, assim como os cinco continhos que, aqui entre nós, vêm<br />

agora mesmo ao pintar, pois que o armazém de meu sócio bem pouco tem rendido<br />

nestes últimos tempos.<br />

Martinho chamava armazém à pequena taverna de que era sócio Ditas<br />

aquelas palavras foi postar-se junto à porta que dava para o salão e ali ficou por<br />

largo tempo a olhar, ora para os que dançavam, ora para o anúncio, que tinha<br />

desdobrado na mão, como quem averigua e confronta os sinais.<br />

— Que diabo faz ali o Martinho? — exclamou um dos mancebos que<br />

entretidos com as mímicas do Martinho, tomando-as por palhaçadas, tinham-se<br />

esquecido de jogar.<br />

— Está doido, não resta a menor dúvida. — observou outro. — Procurar<br />

escravo fugido em uma sala de baile!... Ora não faltava mais nada! Se andasse à<br />

cata de alguma princesa, decerto a iria procurar no quilombos.<br />

— Mas talvez seja algum pajem, ou alguma mucama, que por ai anda.<br />

— Não me consta que haja nenhum pajem nem mucama ali dançando, e ele<br />

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