09.04.2017 Views

A ESCRAVA ISAURA - BERNARDO GUIMARAES

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

www.nead.unama.br<br />

— Oh! Princesa de meu coração! — exclamou ele atracando-se ás pernas<br />

da pobre escrava, que fraca como estava, quase foi à terra com a força daquela<br />

furiosa e entusiástica atracação. Era para fazer rebentar de riso, a quem não<br />

soubesse quanto havia de trágico e doloroso no fundo daquela ímpia e ignóbil farsa.<br />

— Isaura!... não olhas para mim? Aqui tens a teus pés este teu menor<br />

cativo, Belchior!... olha para ele, para este teu adorador, que hoje é mais do que um<br />

príncipe... dá cá essa mãozinha, deixa-me comê-la de beijos...<br />

— Meu Deus! Que farsa hedionda obrigam-me a representar! -murmurou<br />

Isaura consigo, e voltando a face abandonou a mão a Belchior, que colando a ela a<br />

boca no transporte do entusiasmo, desatou a chorar como uma criança.<br />

— Olha que palerma! — disse André para Rosa, que observava de parte<br />

aquela cena tragicômica. — E venham cá dizer-me que não é o mel para a boca do<br />

asno!<br />

— Eu antes queria que me casassem com um jacaré.<br />

— Este meu sinhô moço tem idéias do diabo! Quem havia de lembrar-se de<br />

casar uma sereia com um boto?<br />

— Invejoso!... você é que queria ser o boto, por isso está aí a torcer o nariz.<br />

Toma!... bem feito!... agora o que faltava era que o nhonhô te desse de dote à<br />

Isaura.<br />

— Isso queria eu!... aposto que Isaura não vai casar de livre vontade! e<br />

depois... nós cá nos arranjaríamos... havia de enfiar o boto pelo fundo de uma<br />

agulha.<br />

— Sai daí, tolo!... pensa que Isaura faz caso de você?...<br />

— Não te arrebites, minha Rosa; já agora não há remédio senão contentarme<br />

contigo, que em fim de contas também és bem bonitinha, e... tudo que cai no<br />

jequi, é peixe.<br />

— É baixo!... agüente a sua tábua, e vá consolar-se com quem quiser,<br />

menos comigo.<br />

CAPÍTULO XXI<br />

— Então, Leôncio, — dizia Malvina a seu esposo no outro dia pela manhã,<br />

— deste as providências necessárias para arranjar-se esse negócio hoje mesmo?<br />

— Creio que é a centésima vez que me fazes essa pergunta, Malvina, —<br />

respondeu Leôncio sorrindo-se. — Todavia pela centésima vez te responderei<br />

também, que as providências que estão da minha parte, já foram todas dadas.<br />

Ontem mesmo mandei um próprio a Campos, e não tardarão a chegar por aí o<br />

tabelião para passar escritura de liberdade a Isaura com toda a solenidade, e<br />

também o padre para celebrar o casamento. Bem vês que de nada me esqueci.<br />

Tratem de estar todos prontos; e tu, Malvina, manda já preparar a capela para se<br />

efetuar esse casamento, que pareces desejar com mais ardor, — acrescentou<br />

sorrindo, — do que desejaste o teu próprio.<br />

Malvina saiu do salão, deixando Leôncio em companhia de um terceiro<br />

personagem, que também ali se achava, por nome Jorge, a quem o leitor ainda não<br />

conhece. Dizendo que era um parasita, ainda não temos dito tudo.<br />

Este gênero contém muitas variedades, e mesmo cada indivíduo tem sua<br />

cor e feição particular. Era um homem bem apessoado, espirituoso serviçal, cheio de<br />

cortesia e amabilidade, condições indispensáveis a um bom parasita. Jorge não vivia<br />

93

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!