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A ESCRAVA ISAURA - BERNARDO GUIMARAES

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habilidade. E depois?<br />

— E depois comunico tudo isso ao chefe de policia, declaro-lhe que nada<br />

mais tenho com esse negócio, passo a procuração a qualquer meirinho, ou capitãodo-mato,<br />

que se queira encarregar dessa diligência, e em ato contínuo escrevo ao<br />

senhor da escrava comunicando-lhe o meu engano, com o que ele por certo<br />

desistirá de procurá-la mais por aqui, e levará a outras partes as suas pesquisas.<br />

Que tal acha o meu plano?...<br />

— Admirável, e cumpre não perdermos tempo, senhor Martinho.<br />

— Vou já neste andar, e em menos de duas horas estou aqui de volta, a dar<br />

parte do desempenho de minha comissão.<br />

— Aqui não, que não poderei demorar-me muito. Espero-o em minha casa,<br />

e lá receberá a soma convencionada.<br />

— Podem-se retirar, — disse Martinho ao oficial de justiça e aos guardas,<br />

que se achavam postados do lado de fora da porta. – Sua presença não é mais<br />

necessária aqui. Não há dúvida! — continuou ele consigo mesmo: — isto vai a<br />

dobrar como no lansquenê. Esta escrava é uma mina, que me parece não estar<br />

ainda esgotada.<br />

E retirou-se, esfregando as mãos de contentamento.<br />

— Então, que arranjo fizeste com o homem, meu Álvaro? — perguntou<br />

Geraldo, apenas Martinho voltou as costas.<br />

— Excelente, — respondeu Álvaro; — a minha lembrança surtiu o desejado<br />

efeito, e ainda mais do que eu esperava.<br />

Álvaro em poucas palavras deu conta ao seu amigo do mercado que fizera<br />

com o Martinho.<br />

— Que caráter desprezível e abjeto o deste Martinho! — exclamou Geraldo.<br />

— De um tal instrumento não se pode esperar obra que preste. E julgas ter<br />

conseguido muita coisa, Álvaro, com o passo que acabas de dar?...<br />

— Não muito, porém alguma coisa sempre posso conseguir. Pelo menos<br />

consigo deter o golpe por algum tempo, e como diz lá o rifão popular, meu Geraldo,<br />

enquanto o pau vai e vem, folgam as costas.<br />

Enquanto Leôncio, persuadido que a sua escrava não se acha aqui no<br />

Recife, a procura por todo esse mundo, ela fica aqui tranqüilamente à minha sombra,<br />

livre das perseguições e dos maus-tratos de um bárbaro senhor; e eu terei tempo<br />

para ativar os meios de arranjar provas e documentos que justifiquem o seu direito à<br />

liberdade. É quanto me basta por agora; quanto ao resto, já que pareces julgar a<br />

minha causa irremissivelmente perdida, a justiça divina me inspirará o modo por que<br />

devo proceder.<br />

— Como te enganas, meu pobre Álvaro!... cuidas que arredando o Martinho<br />

ficas por enquanto livre de perseguições e pesquisas contra a tua protegida? Que<br />

cegueira!... não faltarão malsins igualmente esganados por dinheiro, que pelos cinco<br />

contos de réis, que para estes miseráveis é uma soma fabulosa, se ponham à cata<br />

de tão preciosa presa. Agora principalmente, que o Martinho deu o alarma, e que<br />

esse negócio tem atingido a um certo grau de celebridade, em vez de um,<br />

aparecerão cem Martinhos no encalço da bela fugitiva, e não terão mais que fazer<br />

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