Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Tudo começou em 2010. Caí de<br />
pára-quedas em um verdadeiro<br />
campo de batalhas. Há muito<br />
tempo os esportes de endurance<br />
vêm mexendo com minha imaginação,<br />
e com boa parte das pessoas que<br />
descobrem, aos poucos, a fantástica<br />
máquina que é o corpo humano.<br />
Tentei as ultramaratonas à pé, corri<br />
quatro, sendo uma delas de 120km.<br />
Bom, mas machuca muito. Tentei as<br />
corridas de aventura, as provas de multisport,<br />
escalada em alta montanha,<br />
mas pedalar 600 km de moutain bike<br />
em uma semana sempre esteve um<br />
passo além. Longe da minha realidade.<br />
Já tinha ouvido falar da mãe das stage<br />
races, La Ruta De Los Conquistadores -<br />
na Costa Rica. E do Cape Epic na África do<br />
Sul. E do TransAlp, na Europa. Mas nunca<br />
me aproximei. Nunca me deixei seduzir.<br />
Até que me vi, completamente perdido,<br />
na bucólica Mucugê - BA. Como um cachorro<br />
que cai do caminhão de mudança,<br />
ainda me lembro da sensação. Aos<br />
pés de uma bela montanha, vizinho de<br />
um cemitério em estilo bizantino em<br />
plena Chapada Diamantina, boquiaberto,<br />
entre as tendas do acampamento<br />
base. Cheguei onde sempre quis estar,<br />
foi a conclusão óbvia.<br />
Mais de 20 países representados. Atletas<br />
da corrida de aventura, do triatlo,<br />
do mountain bike. E dezenas de desavisados,<br />
como eu.<br />
Cinco anos se passaram. E o encontro<br />
daquele dia permanece vívido. Estive<br />
em todas as edições da ultramaratona<br />
de mountain bike mais difícil do planeta.<br />
E garanto: não há nada melhor<br />
acontecendo no universo das duas rodas<br />
que reúna atletas profissionais e<br />
amadores no mesmo grid de largada.<br />
Objetivos e estratégias completamente<br />
diferentes, venerando um objeto único,<br />
realizador de sonhos: a bicicleta.<br />
Ouvi de atletas do set mundial, como<br />
Christoph Sauser (Suíça) e Rebecca Rush<br />
(EUA), e testemunhei eu mesmo em provas<br />
internacionais: não há competição<br />
mais dura que o Brasil Ride. Na África, por<br />
exemplo, o principal evento mundial, com<br />
200km a mais e 1 dia extra, não sofremos<br />
tanto. Talvez em razão do clima que<br />
oscila absurdamente várias vezes por<br />
dia. E certamente em razão das trilhas,<br />
feitas para bicicletas, com toda intervenção<br />
humana possível e imaginável. Parece<br />
fluir com mais naturalidade.<br />
Enquanto isso, transitando entre os campos<br />
de altitude e rock gardens do alto da<br />
Chapada e a caatinga em sua essência,<br />
no entorno das serras, aproveitando caminhos<br />
naturais e trilhas centenárias<br />
da época da mineração de diamantes do<br />
Brasil Colônia, o Brasil Ride nos leva a explorar<br />
cenários de contrastes.<br />
Hora nas gerais, com falso-plano e retas<br />
intermináveis de areião, noutras<br />
em trilhas cinematográficas. Algumas<br />
vezes atravessando rios, e inegáveis<br />
banhos de cachoeira no meio da prova.<br />
Às vezes na garoa fina da madrugada,<br />
sob neblina intensa, noutras cercados<br />
de espinhos e ossadas de animais,<br />
castigados à morte pela dureza da vida<br />
no Sertão. E por falar em dureza, horas<br />
a fio pedalando sob o sol escaldante,<br />
que em 2014 alcançou impensáveis<br />
56 . Quando bate um vento, queima o<br />
rosto, como se estivesse abrindo um<br />
forno poderoso.<br />
Mas em que pese a dificuldade da vida<br />
do sertanejo, nas casas de adobe em<br />
meio às plantações de palma - por vezes<br />
a única fonte de alimento disponível<br />
para o gado e para seus proprietários -<br />
sempre encontramos sorrisos. Homens,<br />
mulheres e crianças que param a vida<br />
para ver a banda passar, ou o bonde,<br />
ou o pelotão, se preferir. Não raro, uma<br />
dupla solitária de atletas passa, em silêncio,<br />
cabeças pendendo para o lado,<br />
reunindo as últimas energias. É naquele<br />
grito encorajador que se descobre forças<br />
desconhecidas para seguir adiante.<br />
- Vá com Deus! - Grita o sertanejo, de<br />
quem tudo tiram, exceto a fé.<br />
E nessa torre de babel, de ciclistas e<br />
suas intrépidas máquinas de fazer<br />
força, a estatística me salta aos olhos.<br />
Cerca de 500 atletas largaram, dentre<br />
tantos países, entre brasileiros do Oiapoque<br />
ao Chuí. E uma cidade aponta<br />
única no cenário do Brasil Ride. Havia<br />
168 troféus disponíveis, premiação somente<br />
até o terceiro colocado de cada<br />
categoria, em cada etapa diária.<br />
Mesmo sem representantes em duas<br />
das oito categorias (Corporate e Nelore),<br />
Brasília levou 41 troféus! Simplesmente<br />
24,4% das premiações de uma<br />
prova internacional, entre as 5 melhores<br />
do mundo e certamente a mais<br />
difícil. Se nossos atletas são capazes<br />
de uma proeza dessas, praticamente<br />
sem incentivos, estou convencido que<br />
a capital do país é muito mais que o<br />
cenário podre da política, que tanta<br />
decepção tem dado ao nosso país. Infelizmente<br />
não têm a visibilidade que<br />
merecem. Pois aqui ficarão registrados<br />
os responsáveis por colocar Brasília no<br />
podium do Brasil Ride 2014.<br />
Congratulações! Vocês são exemplo de<br />
dedicação e superação.<br />
Abraão Azevedo<br />
André Decanha<br />
Walter Germano<br />
José Antonio Ferreira<br />
Fabrício Bezerra<br />
Sérgio Albernaz<br />
Julyana Machado<br />
EVOKEDEZ2014