O RETORNO DA NARRATIVA. Análise crítica da narrativa. MOTTA, Luiz Gonzaga.
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
nos distintos lugares e situações de comunicação. Os discursos narrativos<br />
literários, históricos, jornalísticos, científicos, jurídicos, publicitários e<br />
outros participam dos jogos de linguagem e dos jogos de poder. Analisar<br />
as <strong>narrativa</strong>s se transforma em observação de ações e performances<br />
socioculturais, mais que de relatos isolados.<br />
No capítulo anterior falamos de <strong>narrativa</strong>s e construção<br />
<strong>da</strong> reali<strong>da</strong>de. Mas é preciso voltar ao tema aqui. As <strong>narrativa</strong>s são<br />
representações, construções discursivas sobre a reali<strong>da</strong>de humana.<br />
São representações mentais linguisticamente organiza<strong>da</strong>s a partir de<br />
nossas experiências de vi<strong>da</strong>. Sejam elas fictícias ou fáticas, são sempre<br />
construções de sentido sobre o mundo real ou imaginado. Se a <strong>narrativa</strong><br />
relata uma estória inventa<strong>da</strong> por alguém, um conto, um romance, uma<br />
telenovela, uma história em quadrinhos, por exemplo, é uma ficção,<br />
uma construção sobre um universo imaginado que não existe (embora<br />
verossímil). Se a <strong>narrativa</strong> relata uma história ver<strong>da</strong>deira aconteci<strong>da</strong> no<br />
mundo real, uma reportagem sobre uma ocorrência em nossa ci<strong>da</strong>de,<br />
a biografia de um político, a descrição de um episódio histórico, por<br />
exemplo, é igualmente uma construção discursiva sobre as coisas do<br />
mundo, uma versão entre tantas outras possíveis sobre os episódios ou<br />
as pessoas reais. Já discuti essa questão no capítulo anterior. Quero com<br />
essas afirmações realçar mais uma vez que as <strong>narrativa</strong>s são sempre<br />
construções discursivas, sejam fáticas ou fictícias.<br />
Isso significa que o mundo cultural passa a existir na medi<strong>da</strong> em que<br />
nós falamos sobre ele, nós o relatamos e construímos. Mas não quer dizer que<br />
mundo físico e social não exista, ou só exista nos discursos. Quer apenas<br />
dizer que a reali<strong>da</strong>de física e social se introduz nas práticas humanas por<br />
meio de categorias e descrições que formam parte <strong>da</strong>s práticas humanas<br />
<strong>da</strong> linguagem. Ou seja, o mundo não está previamente classificado e<br />
categorizado por deus ou pela natureza de uma maneira tal que todos<br />
nos vemos constrangidos a aceitar, tal ou qual (POTTER, 1998). São os<br />
homens que classificam, através de algum tipo de linguagem e moldura, o<br />
mundo no qual os seres humanos vivem. O mundo passa a existir para os