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O RETORNO DA NARRATIVA. Análise crítica da narrativa. MOTTA, Luiz Gonzaga.

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cósmico, ao qual o homem agrega os princípios causais (causas e efeitos).<br />

Daí a irreversibili<strong>da</strong>de do tempo físico, que tem inevitavelmente uma<br />

direção. Já a sucessão dos nossos estados internos leva-nos ao conceito<br />

de tempo psicológico ou tempo vivido, que é impreciso, variável e<br />

subjetivo. Na <strong>narrativa</strong>, diz ele, a ordem temporal e a ordem causal se<br />

distinguem, mas dificilmente se dissociam. Citando E. M. Forster (2005)<br />

ele observa que, na <strong>narrativa</strong>, a ordem causal está para a temporal em<br />

um grau maior de complexi<strong>da</strong>de. A estória ou enredo (acontecimentos<br />

dispostos em sua sequência) corresponderiam às relações temporais.<br />

O elemento causal está implícito na relação temporal inseparável<br />

dos mundos possíveis projetados. Para se convencer <strong>da</strong> razão deste<br />

argumento, basta pensar os momentos de lacunas temporais, tempos<br />

vazios, que o leitor precisa preencher para estabelecer uma solução de<br />

continui<strong>da</strong>de às <strong>narrativa</strong>s.<br />

É preciso, portanto, reordenar a selvagem cronologia<br />

jornalística, encontrar os antecedentes, identificar e reposicionar as<br />

personagens, seus papéis e funções no desenrolar dos episódios; enfim,<br />

domar pela força <strong>da</strong> ordem <strong>narrativa</strong> o selvagem tempo jornalístico.<br />

Evidentemente, só após recompor as sequências e configurar o<br />

aconteámento-intriga completo somos capazes de definir qual é o tema<br />

<strong>da</strong> estória em questão. Mas a recorrente presença de personagens,<br />

conflitos e cenários de um assunto nas páginas e telas confere a eles<br />

certa uni<strong>da</strong>de e continui<strong>da</strong>de, e nos autoriza a unir as partes, recompor<br />

o acontecimento-intriga temático, como o leitor faz. Com essa retessitura<br />

intriga aparecerá uma ordem <strong>narrativa</strong> lógica, como em um enredo.<br />

Aparecem o significado orgânico de ca<strong>da</strong> episódio, os conflitos<br />

estruturantes, os papéis dos agentes, heróis, vilões, adjuvantes. Surge<br />

uma representação (mimese) mais tangível que fará surgir também a<br />

moral <strong>da</strong> estória (as meta<strong>narrativa</strong>s de fundo). A estória jornalística<br />

se revela então na sua totali<strong>da</strong>de. Os acontecimentos-intriga, oriundo<br />

do duro jornalismo do dia a dia caracterizam, a meu ver, a <strong>narrativa</strong><br />

noticiosa por excelência, apagando a dura referenciali<strong>da</strong>de e revelando<br />

uma poética jornalística.

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