Revista eMOBILIDADE+ #03
A revista eMobilidade + Dedica-se, em exclusivo, à mobilidade de pessoas e bens, nos seus vários modos de transporte (rodoviário, ferroviário, aéreo, fluvial e marítimo), conferindo deste modo espaço aos mais proeminentes “stakeholders” do setor, sejam eles indivíduos, empresas, instituições ou entidades académicas.
A revista eMobilidade + Dedica-se, em exclusivo, à mobilidade de pessoas e bens, nos seus vários modos de transporte (rodoviário, ferroviário, aéreo, fluvial e marítimo), conferindo deste modo espaço aos mais proeminentes “stakeholders” do setor, sejam eles indivíduos, empresas, instituições ou entidades académicas.
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ENTREVISTA<br />
Acácio Pires<br />
Quando projetamos a linha vermelha do<br />
Metro de Lisboa e não temos interface<br />
com a Linha de Sintra estamos a fazer<br />
algo de errado e não estamos a promover<br />
a intermodalidade e promovemos o<br />
congestionamento da linha de cintura<br />
de 2017 [esse é outro problema, pois<br />
não temos informação atualizada], em<br />
Lisboa temos 57% das viagens feitas em<br />
transporte individual ligeiro, ao mesmo<br />
tempo que no Porto esse valor sobe<br />
para 67%. Ora, isto tem várias razões, e<br />
muitas delas ligadas ao ordenamento do<br />
território, uma vez que, se esvaziarmos<br />
o centro das cidades, haverá deslocação<br />
para zonas suburbanas, mais distantes.<br />
PRAZOS<br />
O famoso ano de 2035, segundo<br />
o qual deixa de ser permitida a<br />
comercialização dos motores a<br />
combustão, deve ser antecipado<br />
Isso vai ter impacte, sobretudo se essas<br />
áreas não estiverem em torno dos eixos<br />
ferroviários, e dificilmente conseguiremos<br />
controlar o uso do transporte<br />
individual nas grandes cidades. É urgente<br />
conter o esvaziamento dos centros<br />
urbanos e procurar melhores políticas<br />
de urbanização, da mesma forma que<br />
o ordenamento do território deve levar<br />
em conta as ligações ferroviárias.<br />
Que soluções preconizam?<br />
Será necessário racionalizar o número<br />
de veículos, pois isso vai ter impactes<br />
nas chamadas matérias-primas críticas,<br />
que precisamos de mobilizar para<br />
a eletrificação dos veículos. Quanto<br />
mais pessoas e mercadorias pudermos<br />
transportar com menos veículos<br />
melhor, pois a eficiência dos setores<br />
de transportes é crucial. Direi, então,<br />
que densificar o transporte ferroviário<br />
das Áreas Metropolitanas de Lisboa e<br />
Porto é importante. O Plano Ferroviário<br />
Nacional aponta algumas medidas, mas<br />
devem ser aprofundadas. Teremos que<br />
ter mais vias rodoviárias dedicadas (e<br />
reguladas) para transporte público e,<br />
assim, podermos ter transporte público<br />
com tempo de viagem competitivo. Para<br />
além disto, há que desenvolver os modos<br />
flexíveis, integrando-os no sistema<br />
de passes. Modos flexíveis, quero dizer,<br />
também, os táxis coletivos, para melhorar<br />
os tempos de viagem em transporte<br />
público, porque neste momento o fator<br />
preço deixou de ser questão essencial.<br />
Na maior parte dos casos, para que se<br />
opte pelo transporte público em vez<br />
do particular é a questão do tempo de<br />
viagem, claramente.<br />
E que tal as vias VAO (sinal D6-a,<br />
introduzido no Código da Estrada<br />
em 2019), sem utilização, mas que<br />
pressupõe vias reservadas a veículos<br />
com alta taxa de ocupação?<br />
Evidente, terão que ser equacionadas.<br />
Mas ainda assim estamos a falar de<br />
transporte individual que terá que ser<br />
mais bem aproveitado. Melhor seria a<br />
incorporação dos modos flexíveis, como<br />
o táxi partilhado, ou mesmo pequenos<br />
autocarros, sem horários, sem percursos<br />
pré-definidos, que respondem às<br />
chamadas dos utilizadores.<br />
Em contrapartida, os veículos das<br />
plataforma TVDE, ainda muito pouco<br />
eletrificados, proliferam...<br />
A prioridade na eletrificação deverá<br />
recair nas frotas, pois são as que têm<br />
mais horas de utilização e, como tal, deveriam<br />
ser alvo de políticas de incentivo<br />
público, pois elas têm grande impacte<br />
na redução de emissões.<br />
Mas há datas a respeitar... E estas são<br />
exequíveis?<br />
Depende das políticas públicas. O<br />
famoso ano de 2035, segundo o qual<br />
deixa de ser permitida a comercialização<br />
dos motores a combustão, deve ser antecipado.<br />
Com todas as metas que hoje<br />
conhecemos, com o ‘fit for 55’, ainda<br />
estamos aquém do necessário para conseguirmos<br />
ficar abaixo dos 1,5 graus.<br />
Estas metas não são consistentes para<br />
atingirmos um patamar de segurança<br />
climática. A exequibilidade depende de<br />
fortes políticas públicas que permitam<br />
melhorar as condições de mobilidade<br />
de todos. Temos que ter mais tempo<br />
de vida útil e não perdê-la no meio dos<br />
transportes.<br />
Mas há paradoxos. A via férrea, por<br />
exemplo...<br />
Há um plano, ainda não aprovado, mas<br />
esperemos que possa entrar em vigor<br />
rapidamente. Já foi lançada discussão<br />
pública do estudo de impacte ambiental<br />
do primeiro troço da alta velocidade.<br />
Esperemos que esse caminho, embora<br />
já com enorme atraso, possa ser uma<br />
das duas prioridades – o eixo Atlântico,<br />
entre Vigo e Setúbal, e o eixo Mediterrânico,<br />
ligação Lisboa-Madrid. Nós,<br />
enquanto associação, lançámos um<br />
desafio: Portugal, Espanha e Marrocos<br />
estão unidos por um projeto de candidatura<br />
conjunta à organização do MundIal<br />
de futebol de 2030. Ora, tal desafio<br />
pressupõe que tenhamos o transporte<br />
do público e das equipas feito integralmente<br />
por via férrea, naturalmente nos<br />
territórios de Portugal e Espanha. Ligar<br />
as duas capitais em três horas é crucial.<br />
E o aumento das rotas aéreas parece<br />
um contrassenso...<br />
Há que conciliar os dois modos. A TAP,<br />
por exemplo, já tem bilhetes combinados<br />
com operadores ferroviários da Alemanha,<br />
Suíça e Áustria. Voando para os<br />
aeroportos principais, o voo de ligação,<br />
se de curta distância, já será eliminado<br />
e substituído pelo comboio. Terá que<br />
haver boa coordenação entre os dois<br />
modos. E no futuro será de utilizar os<br />
comboios noturnos de alta velocidade.<br />
É que a nossa posição de hub intercontinental,<br />
até mesmo do ponto de<br />
vista de poupança de combustíveis, é<br />
importante.<br />
Os navios acostados nos grandes<br />
portos terão que desligar os motores<br />
diesel e ligarem-se à rede elétrica, o<br />
que parece ser medida que melhorará<br />
o ambiente nas cidades...<br />
Peca por tardia, e embora o Porto de<br />
Lisboa já tenha anunciado que o faria<br />
em 2022, essa data foi adiada para<br />
2026. Claramente, já deveria estar<br />
implementada.<br />
Os transportes inteligentes dizem-nos<br />
que iremos andar todos ligados, os<br />
humanos às máquinas e às infraestruturas<br />
rodoviárias, pela melhor<br />
intermodalidade e pelas dificuldades<br />
da bilhética e pelas distâncias entre<br />
os vários terminais...<br />
O sistema de passes já está algo desenvolvido<br />
e é relevante para a intermodalidade,<br />
tal como o sistema de bicicletas,<br />
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