16.04.2013 Views

Jardim de Alah - Academia Brasileira de Letras

Jardim de Alah - Academia Brasileira de Letras

Jardim de Alah - Academia Brasileira de Letras

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

A dimensão <strong>de</strong> Proust<br />

que, revelando lados <strong>de</strong>sconhecidos do homem, possibilita a hominização do<br />

homem, isto é, po<strong>de</strong> fazer com que o ser humano melhore através do contato,<br />

que experimenta, com uma or<strong>de</strong>m superior <strong>de</strong> valores que um artista seja capaz<br />

<strong>de</strong> criar. A idéia vinha, não tão clara, <strong>de</strong> Ruskin, e Proust a sentiu em sua completitu<strong>de</strong><br />

para aproveitá-la, não apenas numa série <strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rações mais ou<br />

menos abstratas que um ensaísta qualquer pu<strong>de</strong>sse fazer, mas numa obra em<br />

que a idéia é aquilo que ela tenta exprimir, e on<strong>de</strong> vida, emoção, memória e<br />

pensamento puro se misturam para produzir uma nova realida<strong>de</strong>.<br />

Era todo o século XIX que vinha culminar na obra <strong>de</strong> Proust, e nela o século<br />

XX surgia com a força <strong>de</strong> suas novida<strong>de</strong>s. Não apenas o fin-<strong>de</strong>-siècle eo<br />

art-nouveau, mas todas as mudanças e os sonhos, as aspirações e as lutas, no período<br />

que foi da Comuna <strong>de</strong> Paris à I Guerra Mundial, estão naqueles volumes<br />

<strong>de</strong> narrativa erguidos sobre um Eu. O que Proust fez foi muito mais do que<br />

uma simples narrativa na primeira pessoa. George Orwell se negava a consi<strong>de</strong>rar<br />

romance qualquer narrativa na primeira pessoa, já que, aí, falando por si e<br />

contando o que viu, a, digamos, abertura da câmera diminui e limita a observação.<br />

Discordo <strong>de</strong> Orwell em princípio: mesmo, contudo, que ele tivesse razão,<br />

a primeira pessoa <strong>de</strong> Proust vai mais longe porque ele funcionou sobre a memória<br />

cujos meandros apareciam com maior clareza <strong>de</strong>pois que Bergson os estudara.<br />

Era um eu gigantesco, onisciente a mais não po<strong>de</strong>r, que surgia daquele<br />

acúmulo <strong>de</strong> páginas, na ascensão do <strong>de</strong>talhe a uma importância <strong>de</strong> monumento<br />

– e tudo <strong>de</strong> acordo com o espírito <strong>de</strong> Ruskin e com uma corrente <strong>de</strong> arquitetura<br />

<strong>de</strong> que a catedral <strong>de</strong> Chartres seria o melhor exemplo. Afirmei, em artigo<br />

anterior, que em Chartres entendi Proust melhor. Vendo os <strong>de</strong>talhes das figuras<br />

que o próprio autor <strong>de</strong> Swann ia contemplar quando escrevia sua obra, compreendi<br />

não só a influência <strong>de</strong> Ruskin sobre ele, mas também a força dos pormenores<br />

na formação do grandioso.<br />

Proust usou, na construção <strong>de</strong> seu monumento, um Método. A reação contra<br />

o realismo chegava então ao Simbolismo, e este surgia como um tipo <strong>de</strong><br />

cegueira; fechemos os olhos à realida<strong>de</strong>, toquemo-la apenas com a <strong>de</strong>lica<strong>de</strong>za<br />

do sonho e a ligeireza da sugestão, diziam. Aparecendo na crista da onda sim-<br />

325

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!