Jardim de Alah - Academia Brasileira de Letras
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Alberto da Costa e Silva<br />
certo momento, nas gran<strong>de</strong>s revistas ilustradas, que haviam <strong>de</strong>spertado o gosto<br />
dos leitores para um novo tipo <strong>de</strong> matéria: a foto-reportagem. Ao mesmo tempo,<br />
com sua assinatura, publicavam-se em Londres, Paris, Chicago e Buenos<br />
Aires vários livros <strong>de</strong> fotografias sobre os lugares que visitara. O fotógrafo andarilho<br />
rapidamente se fazia conhecido internacionalmente.<br />
Em 1940, ele estivera em São Paulo e no Rio <strong>de</strong> Janeiro, mas só seis anos<br />
mais tar<strong>de</strong> chegaria a Salvador, como repórter fotográfico da revista O Cruzeiro.<br />
Desceu na Boa Terra em 5 <strong>de</strong> agosto, e penso que no dia 6 já estava por ela<br />
seduzido. Transformou-a em sua base <strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong> fotógrafo itinerante, e<br />
foi-se <strong>de</strong>ixando vencer pelo seu ar morno, pelos seus odores, pela sua gente e –<br />
acima <strong>de</strong> tudo – pelos seus <strong>de</strong>uses. Cedo interessou-se por eles e por eles foi<br />
tocado. E pela África <strong>de</strong> on<strong>de</strong> tinham vindo, a África que adivinhava por trás,<br />
ou, melhor, por <strong>de</strong>ntro, das pessoas e das cenas baianas que fotografava.<br />
Quis ver como era. E, em 1949, empreen<strong>de</strong>u a sua primeira viagem ao golfo<br />
do Benim, àquela parte do continente que viria a ser a sua África, do mesmo<br />
modo que a Bahia seria o seu Brasil. Foi um encontro e um reencontro: era diferente<br />
e era semelhante ao que <strong>de</strong>ixara neste lado do Atlântico. As próprias<br />
paisagens pareciam repetir-se. E a luz era a mesma. As roupas eram mais soltas<br />
e coloridas, na margem <strong>de</strong> lá, mas as pessoas se pareciam e eram idênticos os<br />
seus gestos. As mesmas senhoras, com os mesmos turbantes, sentadas atrás <strong>de</strong><br />
tabuleiros, vendiam acarajé; só que as <strong>de</strong> cá se vestiam <strong>de</strong> branco. E os <strong>de</strong>uses,<br />
fossem vodus ou orixás, <strong>de</strong>sciam sobre os eleitos <strong>de</strong> igual maneira.<br />
Essa viagem foi a primeira das muitas que faria, até 1979, entre Salvador e o<br />
golfo do Benim, pois atravessou o Atlântico mais <strong>de</strong> 20 vezes. Primeiro, <strong>de</strong> navio;<br />
<strong>de</strong>pois, <strong>de</strong> avião.<br />
Já na primeira viagem, <strong>de</strong>scobriu que, se aquela parte da África se prolongava<br />
na Bahia, a Bahia se mostrava ao longo dos litorais do golfo do Benim. Havia<br />
até mesmo quem ali se dissesse brasileiro. E eram muitos esses <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes<br />
<strong>de</strong> traficantes <strong>de</strong> escravos e <strong>de</strong> ex-escravos que, libertos, haviam retornado<br />
ao continente africano. Verger fotografou-os e os seus sobrados e as suas casas<br />
térreas, semelhantes, quando não idênticas, às <strong>de</strong> Salvador. Essas fotos publi-<br />
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