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Jardim de Alah - Academia Brasileira de Letras

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Antonio Olinto<br />

bolista, Proust podia parecer sua simples culminação, não fora sua metodologia,<br />

seu caminho reto, sua rota direta, saída <strong>de</strong> um plano em que o eu, mesmo<br />

sendo o objeto, se mantém a certa e procurada distância <strong>de</strong>le. Essa distância era<br />

parte <strong>de</strong> um método e neste se achava o segredo do enfoque proustiano.<br />

Que tipo <strong>de</strong> enfoque utilizava Proust? O <strong>de</strong> quem sabia que a pura análise<br />

exterior não iluminará a realida<strong>de</strong>, mas sabe também que abandonar a análise<br />

não o ajudará em nada. Assim, tinha <strong>de</strong> unir o espírito <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificação no objeto<br />

com a distância do objeto. I<strong>de</strong>ntificar-se e, contudo (ou por causa disso<br />

mesmo, para tornar mais válida a i<strong>de</strong>ntificação), manter a distância. Conseguiu,<br />

assim, Proust, fazer uma revolução e retomar o caminho dos clássicos<br />

(para os quais, segundo Rivière, a literatura era “um discurso sobre as paixões”)<br />

para torná-lo mais amplo e nele <strong>de</strong>scobrir novas rotas.<br />

As opiniões críticas dos poetas e romancistas valem como pontos <strong>de</strong> comparação<br />

no aferimento <strong>de</strong> suas obras, tanto no que elas possam ter <strong>de</strong> semelhantes<br />

a suas teses, mas também, e principalmente, no que elas têm <strong>de</strong> dissemelhantes.<br />

Se um simbolista fala, num artigo <strong>de</strong> crítica, sobre o valor da intuição,<br />

esten<strong>de</strong>ndo-se longamente sobre o assunto, e vai-se ver não há na sua obra<br />

o menor sinal <strong>de</strong> intuição, uma análise dos motivos que o tornam apaixonado<br />

por um método que não sabe usar, será da maior utilida<strong>de</strong> no aferimento <strong>de</strong><br />

seus livros. No caso <strong>de</strong> Proust, a realida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua obra está em inteiro acordo<br />

com sua tese sobre o que <strong>de</strong>va ser uma obra <strong>de</strong> arte. Em seu Contre Saint-Beuve<br />

diz Proust: “A obra <strong>de</strong> Saint-Beuve não é uma obra profunda.” E por que não?<br />

Porque ele não reconhece que “um livro é um produto <strong>de</strong> um outro eu, diferente<br />

do que manifestamos em nossos hábitos, na socieda<strong>de</strong>, em nossas vidas”.<br />

E essa obra escapa sempre a qualquer observador <strong>de</strong> fora. Daí, o fato <strong>de</strong> nenhum<br />

crítico ser capaz <strong>de</strong>, usando apenas recursos externos e científicos <strong>de</strong><br />

análise, compreen<strong>de</strong>r jamais obra alguma <strong>de</strong> arte. O crítico precisará <strong>de</strong> manter<br />

a mistura <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificação e distância que Proust acha indispensável à própria<br />

obra. Analisando apenas, tentando fugir à obra para estudar em laboratório<br />

um acúmulo <strong>de</strong> informações ou dados estatísticos sobre a mesma, estará o crítico<br />

se afastando da possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> qualquer aproximação válida, <strong>de</strong> qual-<br />

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