17.04.2013 Views

O Natal da Margarida e da Constança - Pegada-de-papel

O Natal da Margarida e da Constança - Pegada-de-papel

O Natal da Margarida e da Constança - Pegada-de-papel

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Conto <strong>de</strong> <strong>Natal</strong><br />

Hoje dizem que é o dia mais frio do ano, dia 24 <strong>de</strong> Dezembro.<br />

O pai partiu para a guerra há exactamente um mês, dia 24 <strong>de</strong> Novembro <strong>de</strong> 1915, o<br />

dia em que fiz 10 anos. Não falta muito para eu ser uma mulherzinha.<br />

Na última carta que ele escreveu disse que no dia <strong>de</strong> <strong>Natal</strong> entraria por aquela porta<br />

e nunca mais voltaria a sair. Quando a mãe a leu foi a correr para o quarto a <strong>de</strong>satou a<br />

chorar. Eu não, já sou forte e sei que quando o papá promete, cumpre. Eu sei que ele<br />

vem.<br />

A lareira está acesa e o fumo escapa-se pela chaminé. Gosto <strong>de</strong> ver a ma<strong>de</strong>ira a<br />

ar<strong>de</strong>r e a estalar, parece que me aquece a alma e, por momentos, o calor envolve o meu<br />

corpo e sinto que o pai me abraça.<br />

Eu sei que a mãe está a tentar <strong>da</strong>r o seu melhor para que o ambiente <strong>da</strong> casa seja<br />

mais acolhedor, mas ambas sabemos que as sau<strong>da</strong><strong>de</strong>s não o permitem.<br />

A comi<strong>da</strong> está a faltar. Hoje em dia, com a guerra, todos os campos <strong>de</strong> cultivo foram<br />

<strong>de</strong>struídos e nos seus lugares ficaram as trincheiras; por isso, as mulheres cujos maridos<br />

partiram para a guerra e que têm <strong>de</strong> se alimentar e alimentar os seus filhos optaram por<br />

criar pequenos campos <strong>de</strong> cultivo nas traseiras <strong>da</strong>s suas casas, apenas com os alimentos<br />

essencias.<br />

A mãe tentou essa hipótese, mas <strong>de</strong>vido à sua falta <strong>de</strong> jeito e ao seu temperamento<br />

impaciente acabou por <strong>de</strong>sistir.<br />

Hoje <strong>de</strong> manhã, como é véspera <strong>de</strong> <strong>Natal</strong>, a mãe acordou-me com muitos abraços e<br />

beijos e <strong>de</strong>sejou-me um Feliz <strong>Natal</strong>, esforçando-se para que o seu sorriso mostrasse uma<br />

alegria que a guerra há muito levara.<br />

O pequeno-almoço foi melhor do que o habitual; em vez <strong>de</strong> uma fatia <strong>de</strong> pão, a mãe<br />

<strong>de</strong>ixou-me comer duas e bebi uma caneca inteira <strong>de</strong> leite que me <strong>de</strong>u a sensação <strong>de</strong><br />

alegria e <strong>de</strong> barriga cheia, o que há muito não sentia.<br />

O sol já se pôs e o sino <strong>da</strong> Igreja acabou <strong>de</strong> soar a meia-noite. Estou senta<strong>da</strong> num<br />

banco <strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira velha junto à lareira, quando ouço o som <strong>de</strong> passos vindos lá <strong>de</strong> fora e,<br />

poucos segundos <strong>de</strong>pois, alguém bate à porta. Pela janela podia avistar-se a sombra <strong>de</strong><br />

uma figura masculina. A mãe e eu olhámos uma para a outra com um olhar que jorrava

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!