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Narrar ou perecer: Sérgio Sant' Anna e Ricardo Piglia, sobrevi ventes<br />

261<br />

caras e mais caras aparecem e se olham e se perdem, a máquina é<br />

concebi<strong>da</strong> pelo seu criador, segundo o "princípio construtivo" me-<br />

9 Ibidem,p.116. diante o qual, "tudo é possível, basta encontrar as palavras"9 .<br />

A busca do passado para preencher o vazio do próprio nome,<br />

faz de Júnior uma espécie de detetive, tão perdido e atônito quanto<br />

o leitor, e transforma a narrativa numa investigação, já que<br />

10 Ibidem,p.129. "todo relato é policiapo" e tudo aquilo que escapa à "tendência<br />

II Idem, 1980,p.54. generaliza<strong>da</strong> de uniformizar a experiência 11" merece ser<br />

criminalizado. Justamente esta íntima conexão entre narrativa e<br />

poder se explicita na última parte do romance, quando a máquina<br />

interdita<strong>da</strong> reconhece:<br />

A narração ( ... ) é uma arte de vigias, sempre estão querendo<br />

que as pessoas contem seus segredos, dedurem os suspeitos,<br />

falem dos seus amigos, dos seus irmãos. Então, ( ... ) a polícia e<br />

a assim chama<strong>da</strong> justiça fizeram mais pelo avanço <strong>da</strong> arte do<br />

12 Ibidem,p.129. relato que todos os escritores ao longo <strong>da</strong> história 12 •<br />

A despossessão pela linguagem ou a linguagem como máquina<br />

de despossessão, além de atualizar nossa história autoritária,<br />

enseja a reflexão sobre a porosi<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s mentes e corações às<br />

máquinas, na medi<strong>da</strong> em que o espelho midiático invade e formata<br />

to<strong>da</strong>s as cenas. Entretanto, se "a árvore do bem e do mal é a árvore<br />

<strong>da</strong> linguagem", tal ambigui<strong>da</strong>de fun<strong>da</strong>mental, ao manifestar "a<br />

13 Ibidem,p.l04. forma incerta <strong>da</strong> reali<strong>da</strong>de"13 ,pode confundir ficção e confissão<br />

ou ain<strong>da</strong> embaralhar os limites entre narrar e ser narrado.<br />

Não é outro o motivo do peculiaríssimo romance de Sérgio<br />

14SANT'ANNA, 1997. Sant' Anna, Um crime delicado 14 .. Sua trama de "escorpião<br />

encalacrado", fazendo deslizar as fronteiras entre arte e vi<strong>da</strong>, representação<br />

e experiência, crítica, criação ou mistificação, bem poderia<br />

merecer como epígrafe mais uma <strong>da</strong>s falas <strong>da</strong> Máquina de<br />

Macedonio sobre o vínculo entre narrativa, identi<strong>da</strong>de, e investigação:<br />

"Todo relato é policial (...) Só os assassinos têm alguma coisa<br />

15 PIGLlA, 1997, p.130. para contar, a história pessoal é sempre a história de um crime"15 .<br />

A intrigante história do crítico de teatro Antonio Martins<br />

16SANT'ANNA,1997,p.22. escrita por ele como "peça de natureza quase processuaJl6" para<br />

defender-se <strong>da</strong> acusação de estupro, e entender-se "intelectual,<br />

afetiva e criticamente" constitui, sem dúvi<strong>da</strong>, um eloqüente testemunho<br />

<strong>da</strong> ambigüi<strong>da</strong>de entre confissão, culpa e encenação.

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