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Transcriar, transubstanciar: a homenagem dos "cinco sentidos" de Haroldo de Campos a Giuseppe Ungaretti<br />

275<br />

nu<br />

como a noite<br />

como uma pedra<br />

no leito de um rio<br />

poli<strong>da</strong><br />

como uma pedra onde fui eu tombar<br />

de vulcão<br />

roí<strong>da</strong><br />

alguém a colheu<br />

em suafun<strong>da</strong><br />

põe de lado<br />

este objeto<br />

perdido<br />

(WATAGHIN, 2003, p.115)<br />

Nestes versos, a supressão do articulador "donc", na passagem<br />

do francês para o português, reconfigura o texto de Ungaretti:<br />

a presença do "donc" no texto original, significando a toma<strong>da</strong> de<br />

decisão de não mais recuperar o objeto perdido, uma vez o sujeito<br />

transmutado em pedra e jogado ao rio, esta decisão é subverti<strong>da</strong><br />

pela ausência do "donc" no texto traduzido, imprimindo no simbolismo<br />

<strong>da</strong> pedra o traço de objeto de memória que remete ao<br />

lugar de nascimento do poema. Peifeiçães do Negro, deste modo,<br />

concede ao leitor um certo efeito de continui<strong>da</strong>de do momento<br />

liberado <strong>da</strong> ordem do tempo e do espaço: redesenha a fisionomia<br />

do sujeito-pedra, transformando-o em grão textual e forma <strong>da</strong>nçante<br />

captados <strong>da</strong> visuali<strong>da</strong>de. Decifra, de certo modo, o enigma<br />

<strong>da</strong> paisagem lírica ao mostrar o dentro à exteriori<strong>da</strong>de, respondendo<br />

ao conflito <strong>da</strong> expressão poética figura<strong>da</strong> por Eterno, primeiro<br />

poema de A Alegria: "Entre uma flor colhi<strong>da</strong> e o dom de<br />

outra o na<strong>da</strong> inexprimível" (WATAGHIN, 2003, p.23). Embora<br />

breves, estes versos permitem vislumbrar o grau zero do dizer o<br />

indizível, cifrando-se no prazer de resgatar, pela tradução, a<br />

potenciali<strong>da</strong>de <strong>da</strong> palavra poética de ressignificação inesgotável.<br />

A suavi<strong>da</strong>de, contudo, modula o processo tradu tório <strong>da</strong> poesia<br />

ungarettiana por Haroldo: compreende o tradutor, que to<strong>da</strong> prática<br />

do transcriar inicia pela percepção e pelo exame dos eixos arti-

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