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A Crise De 1929 - Bernard Gazier

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que ela não tem base estatística que a comprove. Houve suicídios, sem dúvida, em <strong>1929</strong>, mas<br />

em média menos do que durante os anos entre 1930 e 1933. Em seu livro La crise économique<br />

de <strong>1929</strong> (ver bibliografia), ele sugere a seguinte atmosfera: “Dizia-se que os empregados de<br />

hotel em Nova York perguntavam aos clientes se desejavam um quarto para dormir ou para<br />

pular. Dois homens saltaram, de mãos dadas, de um andar do Ritz – tinham uma conta<br />

conjunta” (p. 151). É provável que alguns gestos espetaculares de desespero tenham ido ao<br />

encontro de uma expectativa coletiva de justiça; os anos 1930 viram o florescimento nos<br />

Estados Unidos de inquéritos parlamentares sobre as práticas da Bolsa, livros de denúncia,<br />

condenações de bodes expiatórios e legislações restritivas, por exemplo, aos call loans.<br />

2. Tensões e desordens internacionais<br />

Se tomamos distância dos acontecimentos da Bolsa – algo que a cronologia convida a<br />

fazer, já que a produção industrial declinava nos Estados Unidos desde o verão de <strong>1929</strong> –,<br />

somos levados a enfatizar a instabilidade global do entre-guerras. Nenhuma medição permite<br />

verificar diretamente essa afirmação. No entanto, a maior parte dos dados sobre os ritmos<br />

conjunturais mundiais desde o século XIX revelam desvios mais fortes de 1918 a 1939 do que<br />

durante outros períodos. Além disso, as evoluções da produção ou das trocas, em alta ou em<br />

baixa, são notavelmente discordantes entre os países, enquanto o período de 1870-1913, por<br />

exemplo, apresenta um sincronização muito maior.<br />

Essa instabilidade e essa desunião se desenvolveram a partir do fim do primeiro conflito<br />

mundial. Duas modalidades essenciais convidam a um breve exame: sistema monetário e<br />

financeiro internacional frágil; tensões e saturações em inúmeros mercados.<br />

O problema monetário era o seguinte em 1918: depois de anos de cursos forçados, de<br />

controle de capitais e de penúrias inflacionistas, como voltar à liberdade de comércio? O<br />

mecanismo internacional que vigorava antes de 1914 era o do padrão-ouro. Este ligava as<br />

diferentes moedas entre si através de seu peso em ouro definido de forma fixa; as moedas<br />

eram portanto convertíveis em ouro, e o metal, que circulava a público, podia ser importado e<br />

exportado livremente. A Conferência Internacional de Gênova, em 1922, sanciona um sistema<br />

diferente, o do padrão de câmbio-ouro (gold exchange standard), estabelecido pouco a pouco<br />

a partir de 1918. As necessidades de reconstrução e retomada do comércio internacional<br />

levaram a uma conservação da referência em ouro; porém, devido à sua raridade e à sua<br />

distribuição desigual, a uma referência em segundo grau: a moeda de cada país não mais<br />

ficava diretamente ligada ao ouro, mas a uma moeda fundamental, definida e convertível em<br />

ouro. Os créditos em países de moeda “central”, como se dizia, as reservas cambiais,<br />

substituem o ouro em quase todos os países. Houve duas moedas centrais, a libra esterlina e o<br />

dólar, que alargam a base das trocas internacionais. O ouro, em si, não circula mais e adquire<br />

um papel de reserva nacional ao lado das reservas cambiais. Podemos perceber a<br />

vulnerabilidade desse sistema bipolar que confirma o enfraquecimento britânico e a ascensão<br />

ainda hesitante dos Estados Unidos: a regulação internacional depende do controle e da<br />

coordenação de dois centros e da confiança dos demais países.<br />

O sistema também foi iniciado em meio a uma grande confusão: as vicissitudes das

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