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sistemática.<br />
As tomadas de posição de Keynes entre 1920 e 1936 contra a deflação, pela<br />
desvalorização, pela estimulação do poder de compra e contra o padrão-ouro não tiveram um<br />
poder mobilizador imediato, talvez por sua inegável dimensão provocativa: o padrão-ouro é<br />
uma “relíquia bárbara” (1923); é preciso denunciar, durante as tentativas deflacionistas<br />
inglesas, “o estado de histeria e perda de senso de responsabilidade no qual os membros do<br />
gabinete acabaram se colocando” (1931); é preciso estimular o gasto, “ou então vocês, donas<br />
de casa cheias de patriotismo, cheguem às ruas amanhã desde a primeira hora e visitem esses<br />
maravilhosos saldos que a publicidade anuncia em toda parte. Vocês farão bons negócios,<br />
pois nunca as coisas estiveram tão em conta, a um ponto que vocês não poderiam sonhar... E<br />
ofereçam, além do mercado, a alegria de dar mais trabalho a seus compatriotas, de acrescentar<br />
à riqueza do país colocando em marcha atividades úteis...” (discurso radiofônico, 1931).<br />
A Teoria geral traz assim a justificativa a posteriori de uma política econômica ativa e sua<br />
canalização em direção a uma política quantificada de intervenção conjuntural capaz de<br />
aproximar boa parte das correntes liberais e dos partidários de reformas profundas do<br />
capitalismo. O objetivo estatal passa a ser o pleno emprego, e a tarefa dos poderes públicos é<br />
sustentar uma situação constantemente próxima do boom, utilizando sobretudo três meios:<br />
primeiro, déficits orçamentários que injetam recursos no circuito e reanimam diretamente a<br />
atividade; segundo, uma política de baixa taxa de lucro, evitando as restrições monetárias; por<br />
fim, uma política de redistribuição que privilegie o poder de compra das camadas menos<br />
favorecidas, que têm uma forte “propensão para consumir” e poupam pouco – o que justifica<br />
os sacrifícios de proteção aos desempregados e de construção da Previdência Social.<br />
Pouco importa, nessa perspectiva, o jogo exato das forças que conduziram à crise e sua<br />
extensão ao resto do mundo. Com ela, entendemos melhor a relativa desenvoltura de Keynes a<br />
propósito do ciclo econômico iniciado em 1920. Em grande parte virado para o futuro e a<br />
previsão, o impulso keynesiano dissolve ao mesmo tempo o determinismo dominante em<br />
1930-1935 e a urgência do debate causal.<br />
2. Os erros de política monetária<br />
A explicação de Milton Friedman é formulada em oposição direta à de Keynes e seus<br />
discípulos. Escrita com Anna Schwartz, sua Monetary History of the United States (1963)<br />
contém um extenso capítulo 7 de 129 páginas, considerado além-Atlântico um texto<br />
fundamental sobre a crise de <strong>1929</strong>. 17 No entanto, a tese já havia sido formulada em 1944-<br />
1946, por Clark Warburton, em alguns artigos que a História monetária enaltece.<br />
Evidenciamos a insistência keynesiana sobre uma teorização da economia em termos de<br />
circuito, justificada pela rigidez de certos preços a curto prazo. O monetarismo consiste em<br />
defender a opinião contrária, afirmando que a flexibilidade dos preços é suficiente quando não<br />
fica entravada por intervenções públicas e que a análise em termos de rendimentos deve ser<br />
complementada por uma análise em termos de riqueza, de patrimônio. Essas duas inversões<br />
restabelecem o forte potencial de estabilidade do sistema e retomam uma análise por