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A Crise De 1929 - Bernard Gazier

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fazenda abandonada e reunindo à sua volta uma população de deserdados, criando uma<br />

comunidade agrária com o simbólico nome de Arcádia. <strong>De</strong>pois de um breve momento de<br />

instabilidade com a chegada da loira Sally, que simboliza a cidade com seu gosto pelo jazz,<br />

pelo álcool e pelo tabaco, a vida rural é por fim comprometida pela seca e salva pela<br />

escavação a picareta de um canal. Essa fábula bíblica (Vidor é um adepto da Ciência Cristã)<br />

transforma o tema bastante conhecido dos perigos da rua e da cidade, característico dos anos<br />

1920, numa exaltação da auto-organização agrícola em meio a automóveis, mas sem o mínimo<br />

material mecanizado: a redenção pelo trabalho se une aqui ao stakhanovismo 8 e substitui a<br />

produtividade pelo esforço. Podemos ver nessa comunidade que adquire independência e que<br />

se reúne em torno de um homem (depois de hesitar quanto a seus processos de tomada de<br />

decisão) tanto os primórdios de um comunismo primitivo quanto a desconfiança para com o<br />

socialismo e a democracia. Trata-se de um movimento de recuo, de retraimento sobre si e<br />

sobre a terra, revelador de uma sociedade cambaleante.<br />

Em uma palavra, parece que podemos resumir o impacto cultural da catástrofe econômica<br />

num movimento urgente de engajamento e testemunhos; o romance apresenta certa regressão<br />

formal em relação às experiências revolucionárias internacionais dos anos 1920 (Faulkner,<br />

Proust, Döblin, Joyce...), mas impõe despojamento e brutalidade, e dialoga com o cinema, a<br />

fotografia e a investigação. Esses caminhos cruzados, à sua maneira, compõem o mapa da<br />

convulsão.<br />

IV. O capitalismo sob vigilância<br />

Todos os países industriais conhecem, a partir de 1933, um aumento considerável da<br />

pressão política e sindical operária. As greves recomeçam a partir de 1933. O início de uma<br />

recuperação libera a expressão, de certa forma retardada, do medo e da indignação dos<br />

operários. Esse ressurgimento da combatividade é reforçado mais ainda nos anos seguintes<br />

pela aliança com as classes médias que perdem a esperança de, agindo isoladamente ou se<br />

unindo à direita capitalista, saírem ilesas. Aliança desejada também pelo lado operário<br />

quando a estratégia antifascista (na Europa) implica uniões democráticas. Resulta disso uma<br />

segunda onda de pressões à esquerda, mais potente do que a primeira e perceptível tanto nos<br />

Estados Unidos quanto na França, que culmina em grandes greves e conquistas sociais.<br />

Essa revanche do common man, o homem da rua, é intrinsecamente uma mutação intelectual<br />

e social que desqualifica as pessoas no poder nas democracias ocidentais. Muitos assinalaram<br />

que o brain trust do presidente Roosevelt (sua equipe de governo) nomeava na maioria das<br />

vezes, em 1933, novatos, quase sempre saídos dos círculos empresariais e financeiros.<br />

Das conclusões dos comitês de especialistas nos planos sindicais às sugestões dos simples<br />

cidadãos, as propostas feitas na época eram de todos os tipos. Iam do retorno à vida rural à<br />

criação de uma moeda “liquefeita” que obrigasse seus detentores a despesas imediatas, como<br />

por exemplo, através da emissão de notas datadas, válidas por um tempo específico. Três<br />

grupos predominam. Por ordem cronológica, encontramos primeiro uma corrente ardorosa e<br />

antiga a favor da estimulação do poder de compra, depois a dos debates em torno do tema do<br />

multiplicador de empregos e, por fim, a do movimento planificador.<br />

A idéia de que a manutenção, ou o desenvolvimento, do consumo popular facilitaria a

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