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A Crise De 1929 - Bernard Gazier

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propriamente dita), aos estímulos monetários decorrentes de uma taxa de desconto mantida<br />

muitas vezes muito baixa (1 ou 1,5%).<br />

No entanto, a busca por traços similares ou não-similares logo perdeu sua importância no<br />

desastre com a “polarização” do debate.<br />

2. A oposição entre L. Robbins e E. Varga<br />

O famoso livro do economista inglês Lionel Robbins, The Great <strong>De</strong>pression, <strong>1929</strong>-1934,<br />

ilustra à perfeição a opção liberal. Ele atribui a gravidade da crise sucessivamente à rigidez e<br />

às instabilidades do pós-guerra e às políticas errôneas seguidas para se oporem a uma<br />

liquidação julgada inevitável. A ortodoxia retrospectiva o fez condenar todas as tendências<br />

herdadas da economia de guerra que impedem o livre jogo de forças do mercado, bem como o<br />

aumento dos controles e acordos relacionados à determinação dos salários (sindicatos,<br />

negociações coletivas). Ele também dá grande importância às desordens dos anos 1920,<br />

principalmente no âmbito financeiro e monetário, que conheceu inovações perigosas (crédito<br />

ao consumo). Porém, a argumentação mais notável deriva de uma ortodoxia prospectiva:<br />

Lionel Robbins considera que toda ação que visa a atenuar o curso da crise, a fortiori toda<br />

ação contracíclica, só pode agravar as coisas. Ele condena tanto o dirigismo dos preços e das<br />

quantidades quanto os estímulos artificiais da conjuntura. Por isso sua visão paradoxal e<br />

controvertida da evolução dos preços entre 1926 e <strong>1929</strong>: ele a considera... inflacionista, já<br />

que os preços baixaram apenas de leve ou permaneceram estáveis, principalmente nos Estados<br />

Unidos, enquanto deveriam ter baixado com maior nitidez. Ele atribui essa inércia ao inchaço<br />

monetário decorrente de uma política de open market permissivo demais. Por outro lado, os<br />

esforços de rigor orçamentário depois de <strong>1929</strong> lhe parecem lógicos e sadios.<br />

Mais radicalmente ainda, uma série de economistas – dentre os quais se destaca o francês<br />

Jacques Rueff – vê o obstáculo essencial da crise resultar da recusa dos assalariados em<br />

aceitar as diminuições de salário: segundo eles, essa rigidez perturba todos os mecanismos<br />

comerciais que só funcionam eficazmente com grande flexibilidade de preços, inclusive o do<br />

trabalho. A conclusão dessa posição é o famoso conceito de “desemprego voluntário”:<br />

resultante dos progressos sindicais, o desemprego crônico seria apenas a conseqüência<br />

perversa, no mercado de trabalho, do bloqueio dos reajustes através dos preços (a taxa de<br />

salário); seria, portanto, procurado, mesmo se não fosse previsto, pelas organizações e<br />

exigências operárias. Por isso as prescrições deflacionistas. À disciplina pública de<br />

restrições orçamentárias precisam corresponder baixas de salário, eventualmente autoritárias.<br />

A legitimação imediata dessa análise é bastante difícil. Quer os salários subam ou baixem,<br />

podemos sempre dizer que eles subiram demais ou que não baixaram o suficiente. A tese não<br />

tem, portanto, limites a colocar quanto a suas prescrições anti-sociais, o que faz convergirem<br />

de maneira arrogante o doutrinário e o arbitrário.<br />

No extremo oposto, outro texto é fundamental: La crise économique, sociale, politique do<br />

economista marxista Eugène Varga, perito do Komintern, também escrito em 1934. Ele<br />

distingue duas dimensões nos acontecimentos: há uma crise cíclica “especial”, que ocorre<br />

tendo como fundo uma crise generalizada do capitalismo. A primeira é analisada segundo os

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