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marketinG & neGócios<br />
Imilian/iStock<br />
Ganância ou<br />
ignorância?<br />
O comportamento e os atos do<br />
Facebook representam falta <strong>de</strong> respeito<br />
Rafael Sampaio<br />
Mais do que a simples ganância por po<strong>de</strong>r<br />
e dinheiro soma-se a ignorância<br />
que a ganância cria ao esquecer um ponto<br />
básico do mundo dos negócios: a ética. O<br />
comportamento e os atos do Facebook nos<br />
últimos anos têm sido <strong>de</strong> uma sistemática<br />
falta <strong>de</strong> respeito com seus consumidores,<br />
seus anunciantes e seus acionistas.<br />
Não se trata apenas do escândalo mais<br />
recente, <strong>de</strong> repercussões globais, da esperteza<br />
da obtenção <strong>de</strong> dados e <strong>de</strong> seu mau<br />
uso por parte da CA - Cambridge Analytica,<br />
mas <strong>de</strong> uma longa sequência que revela<br />
uma forma <strong>de</strong> fazer negócios que se veste<br />
com o nome <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>, mas é a melhor<br />
tradução <strong>de</strong> ganância por po<strong>de</strong>r. O último<br />
<strong>de</strong>les a gerar perplexida<strong>de</strong> havia sido<br />
em setembro passado, quando o Facebook<br />
foi flagrado pela 10ª vez em um ano com<br />
o fato <strong>de</strong> que havia erro nos números que<br />
divulgava em termos <strong>de</strong> sua audiência e<br />
outros aspectos <strong>de</strong>ssa plataforma, como o<br />
fato <strong>de</strong> alegar atingir 41 milhões <strong>de</strong> americanos<br />
entre 18 e 24 anos enquanto toda a<br />
população daquele país nessa faixa etária<br />
não passava <strong>de</strong> 31 milhões.<br />
Seu fundador e principal executivo,<br />
Mark Zuckerberg <strong>de</strong>morou 5 dias para falar<br />
após a eclosão do atual escândalo e disse<br />
bem menos do que <strong>de</strong>via. Na real, os fatos<br />
eram do seu conhecimento <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 2015,<br />
mas ele e seus comandados, na prática, não<br />
fizeram nada a não ser mandar um comunicado<br />
burocrático – e não checado – para<br />
que a CA apagasse os dados dos 50 milhões<br />
<strong>de</strong> usuários.<br />
Em matéria <strong>de</strong> capa, a The Economist pegou<br />
pesado, após lembrar que o fundador<br />
do Facebook mantém o controle das ações<br />
com direito a voto: “O episódio se encaixa<br />
em um padrão estabelecido <strong>de</strong> negligência<br />
em relação à privacida<strong>de</strong>, tolerância à imprecisão<br />
e relutância em admitir erros”.<br />
Também não se <strong>de</strong>ve esquecer que a<br />
primeira ação do Facebook e da CA foi a<br />
<strong>de</strong> tentar impedir, com ameaças legais, a<br />
publicação da matéria pelo The Guardian.<br />
Sabe-se que a CA não é a única <strong>de</strong>senvolvedora<br />
<strong>de</strong> apps a fazer o que fez e a caixa <strong>de</strong><br />
pandora da maior mídia social do planeta<br />
po<strong>de</strong> revelar uma explosão <strong>de</strong> maus-feitos.<br />
Aliás, o Facebook não é a única mídia digital<br />
a fazer bobagem. Muita gente aposta<br />
que o Google, a maior <strong>de</strong> todas, é um queijo<br />
suíço <strong>de</strong> furos. Recentemente, o Google<br />
disse que fez ajustes para cumprir o GDPR<br />
- Regulamento Geral <strong>de</strong> Proteção <strong>de</strong> Dados<br />
europeu (que será obrigatório a partir <strong>de</strong><br />
maio próximo), mas silenciou em relação<br />
ao restante do mundo. O Facebook agora<br />
fala que a adoção <strong>de</strong>sses parâmetros será<br />
global. A conferir.<br />
Vale lembrar que no começo <strong>de</strong>ste ano o<br />
Twitter havia sido flagrado <strong>de</strong> calças curtas<br />
pela falta <strong>de</strong> controle na criação <strong>de</strong> perfis<br />
falsos e da anabolização <strong>de</strong> sua audiência.<br />
Será o começo do fim do faroeste na mídia<br />
digital, como alguns mais afobados estão<br />
se perguntando? Com certeza, não. A <strong>de</strong>ontologia<br />
dos megalí<strong>de</strong>res <strong>de</strong>ssa área está<br />
muito longe dos padrões dos <strong>de</strong>mais meios<br />
e nem eles nem o mercado publicitário parecem<br />
muito dispostos, neste momento, a<br />
mudar essa situação.<br />
O que leva a outra questão importante e<br />
incômoda: o que os anunciantes e agências<br />
e suas políticas <strong>de</strong> compliance estão fazendo?<br />
A rigor, eles não <strong>de</strong>veriam colocar sua<br />
publicida<strong>de</strong> nesses meios inconfiáveis.<br />
A solução <strong>de</strong>sse grave problema, que seria<br />
um resgate da mídia digital, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
todos, inclusive dos governos ao redor do<br />
mundo. Se o mercado publicitário falhar<br />
em fazer sua parte, governos agirão e isso<br />
será muito pior, porque reduzirá a liberda<strong>de</strong><br />
do uso responsável do digital – inclusive<br />
pelas empresas tradicionais <strong>de</strong> mídia, que<br />
ao longo dos anos apren<strong>de</strong>ram que a ganância<br />
por negócios tem <strong>de</strong> estar subordinada<br />
ao máximo respeito aos consumidores e à<br />
velha máxima que a melhor esperteza é a<br />
da honestida<strong>de</strong>.<br />
Rafael Sampaio é consultor em propaganda<br />
rafael.sampaio@uol.com.br<br />
44 2 <strong>de</strong> <strong>abril</strong> <strong>de</strong> <strong>2018</strong> - jornal propmark