ele representou para a humani<strong>da</strong>de, era então obtido através <strong>da</strong> fricçãodestes dois corpos. Porém, anterior a esse momento, é bem provável quea humani<strong>da</strong>de já utilizasse as pedras para reter o calor, aproveitando paraconservar os alimentos. Já demonstramos em outro momento que a temperaturaé algo fun<strong>da</strong>mental para os seres vivos. Quando o corpo perdeo seu calor, princípio de vitali<strong>da</strong>de, acredita-se que ele está morto. Nãopodemos confundir esse momento com os Antepassados. Estes, comoXangô, são muito quentes, pois estão vivos, continuam sob as tiras depano que separam de nossos olhos o mistério <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> e <strong>da</strong> morte. Assim,quando evocamos o Rei nos rituais fúnebres, estamos afirmando queacreditamos <strong>na</strong> nossa ancestrali<strong>da</strong>de e que ela é a garantia de nossa permanênciapara sempre no mundo. Quanto ao corpo, devolvemos à terra,pois como já comentamos, dessa devolução depende a continui<strong>da</strong>de <strong>da</strong>vi<strong>da</strong> dos que virão, afi<strong>na</strong>l, tudo não é cíclico? Tudo não é uma manifestaçãodo Sagrado? A partir dessa explicação podemos pensar várias coisas.É certo que africanos e africa<strong>na</strong>s tinham em mente a concepção de que aspedras deveriam estar juntas para poder produzir calor a fim de manterem-sevivas. E assim fizeram. Assim, uma <strong>da</strong>s características do cultoao rei, preserva<strong>da</strong> no Brasil, foi a presença de muitas pessoas. O culto aXangô requer muitas pessoas. Como se diz: Xangô adora gente. E o queé o mercado? Na<strong>da</strong> mais do que indivíduos que rompem suas fronteiras,quebram tabus. O rei também adora festas, comi<strong>da</strong>s e bebi<strong>da</strong>s. Não foi atoa que, quando os africanos organizaram os primeiros afoxés, o rei ia àfrente, que diga os maracatus de Per<strong>na</strong>mbuco, e falando em Maracatu,como não falar <strong>da</strong> Kalunga, a boneca que diviniza nossos antepassados?Falando sobre esse ancestral, no Brasil não podemos deixar de mencio<strong>na</strong>ro nome de Tio Bangboxé. Ele teria chegado ao Brasil para aju<strong>da</strong>r <strong>na</strong> constituiçãode alguns terreiros de candomblé que se formavam <strong>na</strong> ci<strong>da</strong>de deSalvador no século XIX, onde o culto a Xangô era elemento central. Fiela sua missão, Bangboxé Obitikó, constituiu no Brasil longa descendênciaatravés <strong>da</strong> família consanguínea que formou, e <strong>da</strong> religiosa que desde<strong>na</strong> <strong>palma</strong> <strong>da</strong> <strong>minha</strong> <strong>mão</strong> • 109
cedo constituiu através de suas viagens a Porto Alegre, Rio de Janeiro eRecife. Ain<strong>da</strong> hoje, membros <strong>da</strong> família Bangboxé vêm <strong>da</strong> Nigéria visitarseus descendentes brasileiros. Da família consanguínea, destacamosa figura de sua filha, chama<strong>da</strong> de Tia Júlia, e <strong>da</strong> família religiosa, EugêniaAn<strong>na</strong> dos Santos, a inesquecível Mãe Aninha, que há cem anos atrás fundouo Ilê Axé Opô Afonjá. No terreiro fun<strong>da</strong>do por Tia Júlia no Matatu,está à frente, ain<strong>da</strong> hoje, Irenea Sowzer, a última bisneta do Tio Bangboxé,também de Xangô. Xangô que é rei, que gosta de coisa bonita e é muitovaidoso, não no sentido pejorativo que utilizamos a palavra. Vai<strong>da</strong>deno sentido <strong>da</strong> autoestima. O culto a Xangô nos faz olhar para dentro denós mesmos, nos faz perceber que quando permanecemos unidos comopedras que formam o alicerce de uma construção, somos fortes. Ele ain<strong>da</strong>nos impulsio<strong>na</strong> a lutar contra todos aqueles que não se alegram com anossa alegria.110 • vilson caetano de sousa júnior
- Page 2 and 3:
na palma da minha mão
- Page 4 and 5:
VILSON CAETANO DE SOUSA JUNIORnapal
- Page 6:
A nossos pais e mães de quem ouvim
- Page 9 and 10:
93 • Os gêmeos e a inversão da
- Page 11 and 12:
to de terreiros como patrimônio ma
- Page 13 and 14:
cultura afro-baiana com uma criaç
- Page 15 and 16:
mãos que os iniciados trocam a bê
- Page 17 and 18:
não dá para trás.” Ou do relat
- Page 20 and 21:
candomblé e modernidadeO tema “c
- Page 22:
os terreiros, rios, uma língua rit
- Page 25 and 26:
Fato é que para o chamado “povo
- Page 27 and 28:
São, pois, estas memórias que con
- Page 30 and 31:
a ciência e a tecnologia queos afr
- Page 32 and 33:
do Dahomé, Abomé ou Danxomé, atu
- Page 34:
eligiões de matriz africana, onde
- Page 40 and 41:
que ignoram tal significado. Acredi
- Page 42 and 43:
af r icanos ,seus descedentese econ
- Page 44 and 45:
as doceiras “perderam o ponto”,
- Page 46 and 47:
ancestralidadeafro-brasileiraO conc
- Page 48 and 49:
uma parte do corpo, mas do corpo to
- Page 50:
te, ou simplesmente balbuciadas no
- Page 54 and 55:
candomblé e destino entrea advinha
- Page 56 and 57:
com a morte, mas em viver a vida. Q
- Page 58 and 59:
seres vivos, no sentido bem amplo d
- Page 60 and 61: em torno da noção de sacrifícion
- Page 62 and 63: Vamos agora falar sobre o sacrifíc
- Page 64 and 65: a expiatória. É quando a coisa sa
- Page 66: esu .
- Page 69 and 70: Diabo, entendido como adversário d
- Page 71 and 72: ção do mal, sugerida pelos missio
- Page 74: obaluaiyê
- Page 77 and 78: portuguesa e mestiça. Isso fez com
- Page 79 and 80: do aparelho urinário; Odé é resp
- Page 81 and 82: extenso, tem forma, é visível a n
- Page 83 and 84: primordial. Alguns orixás e nkise
- Page 86: odé
- Page 89 and 90: Médio e à Austrália. Depois fora
- Page 91 and 92: (Artocarpus heterophyllus) chamada
- Page 94 and 95: os gêmeos e a inversãoda mesaPara
- Page 96 and 97: pois não libertava a sua mãe. O n
- Page 98: Aos meninos é oferecida uma mesa,
- Page 101 and 102: oportunidade de demonstrar a import
- Page 103 and 104: cas, que construiu a sua família,
- Page 105 and 106: mulheres que, desafiando o seu temp
- Page 108 and 109: ao rei do mundo…Xangô é rei. É
- Page 112: oyá
- Page 115 and 116: escuro deveria ser rasgado por uma
- Page 117 and 118: çam graças à força emprestada p
- Page 120: oxun
- Page 123 and 124: O culto ao orixá Oxun, no Brasil,
- Page 126: yemanjá
- Page 129 and 130: santeiros. Como outros ancestrais n
- Page 131 and 132: não pode ser encerrado na concepç
- Page 134 and 135: iya agba yin,a mãe mais velhaDentr
- Page 136 and 137: para Abeokuta, onde acreditava-se q
- Page 138: quatro patas. Odé teria enlouqueci
- Page 142 and 143: o ano bom para as religiõesde matr
- Page 144 and 145: O Ciclo das Águas, especialmente n
- Page 146: oxoguiã
- Page 149 and 150: mais rápidos e o toque compassado
- Page 151 and 152: consanguíneo de Tio Bangboxé, que
- Page 153 and 154: da história das religiões de matr
- Page 155 and 156: criar, reinventar e dar continuidad
- Page 158: obá
- Page 161 and 162:
mesma, talvez por ela nos remeter a
- Page 163 and 164:
fender a sua dignidade através da
- Page 165 and 166:
______. Valores civilizatórios em
- Page 167:
Textos publicados no Jornal A TARDE