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conversar, você joga a cerveja fora. Você finge não notar determinadas coisas, feito<br />
dinheiro. Ele sempre aparece, mas só quando a despensa está vazia. No entanto, você<br />
tem medo de se queixar. Então você pensa: "Quais são as chances de que as coisas<br />
piorem, e não melhorem?".<br />
"Eu compreendo", diz ele quando você menciona o fato. "Não é um problema,<br />
mas vou largar. Por você. Prometo." Mas nenhum dos dois acredita naquilo.<br />
Dia a dia, seu mundo fica menor. Você não quer abrir armários com medo do<br />
que vai encontrar. Não quer examinar os bolsos das calças dele. Não quer ir a lugar<br />
nenhum. Onde ele irá levá-la que não envolva bebida?<br />
Uma manhã, descobri garrafas de cerveja dentro do forno. Jodi encontrou latas<br />
da bebida na caixa de brinquedos dela. Wally acordava cedo todas as manhãs e, se eu<br />
ousasse olhar pela janela, poderia vê-lo sentado em seu furgão, bebendo cerveja quente.<br />
Ele nem se dava mais ao trabalho de dirigir até a esquina.<br />
Quando Jodi estava com três anos, fomos a Hartley para o casamento do meu<br />
irmão Mike. Como Jodi e eu estávamos na cerimônia, Wally ficou com todo o tempo<br />
livre. Ele desapareceu e só voltou tarde da noite, quando todo mundo já estava<br />
dormindo.<br />
"Você está tentando nos evitar?", perguntei a ele.<br />
"Não, adoro sua família. Você sabe disso."<br />
Certa noite, a família estava sentada em torno da mesa da cozinha da mamãe e,<br />
como de costume, não era possível encontrar Wally em lugar nenhum. Assim que<br />
acabou a cerveja, mamãe foi ao armário onde guardava bebida extra para os amigos e<br />
parentes. A maior parte tinha sumido.<br />
"Que idéia foi essa de pegar a cerveja da mamãe?"<br />
"Não sei. Desculpe."<br />
"Como você acha que eu me sinto? Como você acha que Jodi se sente?"<br />
"Ela não sabe."<br />
"Ela tem idade suficiente para saber. Você simplesmente não a conhece."<br />
Medo de perguntar. Medo de não perguntar. "Você pelo menos está<br />
trabalhando?"<br />
"Claro que estou. Você vê os cheques de pagamento, não vê?"<br />
O pai de Wally dera a ele parte da firma de construções da família, o que<br />
significava que meu marido não recebia um cheque de pagamento constante. Eu não<br />
sabia se a companhia estava realizando projetos ou se o mundo inteiro desabava ao<br />
nosso redor.<br />
"Não é só o dinheiro, Wally."<br />
"Eu sei. Vou passar mais tempo em casa."<br />
"Deixe de beber durante uma semana."<br />
"Por quê?"<br />
"Wally."<br />
"Está bem, uma semana. Vou parar."<br />
Mas, de novo, nenhum dos dois acreditou.<br />
Depois do casamento de Mike, finalmente admiti que Wally tinha um problema.<br />
Que cada vez menos voltava para casa. Que eu quase não o via sóbrio. Ele não era um<br />
bêbado malvado, mas tampouco era um bêbado operante. E, mesmo assim, administrava<br />
as nossas vidas. Dirigia o nosso único carro. Eu tinha de tomar o ônibus ou pegar uma<br />
carona com uma amiga para comprar os mantimentos. Ele retirava o dinheiro dos<br />
cheques de pagamento e pagava as contas. Muitas vezes, eu me sentia mal demais para<br />
acompanhar as finanças, quanto mais para criar uma criança sozinha. Eu chamava nossa<br />
casa de "caixão azul", porque ela era pintada de uma tonalidade horrorosa de azul e