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Cada um chega a isso sozinho. Um ano depois, minha amiga largou do marido<br />
definitivamente. Ela não precisou de nenhuma ajuda nossa.<br />
Aprendi essa lição também, porque um casamento se desenrola lentamente.<br />
Talvez não seja a lentidão, mas a consistência o que a esmaga. Cada dia é um pouco<br />
pior, um pouco menos previsível, até que você está fazendo coisas que jamais pensaria<br />
fazer. Eu procurava comida uma noite, na cozinha, e encontrei um talão de cheques. Era<br />
de uma conta bancária secreta que Wally abrira para ele. Acendi o grill às duas da<br />
madrugada, rasguei os cheques um a um e os queimei. Na metade do processo, pensei:<br />
"Gente de verdade não vive desse jeito".<br />
Mas fiquei. Eu estava exausta. Estava emocionalmente esgotada. Minha<br />
confiança estava estropiada. Sentia-me fisicamente fraca em razão das cirurgias. E<br />
estava com medo. Mas não com medo o suficiente para fazer a mudança.<br />
O último ano foi o pior. Foi tão ruim que nem sequer consigo me lembrar dos<br />
detalhes. O ano inteiro foi tenebroso. Wally parara de voltar para casa antes das três da<br />
manhã e, já que estávamos dormindo em quartos separados, eu nunca o via. Ele saía<br />
cedo todas as manhãs, mas eu não sei para onde ia. Tinha sido posto para fora da firma<br />
da família, e nossa situação financeira estava indo de ruim a insuportável. Mamãe e<br />
papai me mandavam o que podiam. Depois, apelaram para o resto da família e<br />
coletaram algumas centenas de dólares. Quando aqueles recursos acabaram, Jodi e eu<br />
não tínhamos o que comer. Vivemos de aveia, nada a não ser aveia, durante duas<br />
semanas. Finalmente, apelei para a mãe de Wally, que eu sabia me culpar pela situação<br />
do filho.<br />
"Não faça por mim", eu disse. "Faça por sua neta." Ela comprou uma sacola de<br />
mantimentos, pôs em cima da mesa e foi embora.<br />
Poucas noites depois, Wally chegou em casa. Jodi estava dormindo. Eu estava na<br />
sala, lendo Um dia de cada vez, a bíblia do Al-Anon, um grupo de apoio para os<br />
esposos de alcoólatras. Não gritei com ele, não bati nele, nem qualquer coisa do gênero.<br />
Nós dois agimos como se Wally viesse para casa sempre. Eu não o via há um ano e<br />
fiquei surpresa com a péssima aparência que ele estava. Magro, doente. Era aparente<br />
que não comia há algum tempo. Eu conseguia sentir o cheiro de álcool, e ele tinha<br />
tremedeiras. Sentou do outro lado da sala sem dizer uma palavra, esse homem que<br />
costumava falar durante horas com qualquer pessoa, e ficou me observando ler. Por fim,<br />
cochilou, até que me surpreendeu quando disse: "Com o que você está sorrindo?".<br />
―Nada", respondi, mas, quando ele perguntou, eu sabia. Eu tinha chegado ao dez.<br />
Sem fogos de artifício. Sem injustiça final. O momento se introduzira tão<br />
silenciosamente quanto um estranho voltando para casa.<br />
Fui a um advogado no dia seguinte e dei início ao processo de divórcio. Foi<br />
quando descobri que estava com o pagamento da casa seis meses atrasado, seis meses<br />
de atraso também no pagamento do carro e com uma dívida de seis mil dólares. Wally<br />
tinha até feito um empréstimo para a melhoria da casa, mas é claro que não fizera obra<br />
alguma. O "caixão azul" caía aos pedaços.<br />
A avó Stephenson - mãe da minha mãe, que se divorciara de seu marido<br />
alcoólatra - me deu o dinheiro para salvar a casa. Deixamos o banco tomar o carro. Não<br />
valia a pena salvá-lo. Meu pai passou o chapéu em Hartley e conseguiu oitocentos<br />
dólares para me comprar o Chevy 1962 de uma velha senhora que nunca dirigia na<br />
chuva. Eu jamais pilotara um carro na vida. Tive aulas de direção durante um mês e<br />
passei no exame de habilitação. Eu tinha vinte e oito anos.<br />
O primeiro lugar para onde dirigi o carro foi o escritório da Previdência Social.<br />
Eu tinha uma filha de seis anos, um diploma de escola secundária, um histórico clínico<br />
que só podia ser chamado de desastroso e uma pilha de dívidas. Eu não tinha escolha.