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Filósofos Brasileiros - Curso Independente de Filosofia

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o sentimento religioso. A <strong>de</strong>speito <strong>de</strong> reconhecer a legitimida<strong>de</strong> do sentimento religioso<br />

e a substância dos motivos que criam as religiões, Tobias Barreto repelia as afirmações<br />

da igreja católica e da escolástica com a mesma energia com que se referia às concepções<br />

anti-religiosas. "Os <strong>de</strong>lírios da teurgia e os disparates do ateísmo são os elos extremos<br />

<strong>de</strong> uma mesma ca<strong>de</strong>ia".<br />

Tobias Barreto, <strong>de</strong>sse modo, era partidário da religiosida<strong>de</strong> na sua forma mais<br />

in<strong>de</strong>finida; uma religiosida<strong>de</strong> que consistia na consciência vaga <strong>de</strong> uma realida<strong>de</strong> suprema<br />

ante a qual o homem sentia-se espiritualmente inclinado, sem compreendê-la<br />

nunca.<br />

Eis aí porque não podia aceitar as pretensões dos teólogos no sentido <strong>de</strong> explicar<br />

e <strong>de</strong>screver a "enigmática realida<strong>de</strong> última do mundo, o ser obscuro e impenetrável para<br />

o pensamento". Declarava-se assombrado com as audácias teológicas e com sua pretensão<br />

<strong>de</strong> ressuscitar o cadáver da escolástica. Toda sua obra clamava contra as falsida<strong>de</strong>s e<br />

contradições dos sistemas teológicos.<br />

Seu <strong>de</strong>sdém pela teologia e pela igreja não atingiam o fundador do cristianismo.<br />

"A doutrina <strong>de</strong> Jesus, escrevia, foi uma essência preciosa que não encontrou recipientes<br />

capazes <strong>de</strong> guardá-la em toda sua pureza: jorrada do coração e <strong>de</strong>rramada abundantemente<br />

no seio dos eleitos, tomou rapidamente a cor terrena das fraquezas e das paixões<br />

humanas. Debruçados sobre aquele arroio <strong>de</strong> lágrimas divinas, os homens gotejaram fel<br />

e corromperam sua primitiva doçura". Sobre a divinda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Jesus, fazia esta sugestiva<br />

pergunta: "Se ninguém sabe com segurança quem é Deus como se po<strong>de</strong> saber com certeza<br />

que Cristo não é Deus?"<br />

Quando Tobias Barreto passava do plano das consi<strong>de</strong>rações gerais ao das realida<strong>de</strong>s<br />

religiosas no Brasil, seu espírito sarcástico manifestava-se em toda sua crueza.<br />

Seu <strong>de</strong>sdém pelos teólogos e pela Igreja chegava ao máximo, quando tratava do catolicismo<br />

brasileiro. Declarava-o menos trágico que cômico. Achava-o muito mais <strong>de</strong>moníaco<br />

do que teológico", porque em seu relacionamento com o sobrenatural, o crente brasileiro<br />

tinha maior interesse pelo diabo do que por Deus. Para Tobias Barreto a fé brasileira<br />

era puramente epidérmica e, quando muito, um "pedaço <strong>de</strong> estética selvagem",<br />

adaptado ao grau da cultura ambiente.<br />

Entre as pessoas cultas do Brasil só encontrava crentes no "velho Deus da teologia<br />

e da Igreja", revelando "uma enorme ignorância que caminhava lado a lado com o<br />

orgulho e com o <strong>de</strong>sprezo pelos gran<strong>de</strong>s feitos científicos".<br />

Se as concepções <strong>de</strong> Tobias Barreto relacionadas com as causas finais na natureza<br />

só lhe permitiam uma atitu<strong>de</strong> in<strong>de</strong>cisa, suas teorias sobre a casualida<strong>de</strong> no plano humano,<br />

individual e social, eram perfeitamente <strong>de</strong>finidas. Essa parte da sua filosofia era a<br />

mais cuidadosamente construída e a que divulgou cem mais firmeza, influindo com ela,<br />

<strong>de</strong>cisivamente, no pensamento do seu tempo.<br />

Estabelecia uma separação entre o homem consi<strong>de</strong>rado como ser biológico e o<br />

homem consi<strong>de</strong>rado como pessoa. O primeiro estava sujeito, segundo ele, às causas<br />

eficientes, ao rigor e à violência das leis naturais. O segundo era dotado <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong>,<br />

agia por motivos e causas finais.<br />

Obe<strong>de</strong>cendo às leis naturais, a vida se <strong>de</strong>senvolvia cegamente, mecanicamente.<br />

Os animais não podiam sair do círculo que <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>ssas leis lhes havia traçado a irracionalida<strong>de</strong>.<br />

Enquanto que o homem era capaz <strong>de</strong> agir livremente. A liberda<strong>de</strong> do homem<br />

originava-se do fato <strong>de</strong> que sua ativida<strong>de</strong> podia obe<strong>de</strong>cer às causas finais. A liberda<strong>de</strong>,<br />

portanto, não significava que o homem pu<strong>de</strong>sse atuar por capricho ou sem motivo,<br />

mas que era capaz <strong>de</strong> "realizar um plano por ele mesmo traçado, para alcançar uma meta<br />

que ele mesmo se propusera". Pela liberda<strong>de</strong> o homem afirmava a própria autonomia<br />

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