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O jornalismo em O tempo eo vento

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na primeira parte da trilogia, O Continente. Nesses capítulos a narrativa se concentra <strong>em</strong><br />

apenas três dias do mês de junho, de 25 a 27. Cercado pelas forças federalistas que há uma<br />

s<strong>em</strong>ana haviam tomado a cidade de Santa Fé, o intendente e chefe político republicano<br />

Licurgo Cambará e um grupo de correligionários tentam resistir ao cerco no interior do<br />

Sobrado, o casarão da família localizado <strong>em</strong> frente à praça central de Santa Fé. A comida, a<br />

água e a lenha para aquecer o fogão estão terminando. Na noite do dia 26, quando a batalha se<br />

aproxima de seu desfecho, o personag<strong>em</strong> Fandango, peão de estância e muito próximo dos<br />

Cambará, caminha até a despensa e volta minutos depois com um pacote e pedaços de<br />

madeira. Florêncio Terra o aguarda <strong>em</strong> frente ao fogo:<br />

– Veja só o que encontrei – cochicha.<br />

Ajoelha-se diante da boca do fogão e mostra a Florêncio o pacote à luz das<br />

brasas.<br />

– Que é isso?<br />

– Jornais velhos. Vou meter tudo no fogo.<br />

– Não faça isso. Deve ser a coleção do Licurgo...<br />

– Qual nada! Pra mim jornal só é bom mesmo pra começar fogo.<br />

Florêncio permanece calado e imóvel, enquanto o outro começa a rasgar velhos<br />

números de O Arauto e de O D<strong>em</strong>ocrata e a atirar os pedaços dentro do fogão. 3<br />

Este trecho da narrativa, que encerra o penúltimo episódio de “O Sobrado”, é a<br />

primeira referência que Erico Verissimo faz ao <strong>jornalismo</strong> impresso no romance O T<strong>em</strong>po e o<br />

Vento. O curto diálogo faz apenas uma referência a dois jornais, que reaparec<strong>em</strong> com força<br />

<strong>em</strong> “Ismália Caré”, mas já antecipa alguns el<strong>em</strong>entos da relação existente entre os<br />

personagens e os jornais ao longo do romance. A partir desse momento da narrativa<br />

ex<strong>em</strong>plificado com a citação, o <strong>jornalismo</strong> enquanto documento histórico passa a ser uma das<br />

estruturas de sustentação da narrativa, adotado de forma consciente pelo autor de O T<strong>em</strong>po e o<br />

Vento.<br />

Para reconstruir na forma ficcional o abrangente cenário da história do Rio Grande<br />

do Sul, Erico Verissimo se utilizou de diversas ferramentas. 4 Inspirou-se <strong>em</strong> pessoas reais<br />

para criar alguns de seus personagens, recorreu às m<strong>em</strong>órias da infância e experiências<br />

próprias e consultou livros de História e jornais, conforme afirmação do próprio escritor <strong>em</strong><br />

artigos e entrevistas. 5 No seu livro de m<strong>em</strong>órias Solo de Clarineta, 6 quando l<strong>em</strong>bra das<br />

3 VERISSIMO, Erico. O Continente II. 29 ed. São Paulo: Globo, 1997, p. 557.<br />

4 A mais completa fonte de pesquisa sobre o processo criativo da obra de Erico Verissimo está <strong>em</strong> BORDINI,<br />

Maria da Glória. Criação literária <strong>em</strong> Erico Verissimo. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1995.<br />

5 “S<strong>em</strong>pre que escrevo um romance, cuja ação se passa <strong>em</strong> fins do século passado ou princípios deste, costumo<br />

recorrer a velhas coleções do Correio do Povo, que, como test<strong>em</strong>unho da história e espelho da nossa vida social<br />

destes últimos oitenta anos, me pode fornecer com abundância. Muitas de minhas personagens costumam ler ou<br />

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