O jornalismo em O tempo eo vento
O jornalismo em O tempo eo vento
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circunstâncias que o levaram a começar a escrever O Retrato, <strong>em</strong> janeiro de 1950, Erico<br />
Verissimo afirma que “como não possuísse um escritório propriamente dito, usei a sala de<br />
jantar, colocando a máquina de escrever <strong>em</strong> cima da mesa, ladeada por pilhas de volumes<br />
contendo números do Correio do Povo correspondentes aos anos de 1910 a 1915”. E logo<br />
adiante ratifica: “Assim, ajudado por velhos jornais e pelas minhas às vezes nebulosas e<br />
outras vezes luminosas l<strong>em</strong>branças de menino, comecei a trabalhar no romance”. Com a<br />
confirmação do autor pela opção do recurso jornalístico na construção da trama, t<strong>em</strong>os o<br />
indicativo de um fértil material de análise que permite não apenas comprovar e confrontar<br />
relatos jornalísticos, mas também interpretar o papel discursivo da imprensa na formação dos<br />
arquétipos id<strong>eo</strong>lógicos dos personagens e a sua relação com os acontecimentos históricos<br />
dentro do romance.<br />
No período histórico delimitado na pesquisa, que vai dos últimos anos do regime<br />
monarquista até a ascensão de Getúlio Vargas à liderança do Governo Provisório e o<br />
conseqüente fim da República Velha, <strong>em</strong> 1930, os jornais se faz<strong>em</strong> presentes <strong>em</strong> praticamente<br />
todos os momentos decisivos da narrativa ficcional. É através dos periódicos e de seus<br />
redatores que o autor explora el<strong>em</strong>entos narrativos que auxiliarão na formação do cenário<br />
político e social e na reprodução das idéias <strong>em</strong> discussão entre liberais e republicanos nos<br />
anos que anteced<strong>em</strong> o fim da monarquia no Brasil. No capítulo “Ismália Caré”, cuja ação<br />
romanesca acontece <strong>em</strong> 1884, cinco anos antes, portanto, da Proclamação da República, os<br />
debates sobre monarquia versus república são apoiados <strong>em</strong> longos discursos que chegam aos<br />
personagens na forma de versão jornalística ou pela visão de jornalistas. Nesse ambiente de<br />
grandes transformações Licurgo Cambará concede alforria aos escravos do Angico, a<br />
propriedade dos Cambará, e Santa Fé se transforma legalmente <strong>em</strong> cidade por meio de lei<br />
aprovada na Ass<strong>em</strong>bléia Legislativa.<br />
Em janeiro daquele ano os republicanos do Rio Grande do Sul passam a contar<br />
com a voz do seu jornal, A Federação, dirigida por Júlio de Castilhos para fazer frente ao<br />
jornal A Reforma, que circulava desde 1869 a serviço das idéias de Gaspar Silveira Martins. A<br />
influência de A Federação na formação de uma consciência política e social identificada com<br />
os ideais positivistas de Augusto Comte é amplamente explorada pelo autor <strong>em</strong> sua obra.<br />
pelo menos mencionar o jornal que Caldas Júnior fundou. De certo modo o Correio passou a ser uma espécie de<br />
personag<strong>em</strong> de muitos de meus romances”. In: VERISSIMO, Erico. O Correio do Povo e eu. Correio do Povo.<br />
Porto Alegre, 1 out. 1975, p. 2-3.<br />
6 Solo de Clarineta I. 20 ed. São Paulo: Globo, 1995, p. 303-304.<br />
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