17.04.2013 Views

O jornalismo em O tempo eo vento

O jornalismo em O tempo eo vento

O jornalismo em O tempo eo vento

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Bandeira, o Tio Bicho, que é chamado de “bárbaro” pelo fato de preferir beber cerveja preta<br />

ao conhaque português <strong>em</strong> abundância no Sobrado. Para Rodrigo, o amigo nunca<br />

compreenderia a grandeza do movimento de 1930, desencadeado após o assassinato de João<br />

Pessoa, justamente por não ter o hábito da leitura.<br />

– E que me dizes desse belo movimento que agita o país? És um céptico, não<br />

acreditas <strong>em</strong> nada e <strong>em</strong> ninguém. Pois eu te repito que ainda tenho fé no Brasil. O<br />

gingante adormecido finalmente acordou. O assassinato de João Pessoa galvanizouo.<br />

O sacrifício do grande Presidente não foi <strong>em</strong> vão. Mas qual! Tu não lês jornais.<br />

(O ARQUIPÉLAGO, p. 639)<br />

Além de ser o centro para onde converg<strong>em</strong> as tensões da narrativa no romance,<br />

Rodrigo s<strong>em</strong>pre está numa posição superior aos d<strong>em</strong>ais <strong>em</strong> relação ao conhecimento<br />

adquirido através das publicações impressas. Essa condição ajuda a formar o caráter do<br />

personag<strong>em</strong> <strong>em</strong> todos os fragmentos do contexto histórico do romance a partir de 1910,<br />

quando ele retorna a Santa Fé formado <strong>em</strong> medicina e abre o jornal A Farpa. A sabedoria que<br />

adquiriu nos livros permite a Rodrigo interpretar melhor as notícias e agir como o mestre<br />

s<strong>em</strong>pre disposto a tirar as dúvidas de seus pupilos. Por vezes, ele apresenta a versão<br />

jornalística como uma arma de convencimento sobre determinado assunto posto <strong>em</strong><br />

argumentação. “Isso é invenção de jornal! – protestou Chiru”, descreve o narrador quando<br />

Rodrigo Cambará “esfregou-lhe na cara o jornal que acabara de chegar com a notícia duma<br />

tr<strong>em</strong>enda derrota sofrida pelas tropas de Honório L<strong>em</strong>es <strong>em</strong> Guaçuboi” (O ARQUIPÉLAGO<br />

II, p. 457).<br />

No Sobrado, ambiente onde acontece a maioria das ações envolvendo jornais ou a<br />

leitura de notícias, os componentes internos também acompanham a modernização dos<br />

ambientes e a sofisticação comum aos grandes fazendeiros. Mas isso tudo com esforço<br />

exclusivo de Rodrigo, que vai contra as posições conservadoras do pai Licurgo e do ceticismo<br />

da tia Maria Valéria. Rodrigo introduz no Sobrado o gramofone, encomenda comidas, bebidas<br />

e petiscos enlatados do exterior e cerca-se de amigos para longos serões. Assim como os<br />

saraus literários estão <strong>em</strong> alta no Rio de Janeiro, na fictícia Santa Fé as ceias entre amigos e<br />

familiares segu<strong>em</strong> essa característica de encontro festivo, para se falar das novidades do<br />

estrangeiro, de política e literatura. Jacques Leenhardt 43 vê o Sobrado como uma vitória<br />

simbólica da modernidade mercantil sobre a aristocracia latifundiária. Para ele, esse ambiente<br />

onde os índices de leitura estão b<strong>em</strong> acima do normal para a época mostra também que o<br />

43 Narrativa e história <strong>em</strong> O T<strong>em</strong>po e o Vento. In: PESAVENTO, Sandra Jatahy et al. Erico Verissimo: o<br />

romance da história. Op. cit. p. 34.<br />

39

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!