Um bosque perto de si - Ciência Viva
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novos ambientes 9,10 . No entanto, são também atribuídos a esses<br />
refúgios alguns fenómenos <strong>de</strong> disjunções entre espécies, isto é,<br />
o aparecimento <strong>de</strong> populações da mesma espécie, muitas vezes<br />
separadas por milhares <strong>de</strong> quilómetros. Noutros casos ocorreram<br />
alterações genéticas entre as populações <strong>de</strong> espécies em regiões<br />
que sofreram a glaciação e noutras regiões não glaciadas. Muitos<br />
taxa não re<strong>si</strong>stiram a estas alterações climáticas e extinguiram-se<br />
durante este período 9,10 .<br />
No fim da glaciação, a temperatura e humida<strong>de</strong> aumentaram 11 .<br />
Ocorreu a recolonização por organismos que se encontravam<br />
restringidos a refúgios, verificando-se uma nova expansão dos<br />
<strong>bosque</strong>s, com um fluxo genético que <strong>de</strong>terminou o património<br />
genético existente atualmente, incluindo o do género Quercus,<br />
presentemente representado por 24 espécies autóctones na<br />
Europa 12 .<br />
Hoje em dia reconhece-se que, ao longo dos tempos, existiram em<br />
Portugal diversos refúgios para a flora, como é o caso da Serra da<br />
Arrábida, Monchique, Caramulo, entre outros. 13,14<br />
A expansão do género Quercus não foi linear, sofreu avanços e recuos<br />
ao longo dos milénios. Quando se iniciou a recuperação climática<br />
tardi-glaciar, há cerca <strong>de</strong> 15 000 anos, com uma temperatura <strong>de</strong><br />
cerca <strong>de</strong> 10 ºC inferior à atual, a recuperação através <strong>de</strong> flutuações<br />
temperadas foi intercalada com curtas fases frias 13,14 , o que explica<br />
as fortes flutuações <strong>de</strong> pólen <strong>de</strong> Quercus encontradas nos diagramas<br />
polínicos. Con<strong>si</strong><strong>de</strong>ra-se que o pólen <strong>de</strong> Quercus é dos melhores<br />
indicadores climáticos <strong>de</strong> entre todas as espécies arbóreas, já<br />
que a variação da sua percentagem é um reflexo indiscutível das<br />
variações <strong>de</strong> temperatura e <strong>de</strong> precipitação 15 .<br />
Em todo o planeta, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a Ida<strong>de</strong> do Bronze, a floresta tem uma<br />
longa história <strong>de</strong> intervenções provocadas pelo homem 11 . Em<br />
muitas áreas a intervenção humana começou há cerca <strong>de</strong> 4000<br />
anos 15,16 . Noutros locais essa intervenção ainda é mais antiga - é<br />
o caso da Serra da Estrela, on<strong>de</strong> a intervenção começou pelo<br />
menos há 8500 anos 15 . Estas transformações provocadas pela<br />
espécie humana foram <strong>de</strong>terminantes para o <strong>de</strong>saparecimento e<br />
surgimento <strong>de</strong> alguns taxa nalgumas regiões 17 .<br />
Segundo Bernardino Gomes, 1 são mais <strong>de</strong> 500 os topónimos<br />
existentes em Portugal relacionados com os carvalhos, sendo uma<br />
forte evidência da sua importância histórica em Portugal. Como<br />
estes topónimos se repetem em várias localida<strong>de</strong>s, contabilizamse<br />
em mais <strong>de</strong> 800 os locais com topónimos relacionados com<br />
o género Quercus, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o concelho <strong>de</strong> Melgaço (Sobreira,<br />
Carvalheiras, Carvalhos, Carvalhal, Carrasqueira) até Lagos<br />
(Monte do Carvalho, Carrascal).<br />
A floresta tem uma longa história que se mistura com a da<br />
humanida<strong>de</strong>. Tem mudado ao longo dos tempos <strong>de</strong> acordo com<br />
alterações climáticas, uma vez que o clima é o principal fator que<br />
condiciona o tipo <strong>de</strong> floresta. Atualmente a humanida<strong>de</strong> atravessa<br />
um período em que estão a ocorrer alterações climáticas que vão<br />
levar à extinção <strong>de</strong> muitas espécies e a uma expansão <strong>de</strong> muitas<br />
outras. A humanida<strong>de</strong> tem <strong>de</strong> apren<strong>de</strong>r a minimizar os efeitos das<br />
alterações climáticas, uma vez que está também em causa a sua<br />
sobrevivência.<br />
César Garcia<br />
Museu Nacional <strong>de</strong> História Natural e da Ciência , Univer<strong>si</strong>da<strong>de</strong> <strong>de</strong> Lisboa<br />
Centro <strong>de</strong> Biologia Ambiental<br />
Depois da estabilização climática <strong>de</strong> entre 6000 e 3000 anos até<br />
aos nossos dias, foi favorecido o estabelecimento dos <strong>bosque</strong>s que<br />
conhecemos atualmente. No entanto, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> há milhares <strong>de</strong> anos<br />
que a pressão humana nestes <strong>bosque</strong>s se faz sentir, mesmo antes<br />
do aparecimento da agricultura, conduzindo à sua progres<strong>si</strong>va<br />
substituição por formações arbustivas e herbáceas, bem como por<br />
matas <strong>de</strong> produção, especialmente <strong>de</strong> eucalipto, que têm vindo a<br />
16 <strong>de</strong>struir habitats e a conduzir à perda <strong>de</strong> solo e a outros problemas<br />
17<br />
relacionados com o abandono das terras.