Prosa - Academia Brasileira de Letras
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Antonio Carlos Secchin<br />
pobre vivente,/ On<strong>de</strong> vais, triste, mesquinho,/ Levando os raios da estrela/ nas<br />
asas do passarinho?”). Em “Sextilhas”, <strong>de</strong>staca- se a afinida<strong>de</strong> com pequenos seres<br />
tidos como repulsivos (aranhas, lagartas, rãs, moluscos), objetos <strong>de</strong> amoroso olhar<br />
que os acolhe exatamente por sabê- los vítimas da ditadura do belo e do harmônico:<br />
“Amo- os porque todo o mundo/ Lhes vota um ódio profundo,/ Despreza- os<br />
sem compaixão”. Varela cultiva a confraria dos excluídos. O <strong>de</strong>sconforto frente ao<br />
belo tradicional, e o consequente sentimento <strong>de</strong> solidão e marginalida<strong>de</strong>, comparece<br />
também no soneto “Desponta a estrela d’alva, a noite morre”. Após pintar<br />
um cenário paradisíaco, ocorre o conflito com a realida<strong>de</strong> visível, em <strong>de</strong>corrência<br />
da eclosão dos <strong>de</strong>mônios da paisagem íntima do poeta, opostos à serenida<strong>de</strong> e à<br />
or<strong>de</strong>m da paisagem externa: “Porém minh’alma triste e sem um sonho/ Repete<br />
olhando o prado, o rio, a espuma: / Oh! mundo encantador, tu és medonho!”.<br />
Sob forma <strong>de</strong> a<strong>de</strong>sões ou recusas, o espaço natural não <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser entrevisto<br />
como uma extensão do corpo ou da alma do poeta.<br />
ȄȄ<br />
A metalinguagem<br />
Em alguns textos, teremos Varela <strong>de</strong>bruçado não sobre o ato <strong>de</strong> pensar genericamente<br />
o poeta e a poesia, mas preocupado com o gesto concreto <strong>de</strong> escrever<br />
o poema. É o que suce<strong>de</strong> em “A pena”: com certa ironia, observa que cabe à<br />
arte superar a dor que eventualmente lhe tenha servido <strong>de</strong> inspiração (“De pé<br />
sobre a própria ruína/ Canta, oh! alma miseranda!/ Pe<strong>de</strong> ao inferno uma lira,/<br />
Toma os guizos da loucura,/ Dança, ri, folga e <strong>de</strong>lira/ mesmo sobre a sepultura!”).<br />
Em “Canção”, igualmente irônica, critica os artesãos da mediocrida<strong>de</strong>:<br />
“Máquina <strong>de</strong> escrever versos,/ Já não sei mais cantar// O segredo perdi das<br />
melodias,/ Agora é só rimar!”. A consciência metalinguística <strong>de</strong> Varela ainda se<br />
faz presente em algumas composições <strong>de</strong> teor brejeiro, a exemplo da “Canção<br />
lógica”: “Teus olhos são duas sílabas/ Que me custam soletrar”.<br />
ȄȄ<br />
Por fim, a temática da morte<br />
Em certo número <strong>de</strong> textos, Varela procura indagar o que po<strong>de</strong> advir do<br />
espólio da vida. As respostas são variadas: num caso (“Sobre um túmulo”), a<br />
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