Prosa - Academia Brasileira de Letras
Prosa - Academia Brasileira de Letras
Prosa - Academia Brasileira de Letras
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
Haron Gamal<br />
As palavras pronunciadas por essa menina, muitas <strong>de</strong>las verda<strong>de</strong>iras incógnitas,<br />
apontam o mesmo “lá”, ou melhor, o sentido outro, <strong>de</strong>slocado, que<br />
o vocábulo literário possui. Portanto, a força das palavras nesse conto não<br />
estaria apenas na previsão do futuro e da própria morte, mas, seguindo ainda<br />
o indício do título, estaria na construção <strong>de</strong> sentidos outros e mesmo <strong>de</strong><br />
ambientes que teriam à sua órbita constantes “lá(s)”, apontando a literatura<br />
como divergente do pensamento lógico e <strong>de</strong> certezas consolidadas.<br />
Embora apenas <strong>de</strong>ntro do universo abstrato da literatura, observamos, nos<br />
três contos apresentados, o po<strong>de</strong>r intenso da palavra em Guimarães Rosa.<br />
Po<strong>de</strong>r capaz <strong>de</strong> transformar o curso <strong>de</strong> tantas vidas. Em “Famigerado”, um<br />
médico serve <strong>de</strong> mediador para contornar o efeito explosivo <strong>de</strong> um vocábulo.<br />
O mundo da cultura aparece como juiz, capaz <strong>de</strong> apresentar as razões e vencer<br />
um conflito irremediável. Em “Sorôco, sua mãe e sua filha”, o po<strong>de</strong>r das<br />
palavras se transfere para um canto que contagia toda a população, mesmo<br />
que, inicialmente, tenha sido entoado por uma “louca”. Seria a poesia como<br />
canto a superar a razão estabelecida no universo da cultura, universo aqui representado<br />
pela cida<strong>de</strong> gran<strong>de</strong>, seus po<strong>de</strong>res e engenhos. Neste “A menina <strong>de</strong><br />
lá”, teríamos sempre um outro lugar (um lá), que revelaria a multiplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
sentidos <strong>de</strong> palavras e silêncios, premonitórios ou não, fazendo ruir a lógica<br />
da vida, mostrando no diverso a potencialida<strong>de</strong> da literatura, potencialida<strong>de</strong>,<br />
é bom repetir, que o universo da razão não é capaz <strong>de</strong> medir.<br />
Referências bibliográficas<br />
Auerbach, Erich. Mimesis. Tradução: equipe dirigida por J. Guinsburb. São Paulo:<br />
Perspectiva, 1987.<br />
Rosa, João Guimarães. Primeiras estórias. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Nova Fronteira, 2005.<br />
Ferreira, Aurélio Buarque <strong>de</strong> Holanda. Novo dicionário da língua portuguesa. Rio <strong>de</strong> Janeiro:<br />
Nova Fronteira, 1999.<br />
134