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POR António viCente*<br />
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A comunidade<br />
luso-americana e a política<br />
A emigração tem uma curiosa relação com o tempo<br />
– os que partem tendem a ‘parar’ o país no momento<br />
em que o deixam, e os que ficam cristalizam a imagem<br />
dos emigrantes no momento da partida; anos<br />
mais tarde, tanto uns como outros surpreendem-se<br />
quando constatam as enormes mudanças ocorridas.<br />
Uma curiosa e pouco conhecida mudança nos<br />
últimos anos tem sido o surgimento de um número<br />
cada vez maior de políticos luso-americanos com<br />
considerável sucesso na vida americana. Alguns são<br />
emigrantes, outros são filhos ou netos de emigrantes<br />
portugueses. Mas todos assumem e projectam<br />
a sua “herança” portuguesa. Ainda menos conhecida<br />
é a influência política da comunidade luso-<br />
-americana em alguns contextos específicos. Estes<br />
dados deviam talvez ser mais discutidos em Portugal<br />
não só pela importância que os Estados Unidos têm<br />
no mundo, mas também porque a comunidade<br />
luso-americana pode assumir um papel cada vez<br />
mais importante nas relações económicas e diplomáticas<br />
entre Portugal e os Estados Unidos.<br />
há quase duas décadas, a FLAD iniciou um programa<br />
específico destinado a conhecer melhor a comunidade<br />
e a apoiar projectos apresentados por<br />
associações luso-americanas. Para além do apoio a<br />
estudos académicos sobre a temática, as prioridades<br />
da <strong>Fundação</strong> têm sido a educação – bolsas universitárias<br />
a jovens luso-descendentes, ensino da língua<br />
portuguesa, apoio a estudos portugueses em universidades<br />
situadas em zonas da emigração portuguesa<br />
– e a promoção da intervenção cívica e eleitoral da<br />
comunidade. Neste último campo, a <strong>Fundação</strong> criou,<br />
em 1998, o Portuguese American Citizenship Project,<br />
um programa que actua em 16 cidades americanas<br />
com forte concentração demográfica portuguesa e<br />
que reúne líderes da comunidade, promove campanhas<br />
de naturalização e de recenseamento eleitoral e<br />
organiza debates políticos com candidatos eleitorais<br />
onde se discutem assuntos relevantes. Um dos aspectos<br />
mais inovadores do projecto foi o desenvolvimento<br />
de uma ferramenta informática que cruza de forma<br />
rápida e eficiente as bases de dados de clubes e associações<br />
luso-americanos com os dados oficiais de<br />
recenseamento e voto. Com esta informação, consegue-se<br />
compreender a força eleitoral do clube e<br />
empreender campanhas personalizadas de apelo ao<br />
voto. Assim, umas semanas antes de uma determinada<br />
eleição, os voluntários do projecto enviam centenas<br />
(por vezes milhares) de cartas personalizadas<br />
relembrando ao destinatário a eleição que se aproxima,<br />
o local onde vota e o respectivo horário. Na carta,<br />
é feito ainda um apelo à importância do voto. Uns<br />
meses mais tarde, consegue-se medir o impacto da<br />
campanha, pois nos Estados Unidos a informação<br />
sobre se uma dada pessoa se absteve ou votou é<br />
pública. Este método tem permitido constatar que,<br />
ao contrário do que se pensava, a comunidade luso-<br />
-americana tende a votar em percentagens superiores<br />
à média da dos locais onde vive. Comprova-se também<br />
que a intervenção do Portuguese American Citizenship<br />
Project permite aumentar de forma visível e consistente<br />
a taxa de participação eleitoral dos luso-americanos.<br />
Esta informação tem sido amplamente<br />
divulgada junto dos luso-americanos e dos políticos<br />
locais, o que tem constituído uma fonte de empowerment<br />
da comunidade.<br />
Mas muito antes do surgimento deste e de outros<br />
projectos semelhantes, vários luso-americanos obtinham<br />
importantes vitórias eleitorais nos Estados<br />
Unidos. Embora a comunidade luso-americana ainda<br />
não tenha gerado um candidato à Casa Branca (ao<br />
contrário da comunidade grega, com Michel Dukakis,<br />
em 1988), nos últimos anos emanaram da mesma<br />
dezenas de congressistas federais (durante a anterior<br />
legislatura havia quatro congressistas luso-americanos<br />
na Câmara de Representantes em Washington DC;<br />
actualmente, são três), representantes e senadores<br />
estaduais, membros do executivo estadual e presidentes<br />
de câmara. Muitos mantêm estreitos laços com<br />
Portugal, todos continuam intimamente ligados<br />
<strong>Paralelo</strong> n. o 2 | PRIMAVERA | VERÃO 2008 21