Volume 4 - TARANTINO - Via: Ed. Alápis
Volume 4 - Tarantino
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Bastardos Inglórios e Django Livre. Nesses dois últimos – até aqui – trabalhos que<br />
escreveu e dirigiu, Tarantino finalmente parece ter conseguido estabelecer<br />
transições mais suaves entre o melodrama sério e a comédia alucinada,<br />
entre a trama que é puro pretexto e frivolidade e a que se dirige aos “grandes<br />
temas”, entre o que agrada ao mainstream e o que apela ao underground. Mas é<br />
bem provável que Tarantino não tivesse conseguido atingir esse equilíbrio,<br />
que não tivesse conseguido calibrar sua metralhadora de referências, que<br />
não tivesse sido capaz de afinar seu discurso e de refrear as tendências mais<br />
exageradas de seus Kill Bill e Grindhouse, para chegar aos resultados de Bastardos<br />
Inglórios e Django Livre, se não tivesse antes passado pelo “desvio de percurso”<br />
em sua carreira que foi representado por Jackie Brown.<br />
Jackie Brown, blaxploitation e black music<br />
Na superfície, Jackie Brown parece ser o filme mais uncool de Tarantino. Mas<br />
o seu subtexto lida justamente com a possibilidade de manter-se cool, de<br />
envelhecer ainda “dando no couro”, para usar uma expressão rasteira, mas<br />
precisamente aplicável nesse caso. É como se, com esse filme, Tarantino<br />
endereçasse já uma questão ao Tarantino futuro, relativa ao seu próprio<br />
amadurecimento como artista: “serei eu cool até o fim? Saberei a hora de<br />
parar?” Se, em resposta, Tarantino parece ao menos por ora ter decidido<br />
“rejuvenescer” seu estilo e sua fórmula – e, consequentemente, seu<br />
público –, no momento em que concluía seu terceiro longa-metragem,<br />
o cineasta parecia ter amadurecido e domesticado seus ímpetos mais<br />
primais. Daí ter produzido precocemente esse filme de maturidade que é<br />
Jackie Brown, um filme que tematiza a própria questão do amadurecimento<br />
e da obsolescência. Que esses assuntos sejam abordados sob o formato<br />
de uma revisão da blaxploitation é indicativo de uma questão latente que<br />
Tarantino honestamente se faz, não apenas nesse filme mas em toda a sua<br />
abordagem de referências do passado: como é que uma tendência tão forte<br />
em determinado momento se torna velha e esquecida em uma dúzia de<br />
anos? Como é que talentos – e, no caso de Jackie Brown, sejam eles do cinema<br />
e da música, mas também do sexo e do crime – podem manter-se intactos e,<br />
ainda assim, não encontrarem mais do que desinteresse, desprezo, solidão?<br />
150 MONDO <strong>TARANTINO</strong>