106Lacan nomeou as modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> gozo, especialmente aquela que se situa na periferia docorpo como também fora <strong>de</strong>le, associando a estas bordas do corpo falante objetos separados <strong>de</strong>lemesmo, chamados <strong>de</strong> objeto pequeno a, seio, fezes, olhar e voz.Nosso problema no momento se coloca em outra perspectiva: distinguir não somente ocorpo do organismo, mas o corpo falante pulsional do corpo virtual e da máquina. Novos discursos,novas práticas.As novas experiências <strong>de</strong> gozo do corpo falante no encontro com o corpo virtual escrevemespeciais circuitos do olhar e da voz. Esta realida<strong>de</strong> discursiva limita, avilta ou faz retroce<strong>de</strong>r ocampo simbólico? Em princípio os avanços da tecnociência não representam um <strong>de</strong>clínio do camposimbólico. Sem dúvida alterações surgiram e alguns problemas da or<strong>de</strong>m do real estão colocados àcontemporaneida<strong>de</strong>, entretanto ampliam <strong>de</strong> novas formas o campo simbólico, creio. Nossa atenção,entretanto <strong>de</strong>ve incidir sobre os efeitos subjetivos que possam provocar, em especial, nos eventos docorpo que são os sintomas.Trago um fragmento <strong>de</strong> caso clínico elucidativo da nova realida<strong>de</strong> discursiva que estamosabordando: homem <strong>de</strong> 44 anos <strong>de</strong>manda análise movido pelo sofrimento causado pelo adoecimento<strong>de</strong> um sobrinho com prognóstico <strong>de</strong> 5 anos <strong>de</strong> vida. Teme não suportar esta situação, especialmenteo sofrimento do irmão mais novo, pai da criança, para quem é praticamente um pai. Este homem seconsi<strong>de</strong>ra bem sucedido e efetivamente o é, do ponto <strong>de</strong> vista profissional e econômico, familiar,dois filhos adolescentes, satisfatório relacionamento conjugal. Resta, porém, o receio permanente <strong>de</strong>algo grave lhe acontecer, razão pela qual quer falar para um analista na tentativa <strong>de</strong> se precaver. Oque não lhe basta.No avançar das entrevistas traz relevante aspecto: enorme temor <strong>de</strong> adoecer <strong>de</strong> mal súbito,que o leva a fazer semestralmente exames médicos <strong>de</strong> toda or<strong>de</strong>m. Procura se assegurar e seantecipar a qualquer infortúnio persuadindo os médicos a autorizá-lo a fazer exames invasivos parasaber o que está acontecendo <strong>de</strong>ntro do corpo. Não basta saber por fora, quer ver por <strong>de</strong>ntro.Primeiro conseguiu fazer uma endoscopia e nada foi encontrado no trato digestivo; já está marcadauma colonoscopia para verificar o trato intestinal, faltando o cateterismo. Felizmente o cardiologistatem recusado com veemência seu pedido. Eis a tecnologia a serviço do gozo do sintoma obsessivo.Eis um homem tentando anular o corpo libidinal para transformá-lo numa máquina controlável.Este homem soube precocemente da existência da morte, do significante morte. Conheceu amorte do corpo do outro querido aos cinco anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong> com a morte do pai. A experiência serepete aos vinte e três anos com a morte da mãe <strong>de</strong> enfarte fulminante. A anunciada morte do únicofilho do irmão o <strong>de</strong>sespera <strong>de</strong> modo surpreen<strong>de</strong>nte. Não teme a morte, teme a contingência, o acaso,o azar: o pai morre <strong>de</strong> aci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> carro dirigindo em viagem <strong>de</strong> férias com a família, o coração damãe não resiste aos 43 anos e um tumor numa região do cérebro inacessível a cirurgia aparece emum sobrinho <strong>de</strong> quatro anos. Resta-lhe, equivocadamente, apostar no Deus máquina da tecnociênciacapitalista que tudo promete saber, curar, prevenir.Em outra perspectiva, algumas situações relativas às crianças na contemporaneida<strong>de</strong>merecem a atenção dos psicanalistas. Elas convivem com o outro corpo virtual, o olhar virtual, avoz virtual <strong>de</strong>s<strong>de</strong> muito cedo, iniciada com as babás eletrônicas, os ví<strong>de</strong>os para entreter recémnascidose os <strong>de</strong>senhos animados tão logo começam a falar, seguida das conversas virtuais com oscolegas <strong>de</strong> escola e amigos. É significativo o aumento das brinca<strong>de</strong>iras nos jogos eletrônicos e noscomputadores, em lugar da companhia presencial do outro. Não creio que chegue a prejudicar afantasia, o <strong>de</strong>vaneio e a imaginação infantil, apenas exigem novos e atentos cuidados paradimensionarmos seus efeitos subjetivos. Creio que é preciso se ocupar <strong>de</strong> respon<strong>de</strong>r às perguntascrucias sobre a natureza dos laços sociais que estão sendo engendrados nos encontros virtuais.Sabemos que a voz que vem do outro ganhou novas dimensões. Des<strong>de</strong> o início o século xxnão veio apenas <strong>de</strong> outro corpo falante, mas do rádio, da TV, do cinema, da internet, e as criançascrescem nesse mundo virtual que falam para elas sem um corpo presencial, uma voz presencial,porém uma voz que fala para qualquer um, para todos, para ninguém, apenas falam sem passarpelos <strong>de</strong>sfila<strong>de</strong>iros pulsionais inconscientes do corpo falante. I<strong>de</strong>m para o olhar. Sinalizo que nãoprecisaríamos dos aparelhos da tecnologia para ouvir vozes que não vêem <strong>de</strong> outro corpo falante
107presente, pois, os psicóticos nos falam disso <strong>de</strong>s<strong>de</strong> sempre.Sabemos, por essa e outras razões que a virtualida<strong>de</strong> sempre regeu o circuito dos corposfalantes dos sujeitos, mas na atualida<strong>de</strong> é preciso distinguir as virtualida<strong>de</strong>s, como também as vozesdos circuitos do objeto a, daquelas que estão nos circuitos da máquina.Da <strong>de</strong>finição lacaniana das pulsões como o eco no corpo sensível ao dizer, valorizo o trecho‘o corpo tem orifícios, dos quais o mais importante é o ouvido porque não po<strong>de</strong> se fechar, viés querespon<strong>de</strong> ao que chamou <strong>de</strong> voz,’ por on<strong>de</strong> introduz a anteriorida<strong>de</strong> imperativa <strong>de</strong> alíngua naconstituição da subjetivida<strong>de</strong> do corpo falante.O corpo do ser falante sendo um fato <strong>de</strong> discurso é o que há <strong>de</strong> mais essencialmente afetadopelo significante em seu gozo. Apostando que falar é uma pulsão com a qual o homem tudo inventa,inclusive a tecnociência, acredito que sempre disporá dos recursos simbólicos para tratar o real docorpo falante, mistério do inconsciente.
- Page 2 and 3:
2Heteridade9O «misterio do corpo f
- Page 4 and 5:
4SumárioEDITORIAL ................
- Page 6:
6XII. LE CORPS SUBSTANCEDe l’insu
- Page 9 and 10:
91900; la psychanalyse reste confin
- Page 11 and 12:
11Enfermares del cuerpo fuera del s
- Page 13 and 14:
13fui el buey atado al carro que ca
- Page 15 and 16:
15da familia dele. Cedo, os pais de
- Page 17 and 18:
17Problemas clínicos en relación
- Page 19 and 20:
19La apuesta psicoanalíticaAbordam
- Page 22 and 23:
22Le malentendu de la jouissancever
- Page 24 and 25:
24reprend un an après Encore la qu
- Page 26 and 27:
26Du parlêtreColette SolerMa quest
- Page 28 and 29:
28jouissance, sans majuscule à aut
- Page 30 and 31:
30proyectarse de mil maneras, hasta
- Page 33 and 34:
33Impudence du dire et identificati
- Page 35 and 36:
35veut dire qu’il n’y a qu’un
- Page 37 and 38:
37agganciabile solo in un sintomo p
- Page 39 and 40:
39Un corps, en corps, encore. Statu
- Page 41 and 42:
41infanzia a età adulta, da oggett
- Page 43 and 44:
43Memories from childhood 2A hot su
- Page 46 and 47:
46Body partsLeonardo S. Rodríguez1
- Page 48 and 49:
48Psychosomatic phenomena appear in
- Page 50 and 51:
50the oppressive imposition of oral
- Page 52 and 53:
52about the weaknesses of psychoana
- Page 54 and 55:
54to the structuring of coexistence
- Page 56 and 57: 56A few years later, he contacted m
- Page 59 and 60: 59Geometría de los cuerpos errante
- Page 61 and 62: 61muscular (luchando o huyendo, por
- Page 63 and 64: 63a las zonas erógenas, en una sue
- Page 65 and 66: 65Destinos del oráculo: de la voz
- Page 67 and 68: 67Un sueño le devuelve a sus temor
- Page 69 and 70: 69cet événement.Si, comme le dit
- Page 72 and 73: 72Poder dirigirse al OtroXavier Cam
- Page 74 and 75: 74A partir de ahí puede acceder a
- Page 76 and 77: 76una suerte de barreras defensivas
- Page 78 and 79: 78El cuerpo flagrante de la épocaJ
- Page 80: 80permita hacer otra cosa que queda
- Page 83 and 84: 83Segundo Jacques Aubert, principal
- Page 85 and 86: 85O Fetiche como Fracasso do Sintho
- Page 87: 87As três condições que Marx est
- Page 90 and 91: 90Dire, comme Freud, que la vie, po
- Page 92 and 93: 92fait surnaturel due à l’interv
- Page 95 and 96: 95A letra de amor no corpo (La lett
- Page 97 and 98: 97essas cadeias entrarem em alguma
- Page 99 and 100: 99Primeiro tempo de análiseApenas
- Page 101 and 102: 101Ce que le sujet autiste nous app
- Page 103 and 104: 103de la demande.J’avais accepté
- Page 105: 105O corpo da psicanalise e a tecno
- Page 109 and 110: 109Em 1964 3 , o trauma toma um est
- Page 111 and 112: 111«Je n’ai pas de bouche»Que n
- Page 113 and 114: 113Le délire des négations, qui e
- Page 115 and 116: 115nell’apologo dei tre prigionie
- Page 117 and 118: 117
- Page 119 and 120: 119sua casa, as suas suspeitas se c
- Page 121 and 122: 121Corpsificação: circuito pulsio
- Page 123 and 124: 123forma de retorno do real que se
- Page 125 and 126: 125champ du partenaire sexuel, et d
- Page 127 and 128: 127
- Page 129 and 130: 129Mais pas le support de n’impor
- Page 131 and 132: 131colère chez ses parents et nota
- Page 133 and 134: 133morrer», ou «viver com o míni
- Page 135 and 136: 135Il «corpo parlante» e il miste
- Page 137 and 138: 137questa perdita —che condiziona
- Page 139 and 140: 139
- Page 141 and 142: 141lors essentiel, c’est de saisi
- Page 143 and 144: 143signifiant qui causent sa jouiss
- Page 145 and 146: 145son enfance) pour penser.Pour pe
- Page 147 and 148: 147BibliographieSOLER C. (2009), La
- Page 149 and 150: 149CorpoemaAntonio QuinetO «fala-a
- Page 151 and 152: 151Nas artes cênicas, o ator ou ba
- Page 153 and 154: 153Le miracle de l’araignéeMarc
- Page 155 and 156: 155Si parler c’est mettre en scè
- Page 157 and 158:
157en tant qu’il n’y a pas de s
- Page 159 and 160:
159satisfaction, qui est une autre
- Page 161 and 162:
161Encore: corps et répétition da
- Page 163 and 164:
163dans le transfert, il se trouve
- Page 165 and 166:
165«Mystère, mister, mi-s’taire
- Page 167 and 168:
167l’acquisition des plus-de-joui
- Page 169 and 170:
169
- Page 171 and 172:
171De l’incarnation à l’irréd
- Page 173 and 174:
173est dédoublée dans un rapport
- Page 175 and 176:
175Les impasses de la vie amoureuse
- Page 177 and 178:
177maladie»?J’ai gémi, pas seul
- Page 179 and 180:
179féminines qu’elle connut, Nat
- Page 181 and 182:
181Un cuerpo con memoria antiguaTri
- Page 183 and 184:
183también da cuenta de cómo se p
- Page 185 and 186:
185