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Sanatorium - Unama

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www.nead.unama.br<br />

— Então, diga-me: que tal está o teatro? Muita gente, hein? E todos foram;<br />

cuido que só ficamos, eu e a D. Carmita. Simpática senhora, não é comendador?<br />

Bonita, bem educada, fina de trato...<br />

— Ah! — mas sem dúvida... Conheço muito a família... — rugia o Romaguera,<br />

exasperado, frenético, prestes a soltar alguma tolice.<br />

— Ela deixou-me há pouco; disse-me que ia escrever uma carta urgente,<br />

creio eu.<br />

— Por força... Como não? Ora, essa! — Bem, Sra. Marquesa, dê-me licença...<br />

— Aonde vai, comendador? Volta àquele infecto espetáculo? O segundo ato<br />

não deve começar já, suponho... Os intervalos não são de vinte minutos? Quero<br />

tocar-lhe um trecho de meu hino e pedir sobre ele a sua opinião insuspeita...<br />

— Desculpe-me, desculpe-me. Vim à casa só buscar umas cartas, que recebi<br />

hoje do Paraná e quero mostrar a um amigo, durante o intervalo. Não posso<br />

demorar-me; aliás, com muito prazer ouviria a sua admirável composição. Outra vez,<br />

se me der a honra... Sra. Marquesa...<br />

E, rapidamente, saiu do salão. Dez segundos mais, que lá ficasse e de duas<br />

uma: ou caía fulminado por um ataque apoplético, ou perdia a cabeça, e dizia<br />

desaforos à Marquesa, e quebrava espelhos e móveis... Reparou para um lado e<br />

para outro, que ninguém o observasse; os corredores estavam desertos, quase às<br />

escuras; só, lá no fundo, brilhavam as frestas de uma porta, pequeninos riscos de<br />

luz, e percebia-se vagamente um estálido seco de fichas remexidas; a Marquesa<br />

voltara à carga, e o hino ao Saldanha continuava. Felizmente! — disse consigo<br />

Romaguera; e, em vez de dirigir-se para o seu quarto, tomou a banda oposta, onde<br />

morava a D. Carmita. Pisava cautelosamente, trêmulo de ira e de medo, como um<br />

ladrão receoso de ser descoberto. "42, 44, 46", ia contando para não se enganar de<br />

porta: "48. — É aqui". E deteve-se, indeciso a espiar; dentro, escuridão completa.<br />

Colou o ouvido à fechadura; parecia-lhe ouvir um murmúrio de vozes ciciantes,<br />

abafadas; que fazer? Passa-vam-se minutos sobre minutos; e ele estava ali, como<br />

pregado ao soalho. Que fazer? Repetia. Não havia agora de forçar a porta! Que<br />

escândalo seria!... Como certificar-se da verdade? Oh! Obstáculo terrível!<br />

Uma idéia súbita lhe acudiu. A passos largos atravessou a sala de jantar, e<br />

tomou o corredor da direita. — Quarto 56. Era o do Vidigal. Bateu a porta, de manso,<br />

depois mais forte. Não teve resposta. — Suceda o que suceder! Resolveu; e deu<br />

volta à maçaneta. Riscou um fósforo; a cama estava intata, e, sobre ela, a cartola e<br />

a bengala do elegante rapaz. Errava pelo ar um perfume ativo de Impérial Russe, de<br />

Guerlain. "Com os diabos! Ele está no hotel... E está lá! Lá!... Ou talvez na roleta...<br />

Vou ver..." Entrou na sala de jogo e procurou-o avidamente; nada. O malicioso<br />

Cavalcanti tocou-lhe no ombro:<br />

— Comendador, comendador... Você está incomodado hoje... Que é isso?<br />

Quem lhe matou seus cachorrinhos?...<br />

O Romaguera não replicava: nem talvez ouvisse. Todo o seu cérebro estava<br />

empolgado pelas garras de uma idéia fixa: "Agora é certo! É indubitável! Ele está lá..."<br />

Voltou ao quarto de D. Carmita, andando já sem precauções, exacerbado,<br />

febril, inconsciente. Ainda uma vez escutou distintamente um sussurro de conversa,<br />

risadinhas... Não se conteve; sacudiu a porta, com ímpeto; o rumor enorme,<br />

aumentado ainda pelo silêncio noturno, espalhou-se pela casa toda, através dos<br />

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