Sanatorium - Unama
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www.nead.unama.br<br />
— Nunca perante o direito internacional! O que me admira é que as nações<br />
estrangeiras, a Inglaterra e a França principalmente, ainda não os reconhecessem<br />
beligerantes.<br />
— Beligerantes? belige... Ora, ora, meu amigo! Era o que faltava! Para<br />
bombardearem a cidade, não é? Para destruírem o nosso Rio de Janeiro?<br />
— Mas; então, o governo terá todos os direitos e eles nenhum, nem o de<br />
defesa?...<br />
— Acreditem, meus senhores; o marechal triunfará, eu o sei de boa fonte...<br />
— E sem combate... — ajuntou o outro.<br />
— Veremos! Veremos!<br />
D. Carmita passava pelo braço de Vidigal; estava mais encantadora do que<br />
nunca, no seu vestido de seda cor de cana, ornado de rendas finíssimas e<br />
largamente decotado, com o colo alvo e os alvos braços rutilantes de jóias.<br />
— Nada de política, hoje, meus senhores, por quem são! Entremos para a<br />
sala que o concerto vai principiar.<br />
A discussão interrompeu-se; o comendador, irritado, tossiu ruidosamente, ao<br />
ver, D. Carmita e Vidigal juntinho como dois noivos.<br />
Com efeito, a orquestra executava os primeiros acordes do prelúdio do<br />
Guarani. Um grande silêncio se estabelecera no auditório. Só, no vestíbulo, Olívio<br />
Bivar conversava com Vicentim de Guimarães, e Manhães de Azevedo com<br />
Joãozinho Romão e Til Vóssio.<br />
— O bombardeio depois de amanhã! Que espetáculo admirável há de ser! —<br />
dizia Vicentim a Azevedo. — Sinto, deveras, não estar no Rio...<br />
— A D. Carmita é realmente uma deliciosa mulher! — observava Olívio. — É<br />
o pomo de discórdia desta casa! E, caramba! — vale a pena brigar por ela! ...<br />
— Aquele Romaguera é um elefante — exclamava Til Vóssio. — Calculo o<br />
que vocês se terão aborrecido com semelhante companheiro de hotel! ...<br />
— Ah! Tem pintado o diabo! É um sujeito perigoso! — respondeu Manhães de<br />
Azevedo. — E parece estar hoje num dos seus piores dias.<br />
— Anda no ar um sopro de tormenta próxima — conjeturou Romão.<br />
— Isto acaba mal...<br />
— Amigos! Vamos a um conhaque? — propôs Olívio Bivar.<br />
— Mas com todo o gosto e boa vontade!<br />
E os cinco moços abalaram a largos passos para o buffet.<br />
Era de uma incoerência extravagante o programa: ao prelúdio do Guarani se<br />
seguia a Prière du soir, de Cialdini; viera depois A Sabina, pela atriz Anita; e logo<br />
umas copias de El-Rey Que Rabió pela Concina; e como transição para a seriedade<br />
da primeira parte, a Zamacueca, tocada maravilhosamente por um violinista pardo,<br />
aproveitado discípulo de White; e, após um intervalo, a orquestra executava a<br />
Ouverture do Don Juan, de Mozart; e, para tornar de novo ao gênero cômico, a<br />
Leviccolo cantava com fingida ingenuidade, e profunda malícia, Mamãe me<br />
enganou; aplaudida, bisada, passara à cançoneta: Si yo fuera un gato negro — ai<br />
olé! — da Mimi Bilontra...<br />
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