Sanatorium - Unama
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Raymond segredou-lhe logo:<br />
www.nead.unama.br<br />
— Se quisesse, podíamos perder-nos juntos... Seria tão agradável! Não acha?<br />
— Não — respondia ela. — Só gosto dessas coisas no teatro. Meu caro<br />
Barão, já não estou em idade de me meter em romantismos...<br />
— Mazinha! A coisa teria graça, quando por mais não fosse, pela bela peça<br />
que pregaríamos no Mendes...<br />
— Ora, deixe o Mendes, Barão! Vive sempre a falar-me do Mendes!<br />
— Mas está claro! E incompreensível que a senhora, bela e requestada como<br />
é, só preste atenção a esse cabotin...<br />
— Tome cuidado! Olhe que essa palavra é uma injúria para toda a classe! E<br />
deixe-me falar-lhe com franqueza, pela última vez... Tinham parado à entrada de<br />
uma nova galeria. Desse ponto, por uma espécie de janela aberta na pedra,<br />
dominava-se todo o interior da fenomenal caverna. No alto rasgava-se uma fenda<br />
estreita, e um feixe de luz do dia entrava por aí, vaga, trêmula, incerta,<br />
espreguiçando-se pelas rugas do granito, e caindo de chofre no chão, numa larga<br />
nódoa amarela.<br />
Raymond e Leviccolo, num momento de silêncio, ouviram na mudez absoluta<br />
de tudo, claro, distinto, o barulho das gotas de água, que pingavam das estalactites.<br />
Estavam sós. Os outros, naturalmente, andavam por galerias afastadas...<br />
— Deixe-me falar com franqueza pela última vez, Barão! — repetiu Leviccolo.<br />
— Para mim e, em geral, para todas as mulheres de teatro como eu, só há uma<br />
possível espécie de amante: — um homem de teatro Também, um ator, um oficial do<br />
mesmo ofício. Só os oficiais do mesmo ofício nos servem, porque só eles nos<br />
compreendem, só eles nos perdoam, por isso mesmo, os caprichos, as infidelidades,<br />
os dias de humor negro, os desvios, as loucuras, tudo! Meu caro Barão! Não digo<br />
que não goste dos homens ricos como o senhor: seria uma falta de sinceridade! O<br />
que digo é que há homens ricos e homens ricos... Quero dizer que há Barões<br />
opulentos que nos apreciam, que nos pagam e que se vão embora; e há Barões que<br />
nos pagam, mas que nos importunam. Os primeiros são toleráveis; os segundos são<br />
terríveis... E sinto muito ser obrigada a dizer-lhe que o senhor pertence ao número<br />
dos segundos! E dito isso, caminhe... Barão! Não esteja comprometendo a minha<br />
reputação! — concluiu ela, com uma risada.<br />
O Barão gritou um "olá!" forte que ecoou longamente na amplidão pada acima<br />
da cabeça. Um rumor claro de gargalhadas soou. Duas luzes apareceram em frente,<br />
à mesma altura do lampião de Raymond. Era o resto do grupo que já tinha dado<br />
volta à galeria e preparava-se para descer.<br />
O Barão gritou um "olá"! Forte que ecoou longamente na amplidão da furna.<br />
E, logo, do lado oposto, rompeu a voz alegre de Alfredo Pereira:<br />
— Que é isso, Barão? Deu agora para raptar senhoras? Faltam-nos aqui a<br />
graciosa Leviccolo e a formosíssima D. Carmita. Isso é um roubo, uma violência,<br />
uma pouca vergonha.<br />
— A D. Carmita não está aqui! — respondeu a atriz.<br />
— Como não está aí? — clamou Romaguera. — Onde está, então? Agora,<br />
descida a rampa, estavam todos juntos, ao fundo da sala principal da Casa de<br />
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