JORGE MEDAUAR - O Homem que Sabia - Emanuel Pimenta
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<strong>JORGE</strong> <strong>MEDAUAR</strong><br />
o homem <strong>que</strong> sabia demais<br />
8<br />
emanuel dimas de melo pimenta<br />
Esse estranho e enigmático fascínio pela ciência, <strong>que</strong> partira da medicina, alimentava a<br />
sua grande admiração <strong>que</strong> pelo meu pai, <strong>que</strong> desde menino respirava ciência.<br />
No final das contas, era uma admiração recíproca.<br />
Tinham nascido no mesmo ano, e ambos amavam Portugal.<br />
Para completar, para além de amar Fernando Pessoa, o meu pai era um inventor de<br />
máquinas de medição de tempo, de quase todos os tipos, e esse fato parece ter sido algo<br />
profundamente marcante para o Jorge.<br />
- Que coisa formidável alguém poder se dedicar, durante toda a vida, de corpo e alma,<br />
aos enigmas do tempo. É um privilégio, uma coisa maravilhosa...<br />
De tempos em tempos, o Jorge e o meu pai se encontravam. Fechavam-se numa sala<br />
da empresa e conversavam livremente. Ninguém lá entrava quando os dois tinham a<strong>que</strong>las<br />
animadas conversas.<br />
O tempo, a reflexão sobre a inevitável metamorfose do fluir das horas, minutos, anos,<br />
séculos, pareciam estar na base das suas reflexões, pareciam ser o seu fundamento<br />
existencial.<br />
Também o era para o meu pai.<br />
Ambos eram declarada e apaixonadamente dominados por esse irresistível fascínio.<br />
A introdução do meu primeiro livro publicado, escrito quando eu tinha dezessete anos,<br />
foi feita pelo meu pai.<br />
Era um pe<strong>que</strong>no livro de contos – dedicado ao Jorge Medauar.<br />
Nele, o meu pai escreveu: «não é mais feliz o rei ou o famoso guerreiro; não poucas<br />
vezes é mais feliz o súdito ou o simples soldado. A felicidade está dentro de nós, cultiva-a<br />
continuamente, em qual<strong>que</strong>r circunstância da tua vida”.<br />
Hoje, na distância preparada pelos anos, até parece algo estranho – como se o mundo<br />
tivesse perdido um pouco da sua poesia – serem tão tênues as fronteiras entre o inventorempresário<br />
e o poeta.