(C. 1385-1464) 2007 - Departamento de História - Universidade ...
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Esta mundanall afeiçom [escrever <strong>História</strong>] fez a alguũs estoriadores, que os feitos <strong>de</strong> Castella,<br />
com os <strong>de</strong> Portugal escpreverom, posto que homeẽs <strong>de</strong> boa autorida<strong>de</strong> fossem, <strong>de</strong>sviar da <strong>de</strong>reita<br />
estrada, e correr per semi<strong>de</strong>iros escusos, por as mimguas das terras <strong>de</strong> que eram, em çertos<br />
passos claramente nom seerem vistas; [...] Nos certamente levamdo outro modo, posta a<strong>de</strong>parte<br />
toda afeiçom, que por aazo das ditas rrazoões aver podiamos, nosso <strong>de</strong>sejo foi em esta obra<br />
escprever verda<strong>de</strong>, sem outra mestura, leixando nos boõs aqueeçimentos todo fimgido louvor, e<br />
nuamente mostrar ao pobbo, quaaes quer comtrairas cousas, da guisa que aveherõ. 19<br />
Desta forma, Fernão Lopes estabelece um critério que sinaliza não totalmente<br />
para a <strong>de</strong>scrença e invalida<strong>de</strong> do relato em que se baseia, mas ele se propunha à luz da<br />
sua verda<strong>de</strong>, rever tal relato, e escrever o que consi<strong>de</strong>rava mais próximo do ocorrido.<br />
Ele critica o historiador castelhano, que no caso era Pero Lopez <strong>de</strong> Ayala, e procura<br />
completar ou <strong>de</strong>finir os dados <strong>de</strong>ste com outras fontes. Pensamos que seria uma<br />
contradição <strong>de</strong>le <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rar integralmente os relatos por ele consultados, pois seria<br />
negar as suas fontes; o que ele procura justificar, no nosso entendimento, seria propor<br />
uma avaliação dos acontecimentos feita por ele, acontecimentos contidos na crônica<br />
castelhana. Com isso, percebemos que tal argumentação se apresenta enquanto<br />
justificativa <strong>de</strong> redação, pois ele não se propunha a copiar integralmente um relato, mas<br />
observar versões, e através <strong>de</strong> seus julgamentos e conclusões, elaborar a sua crônica.<br />
Nisto Aida Fernanda Dias nos sugere:<br />
A crítica das fontes oferece-se-lhe complexa, quando sobre um <strong>de</strong>terminado fato possui<br />
informações discordantes. Se as fontes são fi<strong>de</strong>dignas, o Cronista chega a transcrevê-las, o que<br />
faz também, por vezes, quando são divergentes, e, então, <strong>de</strong> forma muito ‘natural’, chega a<br />
rejeitá-las todas, porque as não consi<strong>de</strong>ra dignas <strong>de</strong> fé, contando ele como lhe parece que as<br />
coisas teriam acontecido! Ou, incapacitado em resolver a situação, oferece as diversas versões e<br />
<strong>de</strong>ixa ao leitor a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> escolher a que mais lhe agrada, tal como ele também faz em<br />
alguns casos! O rigor da <strong>História</strong> é, nestes casos, abandonado e salta ao bico da pena, em muitos<br />
casos, a subjetivida<strong>de</strong> do Cronista, com as suas simpatias e antipatias, com uma verda<strong>de</strong> muito<br />
própria que, pela força da sua escrita, arrasta o leitor para idêntica interpretação. 20<br />
Ou seja, a retórica da direita estrada que justificava a sua redação também po<strong>de</strong><br />
ser aplicada a ele, pois Fernão Lopes procurava elevar a posição <strong>de</strong> seu escrito em<br />
relação aos <strong>de</strong>mais. Não queremos <strong>de</strong>senvolver uma discussão sobre qual versão seria<br />
mais autêntica, pois não nos cabe isto, e nem é o foco das pesquisas atuais, mas o que<br />
Aida Fernanda Dias bem nos lembra é que ele também está sujeito a estas críticas, pois<br />
o cronista trata <strong>de</strong> uma escrita subjetiva, mas que procura <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r com a objetivida<strong>de</strong><br />
da época, ou seja, a sua verda<strong>de</strong>.<br />
19 FL-CDJI-I, Prólogo. p. 2.<br />
20 DIAS, Aida Fernanda. op. cit. p. 415.<br />
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