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2154 - Diário do Poder Legislativo Vitória-ES, quarta-feira, 25 de maio de 2005 menino negro sobrevive porque a raça negra no Brasil é um pouco diferente da pintura que Gonçalves Dias fez da raça indígena. Ele falou em Juca Pirama de um jovem que foi preso por uma tribo adversária e que tinha um pai cego, e que pediu liberdade porque tinha um pai cego e os adversários o soltaram porque não comeriam a carne de um homem que chora. Ele voltou para o pai e o pai o devolveu para a tribo que o havia soltado e que se negava a comer a carne dele. De repente, ele pegou o tacape, apesar de apertarem com aquela corda a sua cintura, ele pegou o tacape e derrubou vários guerreiros. E alguém disse: “Basta, guerreiro ilustre, aças lutaste. E Juca Pirama: “O que deve morrer e merece morrer”. A negrada: “O que deve morrer e que insiste em viver”. O SR. PRESIDENTE – (CÉSAR COLNAGO) – Convido, para compor a Mesa, o Dr. Hédio Silva. (Toma assento à Mesa a referida autoridade) Passaremos à entrega da Comenda Domingos Martins no grau de Comendador, que foi oferecida e aprovada por esta Casa pela Mesa Diretora. Convido o Dr. Hedio Silva para receber a homenagem, por indicação da Mesa Diretora. (É feita a entrega, pelo Sr. Deputado César Colnago, da Comenda Domingos Martins) (Palmas) O SR. PRESIDENTE – (CLAUDIO VEREZA) – Receberá a Comenda Domingos Martins, a maior honraria que a Assembléia Legislativa tem, o Dr. Hédio Silva Junior. Doutor em Direito Constitucional pela PUC-São Paulo; Presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB de São Paulo; Professor de Direito Penal da Universidade Metodista de São Paulo; Coordenador Executivo do Centro de Estudos das Relações Trabalhistas e das Desigualdades; Consultor da Universidade de Brasília para implantação do sistema de cotas; autor do livro Direito e Igualdade Racial – Aspectos Constitucionais, Civis e Penais. Principais ações judiciais: defende no Supremo Tribunal Federal a ação sobre as cotas na Universidade de Brasília; autor da ação que atribui o direito aos pais de nomearem seus filhos com nomes africanos; autor da ação que valida casamentos em religiões afro-brasileiras; acompanhou os casos de denúncias de racismo do jogador Grafite, do São Paulo Futebol Clube, e dos atores do filme Cidade de Deus. Atualmente exerce o cargo de Secretário de Estado de Justiça e Cidadania do Estado de São Paulo e é Coordenador do Centro de Estudos das Relações Trabalhistas e Desigualdades, em São Paulo. Parabéns. Concedo a palavra ao Dr. Hédio Silva. O SR. HÉDIO SILVA – (Sem revisão do orador) – Boa-noite a todos, agradecemos aos organizadores deste evento pelo generoso convite para que pudéssemos estar nesta Casa nesta noite. Meus cumprimentos à Mesa, Excelentíssimo Presidente desta Casa Sr. Deputado César Colnago; Drª Catarina Cecin Gazele, representando o Procurador Geral de Justiça; Dr. Reinaldo Centoducatte, vice-Reitor da Universidade Federal do Estado do Espírito Santo; Dr. Fernando Zardini Antônio, Secretário de Justiça; Sr. Deputado Claudio Vereza; Sr. Deputado Florisvaldo Fier; Professor Joaquim Beato; - ele é meu amigo há muitos anos, inclusive lembrava-me quando estava no carro vindo para esta Casa que conheci o Sr. Joaquim Beato em meados dos anos 80. Portanto, já faz bastante tempo e o Sr. Beato continua vigoroso, brigador, guerreiro e para mim é uma honra poder estar novamente em sua companhia. -; Padre Dário Ferrera da Silva, representando a comunidade negra; Dr. Florisvaldo Dutra, Defensor Público Geral do Estado; Dr. Carlos Vinicius Costa de Mendonça, Ouvidor Geral da Universidade Federal do Estado do Espírito Santo. Apesar de termos tomado posse há três dias no honroso cargo de Secretário de Justiça do Estado de São Paulo, fizemos questão de vir participar desta Sessão Especial porque temos neste Estado amigos, irmãos, pessoas com as quais nos últimos vinte e cinco anos vimos aprendendo, lutando e - com certeza - coletivamente todos nós não seríamos capazes, o mais sonhador de nós há vinte e cinco anos, de pensar que alcançaríamos este momento tão absolutamente rico, revolucionário, inovador, pelo qual o nosso País passa. Não poderíamos
Vitória-ES, quarta-feira, 25 de maio de 2005 Diário do Poder Legislativo - 2155 deixar de estar presente nesta Sessão. Foi de fato o único compromisso que havíamos assumido antes do convite para assumirmos a Secretaria de Justiça do Estado de São Paulo. Realmente foi um convite que a nós foi feito há dez dias e tínhamos toda uma agenda para estar em outros Estados. Porém, fizemos questão de desmarcar todos os outros compromissos, do mesmo modo que fizemos questão de manter esta vinda ao Espírito Santo, pelo carinho que temos por este Estado. E é o carinho e a generosidade deste Estado que respondem por esta Comenda que muito nos honra em ter sido agraciado com ela. Agradeço, registro e saúdo a presença do Professor Santinho Ferreira de Souza, Pró-Reitor da Universidade Federal do Espírito Santo; do Dr. Agesandro da Costa Pereira, Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil Secção Espírito Santo. Em nome da ex-Secretária e minha amiga, Sra. Mirian Cardoso, quero saudar todos os companheiros de luta presentes nesta Sessão. Pretendemos assinalar algumas breves considerações sobre este tema, a partir do que poderíamos no debate talvez aprofundar um ou outro aspecto sobre essa temática da igualdade e das ações afirmativas. Começo comentando o fato de que o saudoso Sr. Getúlio Vargas perdeu a eleição em 1929. Ele assumiu o poder em 1930, fragilizado politicamente. O Getúlio chega ao Rio de Janeiro fragilizado, o forte componente regionalizado no seu discurso, mas fragilizado do ponto de vista político. E ele precisava de apoio social e precisava de dialogar com setores que detinham força política. E o Getúlio dialoga, então, com a Igreja Católica que - como os Senhores sabem - inaugura em 1931 o Cristo Redentor, uma homenagem ao papel, à presença do cristianismo no Brasil e institui a Justiça do Trabalho. Na verdade, a Justiça do Trabalho surgiu em 1929, alguns anos antes. Mas o Getúlio vai instituir na Justiça do Trabalho, no Direito do Trabalho, a primeira lei de quotas que eu tenho notícia registrada nas Américas, que é a Lei da Nacionalização do Trabalho. Eu até comecei depois a estudar um pouquinho essa temática das ações afirmativas e fui compreender porquê o meu avô, que era um ferroviário semianalfabeto, era tão entusiasticamente Getulista. Porque o meu avô tinha presente na memória o impacto da Lei da Nacionalização do Trabalho na vida dos trabalhadores negros. A Lei da Nacionalização do Trabalho definiu em 1931 - inclusive é um dispositivo, Sr. Presidente, que até hoje encontra-se registrado na CLT – que dois terços dos trabalhadores de qualquer empresa em atividade no Brasil deveriam ser nacionais. Significou, no momento em que começava o declínio da grande imigração européia pensada como um projeto capaz de viabilizar um país, que os Deputados da então Assembléia da Província de São Paulo discutiram exaustivamente no final do século XIX qual deveria ser o perfil do trabalhador ideal para erigir aqui uma nação respeitável no consenso das nações. E a escolha foi pelo trabalhador imigrante, especificamente pelo europeu. Mas Getúlio Vargas precisa de apoio popular e ele vai, então, instituir essa lei que privilegiava o nacional. Nas primeiras décadas do século XX, nacional no Brasil eram ou os poucos descendentes de senhores de engenho que haviam nascido aqui, alguns integrantes da côrte e dos setores de comércio, de tráfico que haviam nascido aqui ou os negros, os descendentes de africanos. Porque teoricamente o tráfico transatlântico terminou em 1850; a Lei que proibiu o tráfico foi de 1823 e a Inglaterra passa a patrulhar o Atlântico. Mas, de fato, o fim do tráfico do transatlântico só vai acontecer em 1850. Portanto, em 1930, nacional no Brasil era fundamentalmente a população negra. E meu avô se lembrava perfeitamente bem de um dado, de uma estatística que alguns historiadores registram e apontam que entre 1931 e 1935 quadruplicou a empregabilidade da população negra no Brasil no setor público e no setor privado. Há um historiador Norte-Americano George Engels, que fez um trabalho sobre isso e demonstra que entre 1931 e 1935 a empregabilidade da população negra no Brasil quadruplicou, muito embora não fosse a Lei da Nacionalização do Trabalho uma lei que tivesse um endereçamento especificamente racial. Mas a medida em que os negros eram os nacionais, foram barbaramente beneficiados por essa lei. Depois foi instituída a Justiça do Trabalho que, desde o seu nascedouro, adotou um princípio - os Advogados Trabalhistas que estão neste plenário podem me corrigir nas minhas deficiências, pois confesso as dificuldades que sempre tive desde a graduação com o Direito do Trabalho - que considera o empregado um hiposuficiente. A hiposuficiência significa que o
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