O Papel da Informação Geográfica na Sociedade - Instituto ...
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Destaque<br />
21<br />
try itself, as its own map, and I assure you it does nearly<br />
as well”.<br />
Lewis Carroll , in. “Sylvie and Bruno Concluded”<br />
A ideia de que existirá uma representação fiel <strong>da</strong> reali<strong>da</strong>de<br />
que só não é alcança<strong>da</strong> por incapaci<strong>da</strong>de técnica ou por<br />
desleixo <strong>na</strong> produção é um mito que tem consequências<br />
graves. Quando <strong>na</strong>s iniciativas inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>is de normalização<br />
se utiliza recorrentemente o conceito de universo do<br />
discurso e quando está consagra<strong>da</strong> a abor<strong>da</strong>gem às características<br />
geográficas através de ontologias, isto é, através<br />
<strong>da</strong> especificação do conceito que lhes está subjacente, é<br />
porque esta é a abor<strong>da</strong>gem mais eficaz.<br />
só por serem difusas mas por também serem variáveis. Optou-se<br />
por um conceito subjectivo de margem, definindo-a<br />
como sendo o limite de vestígios de erosão recente e assumir<br />
então como válido o que, com base nessa definição,<br />
fosse arbitrado pelas equipas no terreno. O significado de<br />
margem passou a ser assumi<strong>da</strong>mente de uma linha arbitra<strong>da</strong><br />
sobre critérios simples, o que não sendo inteiramente<br />
objectivo, por ser isso impossível, correspondia a um conceito<br />
operacio<strong>na</strong>l e consistente. A diferença de abor<strong>da</strong>gens<br />
era perceptível pela diferença relativamente ao que estava<br />
representado <strong>na</strong> melhor cartografia disponível para a zo<strong>na</strong>,<br />
em que a definição <strong>da</strong>s margens não obedeceu a uma análise<br />
tão detalha<strong>da</strong> nem a critérios similares.<br />
Quando se define domínio público hídrico como uma zo<strong>na</strong><br />
a menos de dez metros de uma linha de água e não se<br />
define linha de água – e atente-se que as definições podem<br />
ser várias e váli<strong>da</strong>s em diferentes contextos –, está a cometer-se<br />
um erro <strong>na</strong> modelação geográfica e não um erro<br />
cartográfico. To<strong>da</strong>s as representações <strong>da</strong> reali<strong>da</strong>de obedecem<br />
a um determi<strong>na</strong>do universo do discurso, mesmo que<br />
este não esteja devi<strong>da</strong>mente formalizado. Essa formalização<br />
deve ser traduzi<strong>da</strong> por uma especificação operacio<strong>na</strong>l, ou<br />
seja, <strong>da</strong>r como especificação as “casas representáveis à escala<br />
1/5000” ou “as linhas de água representáveis à escala<br />
1/25000” é manifestamente insuficiente.<br />
Os exemplos de problemas relacio<strong>na</strong>dos com a definição<br />
<strong>da</strong>s características geográficas são inúmeros, cito alguns<br />
relacio<strong>na</strong>dos com fronteiras, matéria que requer clareza e<br />
análise minuciosa e onde os conceitos vagos têm consequências<br />
graves.<br />
O tratado origi<strong>na</strong>l relativo ao delineamento <strong>da</strong> fronteira entre<br />
as possessões de Portugal e Holan<strong>da</strong> <strong>na</strong> ilha de Timor, agora<br />
transposto para a fronteira entre Timor-Leste e a Indonésia,<br />
estabelecia, para uma boa parte <strong>da</strong> extensão <strong>da</strong> fronteira, o<br />
seguimento do talvegue de rios. Ora o conceito de talvegue,<br />
correspondendo ao ca<strong>na</strong>l mais profundo no leito de um rio,<br />
não era aplicável <strong>na</strong> quase totali<strong>da</strong>de dos rios mencio<strong>na</strong>dos,<br />
secos durante grande parte do ano e com o curso principal<br />
muito variável <strong>na</strong>s épocas de chuva. Acordou-se em substituir<br />
esse conceito pelo de linha média, determi<strong>na</strong><strong>da</strong> geometricamente<br />
a partir <strong>da</strong>s margens. Acontece que também não<br />
era possível identificar as margens de forma inequívoca, não<br />
Ain<strong>da</strong> no domínio do delineamento de fronteiras, um outro<br />
exemplo é <strong>da</strong>do pelos segmentos de fronteira definidos por<br />
valores de latitude ou longitude. À época em que foram<br />
definidos, estes valores correspondiam a latitudes e longitudes<br />
astronómicas, dependentes <strong>da</strong> vertical do lugar mas<br />
com representação <strong>na</strong> forma de linhas rectas e implanta<strong>da</strong>s<br />
no terreno como tal. Essas linhas, quando são actualmente<br />
representa<strong>da</strong>s num referencial geodésico não possuem latitudes<br />
e longitudes geodésicas constantes, o que não gera linhas<br />
rectas independentemente <strong>da</strong> projecção que se utilize.<br />
Essas linhas apresentariam agora ondulações devi<strong>da</strong>s aos<br />
desvios <strong>da</strong> vertical, com valores <strong>da</strong> ordem de várias cente<strong>na</strong>s<br />
de metros, suficientes para gerar conflitos inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>is<br />
sem solução técnica.<br />
Definições deste tipo já não eram correctas <strong>na</strong> sua génese,<br />
acontecia simplesmente que a incorrecção era tolerável. O<br />
que se passa com as fronteiras passa-se em muitos outros<br />
domínios, a introdução do suporte digital e a exigência<br />
própria do uso para sistemas de informação operacio<strong>na</strong>is<br />
não são compatíveis com os níveis de indefinição antigamente<br />
aceitáveis. Situações semelhantes se passam com<br />
características geográficas instrumentais <strong>na</strong> gestão do território,<br />
com a linha de máxima preia-mar ou até mesmo o<br />
declive do terreno, com impacto directo no uso que se faz<br />
do território pois conferem aleatorie<strong>da</strong>de à definição <strong>da</strong>s<br />
condicio<strong>na</strong>ntes e arbitrarie<strong>da</strong>de à sua aplicação.<br />
Segundo mito: O mito <strong>da</strong> cartografia rigorosa<br />
“At the root of their power [of the maps] is our frequently<br />
unquestioning acceptance of cartographic messages. Even