como a mão à luva ao modelo político imanente, reforçando-o ainda mais (Oro, 2007,no prelo).Se a essas juntarmos outras análises feitas sobre o desempenho dos evangélicosnos parlamentos, especialmente no Brasil - que mostram não se tratar de um grupopolítico coeso, que são raros os temas e as votações em que se pode perceber aexistência de uma unidade evangélica (ela aparece em assuntos ligados à moral e aos“bons costumes”, como a discussão em torno do aborto e da união civil doshomossexuais), que "a "bancada" (evangélica) é um mito" (Fonseca, 2007, no prelo) -então se tor<strong>na</strong>m praticamente sem efeito as colocações, e mesmo as acusações e críticas,de que estaríamos presenciando <strong>na</strong> <strong>América</strong> Lati<strong>na</strong> uma tentativa “fundamentalista” de“religiogização” do político. Isto ocorre no fundamentalismo islâmico que, segundoDavid Martin, procura instaurar, em diversos países, uma hegemonia ideológica esubmeter todos os cidadãos às prescrições da lei islâmica. Mas, no caso dos evangélicos<strong>na</strong> política latino-america<strong>na</strong>, continua o sociólogo britânico, “a ambição (...) é somente,com uma ou duas exceções, constituir um grupo de pressão eficaz para defender seusinteresses institucio<strong>na</strong>is e os princípios morais em seu sentido amplo, e de fazer ouvirsuas vozes no debate público” (Martin, 2001: 63-64).Também, embora este seja um tema bastante controvertido, não parecem sesustentar as acusações segundo as quais a aproximação pentecostal ao políticoinstitucio<strong>na</strong>l constituiria um “retrocesso” da democracia republica<strong>na</strong>. Antes, diríamoscom Michael Dodson, seria mais pertinente se perceber em tal aproximação umestímulo aos valores e práticas democráticos (Dodson, 1997: 25-26). Semelhante idéia édefendida por Ricardo Mariano, para quem a presença evangélica no políticoinstitucio<strong>na</strong>l, bem como a sua obsti<strong>na</strong>da defesa da liberdade religiosa, “contribuipositivamente para a democracia brasileira e para a defesa da liberdade religiosa em simesma” (Mariano, 2007, no prelo). Ademais, é possível que o ingresso dos pentecostais<strong>na</strong> política possa significar uma incorporação da política por sujeitos sociais que, deoutra forma, se manteriam distantes da mesma. Neste caso, as igrejas se tor<strong>na</strong>m, atécerto ponto, espaços de aprendizado político sem constituírem uma ameaça ou umadesqualificação da democracia, mas um reforço e uma ampliação da mesma.Por tudo isto, sugerimos, portanto, que a democracia <strong>na</strong> <strong>América</strong> Lati<strong>na</strong>dificilmente pode passar ao largo da religião, diferentemente do modelo democráticosecularizante europeu, construído em cima da separação entre a instância privada (<strong>na</strong>51
qual se insere a religiosidade) e a pública (<strong>na</strong> qual impera o político) 31 . Lembremos queem boa parte dos paises da <strong>América</strong> lati<strong>na</strong>, como sustenta Corten, religião e política seassociam (Argenti<strong>na</strong>), se recobrem (Brasil), se aproximam por uma visão imanente dopolítico e do religioso (México), ou por uma visão transcendente do religioso e dopolítico (Venezuela) (Corten et alii, 2007).ConclusãoTudo indica que <strong>na</strong>s sociedades latino-america<strong>na</strong>s a religião continua sendo umdos aspectos incontornáveis da vida social, em graus variados, porém, segundo a maiorou menor densidade da cultura religiosa que vigora em cada país e mesmo em cadaregião. Isto tem seu efeito, tanto <strong>na</strong> coesão social quanto no sistema político.De fato, a tendência predomi<strong>na</strong>nte <strong>na</strong> <strong>América</strong> Lati<strong>na</strong> é de as crenças não serestringirem à esfera da subjetividade. Elas não são exclusivas da ordem do crer. Elas seinscrevem também <strong>na</strong> ordem da experiência e da ação. Por isso, são compartilhadascoletivamente, isto é, alcançam a ce<strong>na</strong> pública mediante práticas ritualísticas produzidaspor cada uma das religiões, independentemente de sua condição jurídica ouinstitucio<strong>na</strong>l. Assim sendo, as religiões produzem não somente pertencimentossimbólicos mas também vínculos sociais, ambos sendo decisivos para a configuraçãodo sentido de coesão social, em “graus” diferenciados segundo as igrejas e as religiões.Tal sentido, porém, está longe de ocorrer com exclusividade no campo religioso. Ele sedá igualmente, e paralelamente, em outras práticas, instituições e instâncias sociais quetambém se desencumbem com esse significado, novamente em graus variados segundoos grupos sociais e suas circunstâncias, como a família, a política, a escola, a arte, oesporte, a ciência, o lazer, as instituições etc.Decorre também que em razão das especificidades culturais próprias da <strong>América</strong>Lati<strong>na</strong>, verifica-se uma relativa aproximação entre o religioso e o político, ao menos nonível do imaginário. André Corten assim sintetiza as especifidades em questão:“A <strong>América</strong> Lati<strong>na</strong> se caracteriza por uma história onde o transcendente é menosradical que alhures. A saída do religioso é ali igualmente muito menos nítida. A históriada <strong>América</strong> Lati<strong>na</strong> é marcada por um religioso mais imanente. De um lado, a religiãoestá próxima das pessoas. Fala-se de religião popular. Da outro lado, o político não temo status de intangibilidade a partir da fonte da tradição republica<strong>na</strong>. O religioso estásempre presente, o político é muitas vezes fluído” (Corten et alii, 2007: 1).52
- Page 1 and 2: Coesão Social na América Latina:B
- Page 3 and 4: Religião, Coesão Social e Sistema
- Page 5 and 6: eligião predominantes nas Ciência
- Page 7 and 8: É no terceiro modelo, o da separa
- Page 9 and 10: Tabela II - Quadro religioso dos pa
- Page 11 and 12: Estados Unidos, predominantemente e
- Page 13 and 14: no âmbito das transformações das
- Page 15 and 16: pessoais, profundamente abaladas co
- Page 17 and 18: Enfim, há um outro aspecto associa
- Page 19 and 20: Com o retorno da democracia, porém
- Page 21 and 22: Um dos fundamentos de tal mentalida
- Page 23 and 24: uma culpabilização (...). A isto
- Page 25 and 26: É neste contexto cultural que para
- Page 27 and 28: no presente na Argentina, como vimo
- Page 29 and 30: católicos numa grande gama partid
- Page 31 and 32: Porém, nas últimas eleições maj
- Page 33 and 34: “No Brasil os imaginários polít
- Page 35 and 36: Note-se duas coisas: em primeiro lu
- Page 37 and 38: Consequentemente,“para os mexican
- Page 39 and 40: separação formal da Igreja Catól
- Page 41 and 42: uma sociedade como a uruguaia que t
- Page 43 and 44: pobre e a metade desta cifra é com
- Page 45 and 46: eligiosos, mesmo em espaços públi
- Page 47 and 48: Novamente recuperando as sugestões
- Page 49 and 50: “tem um Deus dos exércitos e um
- Page 51: todo o líder aja no “mercado rel
- Page 55 and 56: Burdick, John (1993), Looking for G
- Page 57 and 58: Mariz, Cecília (1996), "Pentecosta
- Page 59 and 60: total o parcialmente construidos co
- Page 61: ao nepotismo e à corrupção. Segu