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edição de 27 de agosto de 2018

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última página<br />

VisualCommunications/iStock<br />

O Brasil<br />

<strong>de</strong> sempre<br />

Stalimir Vieira<br />

Se você participa <strong>de</strong> um evento internacional<br />

sabe quando chegam os latinos,<br />

os africanos, os anglo-saxões, os eslavos,<br />

os nórdicos, os orientais, os árabes, os indianos,<br />

mas não sabe quando chegam os<br />

brasileiros. Os brasileiros po<strong>de</strong>m ser qualquer<br />

um dos anteriores ou todos eles juntos.<br />

Não existe uma cara <strong>de</strong> brasileiro. Não<br />

carregamos um potencial <strong>de</strong> unida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

qualquer espécie. Muito menos racial.<br />

Essa in<strong>de</strong>finição <strong>de</strong> origem, me parece,<br />

torna o brasileiro um <strong>de</strong>sgarrado <strong>de</strong> nascença.<br />

Um solitário vocacional. Um carente por<br />

natureza. Talvez isso explique um pouco,<br />

ainda que <strong>de</strong> maneira<br />

leiga e presunçosa, a<br />

nossa vulnerabilida<strong>de</strong><br />

a qualquer canto <strong>de</strong> sereia.<br />

Como não temos<br />

latente nenhum grito<br />

ligado a alguma ancestralida<strong>de</strong><br />

comum, nos<br />

tornamos presas fáceis<br />

<strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias exóticas e nos<br />

dispomos a seguir seja<br />

o que for, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que<br />

nos permita a ilusão<br />

<strong>de</strong> um senso <strong>de</strong> coletivida<strong>de</strong>.<br />

Lidamos mal<br />

com a <strong>de</strong>mocracia porque <strong>de</strong>mocracia pe<strong>de</strong><br />

uma mínima autossuficiência intelectual<br />

para ser compreendida e <strong>de</strong>fendida. Senão,<br />

é apenas uma “zona”. E é mesmo. O que<br />

torna essa “zona” chamada <strong>de</strong>mocracia<br />

uma expressão magnânima <strong>de</strong> civilida<strong>de</strong> é<br />

a qualida<strong>de</strong> da formação cultural <strong>de</strong> quem<br />

vive nela. Quanto mais livre for alguém,<br />

mais culto <strong>de</strong>ve ser. Não é o nosso caso. Por<br />

isso, <strong>de</strong>mocratas mais lúcidos bradam por<br />

educação, educação, educação.<br />

A verda<strong>de</strong>ira salvaguarda da <strong>de</strong>mocracia<br />

está na necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong>la. Não apenas a necessida<strong>de</strong><br />

prática, mas a consciência plena<br />

<strong>de</strong> seu significado, que aponta ser o único<br />

“Quem está à frente<br />

nas pesQuisas<br />

usa dos mesmos<br />

artifícios, conta com<br />

o vazio intelectual<br />

e se sustenta na<br />

mesma ‘ética’ dos<br />

colonizadores e<br />

dos aventureiros”<br />

caminho aceitável, apesar dos percalços. O<br />

Brasil, país jovem, que ainda convive com<br />

estruturas <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r arcaicas, que misturam<br />

um comodismo burocrático da conveniência<br />

do estado com o <strong>de</strong>scompromisso<br />

<strong>de</strong> uma colonização bandida, mantém, por<br />

opção, uma gran<strong>de</strong> massa populacional nas<br />

trevas da ignorância. É essa massa, perfeitamente<br />

manobrável, que sustenta as coisas<br />

exatamente como estão.<br />

Não me parece verda<strong>de</strong> que, diante do<br />

quadro político, o Brasil tenha retrocedido.<br />

Não há nada <strong>de</strong> diferente. Quem sabe, uma<br />

outra forma <strong>de</strong> preparar a receita <strong>de</strong> sempre,<br />

mas com os mesmos ingredientes, já<br />

que eles são os únicos <strong>de</strong> que dispomos. O<br />

que varia é a dosagem <strong>de</strong><br />

“consciência” (controlada)<br />

que se procura <strong>de</strong>spertar<br />

nas massas, valendo-se<br />

<strong>de</strong> um momento <strong>de</strong> receio<br />

instintivo, diante <strong>de</strong> uma<br />

crise que po<strong>de</strong> ameaçar<br />

necessida<strong>de</strong>s básicas.<br />

Afinal, se há instalado<br />

(e inútil) um senso comum<br />

<strong>de</strong> que a <strong>de</strong>mocracia<br />

é uma “zona”, bater palma<br />

com força e gritar “a<br />

<strong>de</strong>mocracia é uma zona”<br />

po<strong>de</strong> gerar uma percepção <strong>de</strong> que “o seu<br />

receio faz sentido porque a <strong>de</strong>mocracia é<br />

uma zona”. Não é um raciocínio inteligente<br />

nem faz falta que seja. Basta que <strong>de</strong>sperte<br />

um medo real da realida<strong>de</strong> vivida. O quadro<br />

eleitoral aponta isso claramente. Quem está<br />

à frente nas pesquisas eleitorais usa dos<br />

mesmos artifícios, conta com o mesmo vazio<br />

intelectual e se sustenta na mesma “ética”<br />

dos colonizadores e dos aventureiros.<br />

Foi assim que ocuparam, dominaram e<br />

nunca mais abandonaram o po<strong>de</strong>r. Dê-se o<br />

nome que se dê às nomenclaturas institucionais<br />

sob as quais esse po<strong>de</strong>r se disfarçou<br />

ao longo do tempo.<br />

Stalimir Vieira é diretor da Base Marketing<br />

stalimircom@gmail.com<br />

58 <strong>27</strong> <strong>de</strong> <strong>agosto</strong> <strong>de</strong> <strong>2018</strong> - jornal propmark

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