Outubro_2020 - nº 269
Órgão informativo do Centro Lusitano de Zurique Edição de Outubro 2020
Órgão informativo do Centro Lusitano de Zurique
Edição de Outubro 2020
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ESPECTÁCULO
25
tarra Hofner, modelo Telecaster, para aí em
décima mão, e quem me ensinou a tocar
foi o Edmundo, que era guitarrista, irmão
mais velho do Kalu, baterista do Xutos &
Pontapés, eles eram doze irmãos e eu passava
a maior parte do tempo em casa dos
pais deles.
Entretanto soube que na Rotunda da Boavista
morava um tipo que tinha uma bateria
em casa, que era o Rui Taborda, fui à
procura dele e desde aí nunca mais nos
largamos. Vi logo que o Rui era a pessoa
indicada para uma parceria, queria muito
vingar na música e impressionou-me nele a
imaginação e a criatividade. Passou a ir comigo
para o Orfeu e a partir daí pensamos
em formar um grupo, nasceram os Sticky
Fingers. Eu era vocalista e guitarrista mas
cedo percebi que tinha que trabalhar muito
para ser um guitarrista mediano, mais tarde
desisti da guitarra.
F: Um tempo depois juntas-te a uma outra
banda ainda mais a sério….
JG: Sim, havia um grupo rival que era o
Pesquisa, com o Henrique Oliveira (guitarra),
um viola baixo, um baterista e um vocalista,
que era o João Pequeno, um vizinho
meu, como eu era mais alto que ele, eu era
o João Grande (risos), o João Pequeno era
fraco de voz, e como eu tinha algum jeito
para cantar, um dia o Henrique convidou-
-me para ser a voz principal do grupo.
O Rui Taborda tinha jeito para teclados,
convenci então o Henrique a integra-lo
também na banda e assim foi, na altura
tínhamos um técnico de som, que era
o Rodrigo, que nos tempos livres tocava
bateria, e nós vimos logo que tinha jeito
para a coisa e como o nosso baterista se
entregou aos estudos, o Rodrigo entrou na
banda. Acabaram os Sticky Fingers e integramo-nos
no Pesquisa.
Entretanto o Rui deixa os teclados, passa
para viola baixo e entra o Luís Ruvina, filho
do dono da melhor casa de música do
Porto, e aí foi realmente o grande salto da
banda, passamos a ter bastante material à
disposição.
Atingimos alguma notoriedade e o Avelino
Tavares, que foi o criador do ‘Mundo
da Canção’, ficou nosso manager e arranjava-nos
concertos por todo o país. Começámos
então a ser conhecidos, com a
evolução do grupo, surgiu a necessidade
de sermos criativos, de compor e escrever
as nossas próprias letras e músicas, ter a
nossa identidade e deixarmos de ser uma
banda de covers.
F: Em 1977 editam o vosso primeiro single...
JG: Sim, fomos a Lisboa gravar à Rádio
Triunfo, despesas todas do nosso bolso,
saíram para aí uns mil discos, mas não
adiantou nada (risos), foi só para dizer que
tínhamos um disco na mão.
F: Quando nasce a banda TAXI?
JG: Em 1979, sai o Luís Ruvina e entendemos
que devíamos mudar o nome da banda,
deixou de ser Pesquisa, até porque eu
não gostava nada daquele nome, e escolhemos
TAXI. A escolha deveu-se ao facto
de ser uma palavra dita/conhecida em
muitos países e como nós cantávamos em
inglês, e tínhamos a ambição de ter uma
carreira internacional, achamos a escolha
acertada.
F: Entretanto acontece uma oportunidade
de darem um salto na carreira...
JG: Sim, fomos tocar ao Colégio Alemão,
que era frequentado por muitas raparigas
(risos), mas sem nós imaginarmos, o Tózé
Brito e o António Pinho foram lá ver-nos
actuar, na altura eram os caça-talentos
da Polygram (Universal). Eles adoraram o
concerto, onde intercalávamos músicas
nossas, com covers de Genesis, Rolling
Stones, etc. No final apresentam-se no
nosso camarim, ficamos empolgados com
tamanha surpresa, e perguntaram-nos se
queríamos gravar um disco. Nós caímos
de costas logo (risos), o coração disparou,
indescritível, estávamos em 1980.
Fomos a Lisboa gravar o disco, com o António
Pinho como produtor, gravamos durante
cinco dias, nós tínhamos tudo muito
bem ensaiado e as coisas correram muito
bem, mas antes, aquando do convite,
o António Pinho disse-nos que tínhamos
que cantar em português, não há bela sem
senão, eu nunca tinha cantado em português,
tivemos que refazer as letras todas, o
Pinho deu-nos uma ajuda preciosa na produção
do disco, na forma de cantar certas
palavras e frases, e acabou por correr tudo
bem.
Na época a Polygram era uma multinacional
com muita força nas rádios, na promoção
e divulgação das músicas dos seus
cantores. Entretanto também aparecem
programas de divulgação musical, como a
Febre de Sábado de Manhã, do Júlio Isidro,
onde fomos apresentar, em primeira
mão, a música ‘Chiclete’, e ficamos impressionados
com o imenso público a saltar
e a vibrar com uma música nossa, foi
absolutamente fantástico.
F: Saíram do anonimato...
JG: Exactamente de um momento para o
outro deixamos de ser quatro parolos aqui
do Porto, para sermos conhecidos no país
inteiro.
F: Achas que a banda contribuiu para o alavancar
do rock português e para o aparecimento
de novas bandas?
JG: Sem dúvida, há um momento chave,
que deu origem ao boom do rock cantado
em português, são os anos 1980/81,
com os álbuns ‘Ar de Rock’ de Rui Veloso,
‘À Flor da Pele’ dos UHF e o nosso disco
‘TAXI’, acho que a partir daqui a juventude
acordou para o que de bom se fazia em
Portugal.
F: 1981 editas o álbum ‘TAXI’, imaginavas
que irias obter um sucesso estrondoso
com este disco?
JG: Como eu te disse, nós tínhamos a
crença inabalável que iríamos obter sucesso
mas uma coisa é nós termos essa
crença outra era consegui-lo, por vezes é
estarmos na hora certa no local certo, há
pessoas que se esforçam toda a vida, têm
qualidade no que fazem mas nada acontece
de extraordinário.
F: Tiveram sorte...
JG: Nós tivemos sorte mas a sorte dá
muito trabalho, passamos todos os anos
70 a aplicar-nos, a tentar ser perfeitos, a
dedicar-nos por inteiro à música, não queríamos
ser outra coisa que não músicos.
Faltava alguém reparar em nós, faltava o
clique para podermos disparar. Estávamos
cientes do nosso valor mas com os pés
bem assentes na terra.
F: Foi o primeiro disco de ouro do rock
português, tendo vendido mais de
60.000 cópias em poucos dias. Nos teus
melhores sonhos, pensaste numa coisa
destas?
JG: Claro que não, de repente vendemos
mais de 60.000 cópias, dois discos de
ouro, nem pouco mais ou menos, nem tão
pouco a editora, ia sempre uma comitiva
connosco assistir aos concertos, por vezes
até o presidente, não sabiam o que
nos haviam de fazer. Eu sabia (risos), o que
nos pagavam era uma vergonha, o que nos
valeu foram os royalties, mas pronto, era
assim que estava assinado, nada a fazer,
se calhar sem eles nunca teríamos obtido
tanto sucesso.
F: Outro momento marcante na vossa
carreira foi 1981, no Dramático de Cascais,
na primeira parte do concerto dos
Clash, achas que este acontecimento
ajudou ao ‘boom’ da banda?
JG: Muito! Sabes na altura as rádios eram
um instrumento muito valioso na divulgação
do trabalho de um artista, não passavam
apenas uma música, aos poucos passavam
o álbum inteiro, diferente de agora
em que passam apenas uma música de
determinado cantor até à exaustão.
O disco tinha saído há muito pouco tempo,
ainda não sabíamos qual seria a reação do
público, como tu sabes, naquela época,
os grupos que faziam as primeiras partes
das grandes bandas eram quase corridos
a pontapé, embora com aquele nervoso
miudinho, entrámos com confiança e a coisa
correu muito bem.
F: O público ficou impressionado com
vocês....
JG: E eu com eles (risos), o que mais me
impressionou, foi que o disco tinha saído
há pouco tempo e o público sabia de cor as
letras de todas as canções que cantámos
naqueles 20 minutos, curiosamente naquele
dia de manhã tínhamos gravado em Cascais,
o videoclipe da canção ‘TVWC’, que
nos tinha corrido também muito bem.
Acabamos a actuação e o público pediu
encore, saímos do palco, e ainda lembro
da nossa cara, olharmos uns para os outros,
alucinados por ouvir o público gritar
por nós, voltamos ao palco e ‘desfizemos’
literalmente o pavilhão com a música ‘Chiclete’,
foi muito, muito bom. Foi das melhores
noites de toda a nossa carreira.
F: Durante aqueles momentos em que
conviveste de perto com os Clash,
aprendeste algo que pudesse ter sido
útil na vossa carreira musical?
JG: Nós convivemos pouco com eles, tiramos
umas fotografias juntos, mas repara,
no início dos anos 80, as coisas eram muito
diferentes de agora, os palcos eram muito
simples, sem ecrãs luminosos atrás, luzes,
etc.
Eles estavam a fazer uma tournée mundial,
estavam noutra dimensão em termos de
projecção internacional, tinham muita força
de guitarras, tal como nós, mas no que
respeita ao som, estavam muito a frente, tu
sabes que é muito importante para qualquer
conjunto a qualidade do som, ainda
hoje quando o assunto vem à memória,
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