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Outubro_2020 - nº 269

Órgão informativo do Centro Lusitano de Zurique Edição de Outubro 2020

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Edição de Outubro 2020

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CRÓNICA

31

O Torquemada português

LUÍS OSÓRIO

1.

Um amigo mostrou-me esta pérola que

foi escrita, com toda a solenidade, por

um padre que não é um padre qualquer.

Ricardo Cristóvão é pároco de Alcobaça.

É um símbolo de uma geração de novos

sacerdotes, de “jovens turcos”, capaz

de elevar a igreja portuguesa a um outro

patamar de preparação teológica e

até comunicacional.

2.

Mas estes tempos são estes tempos.

Já não há volta a dar.

Todos os extremistas de direita – uns

mais maluquinhos do que outros – começaram

a sentir-se respaldados para

dizer o que pensam sobre o mundo.

Não é por acaso que, ao mesmo tempo,

lemos, ouvimos e vemos tantos ao

mesmo tempo proclamarem as coisas

mais bizarras ou trogloditas.

Uns querem castrar.

Outros querem a pena de morte.

Outros querem tirar os ovários às mulheres

que abortam.

Outros querem abolir o crime de violência

doméstica.

Outros querem ver os ciganos confinados.

Outros assinam manifestos contra uma

disciplina que nos diz que não há raças

inferiores e que todos somos iguais.

E depois há este senhor, este padre,

que nos escreve esta maravilha sobre

os livros que são bons e os livros que

são maus.

Diz… adaptando Afonso de Ligório, um

santo italiano do século XVIII.

«Por isso, querido leitor, se chegar às

tuas mãos um tal livro, lança-o imediatamente

no fogo, para que não apareça

mais; e, se és pai de família, faze o que

estiver em tuas forças para afastar da

tua casa uma tal peste, se não quiseres

dar um dia rigorosas contas a Deus».

3.

Não é mentira, é mesmo verdade.

O pároco de Alcobaça, que continua a

ser pároco de Alcobaça depois de o ter

escrito, escreveu esta frase sobre o que

ele julga ser o mal, o diabo, o inferno.

O padre Ricardo Cristóvão, que leio

ser especialista em exorcismos, não

desconhece o papel da Igreja Católica

na legitimação de vários regimes

totalitários.

E não desconhece a história da Santa

Inquisição.

Para mim é claro que aquilo que escreve

não é inocente ou pueril... o pároco

de Alcobaça deseja relevar esses períodos

da Igreja Católica, deseja exaltar

o tempo em que a Igreja Católica zelava

pela moral e decidia o que devia ou não

ser dito, lido, falado.

O Padre Ricardo, sem o dizer, diaboliza

o Papa Francisco e os padres que certamente

na sua douta opinião estarão

a capitular na luta contra a supremacia

cultural marxista.

O Padre Ricardo é uma bandeira entre

os que desejam regressar ao antigamente

e contra a podridão deste tempo

de corrupção da carne e de diabo.

O Padre Ricardo é simplesmente um

fascista.

Um Torquemada.

E orgulha-se disso.

Mas continua a ser pároco numa cidade importante.

Não podia continuar a sê-lo se não tivesse o respaldo

de alguns bispos influentes. Simplesmente não lhe seria

possível.

E isso é deveras assustador.

Outubro 2020 | Lusitano de Zurique | WWW.CLDZ.EU

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