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Edição de 7 de dezembro de 2020

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última página<br />

Sobre o brilho<br />

nos olhos<br />

Unsplash<br />

rodolfo sampaio<br />

Eu sempre fui um apaixonado pela propaganda.<br />

Paixão mesmo. Tesão, tara.<br />

Fogo. E me entristece ver que, nas novas gerações<br />

<strong>de</strong> criativos, essa paixão está ficando<br />

cada vez mais rara. Não estou falando <strong>de</strong> falta<br />

<strong>de</strong> talento, muito pelo contrário: aqui nasce<br />

criativo “bão” em tudo quanto é canto, tal<br />

qual craques <strong>de</strong> bola surgem todos os dias nos<br />

terrões Brasil afora. Não é esse o caso.<br />

Falo daquela paixão arrebatadora que passa<br />

por cima dos <strong>de</strong>feitos (a nossa profissão<br />

tem muitos, como qualquer outra).<br />

Falo daquele brilho nos olhos ao se <strong>de</strong>parar<br />

com a gran<strong>de</strong> i<strong>de</strong>ia. Da eletricida<strong>de</strong> <strong>de</strong> buscar<br />

o diferenciado.<br />

Saí da URFJ especializado em greves, não<br />

em propaganda.<br />

Lembro-me que vagavam pelos corredores<br />

vários veteranos, que já tinham teoricamente<br />

acabado o curso, mas perambulavam por ali.<br />

Eu pensava: esses caras não trabalham não?<br />

Isso me <strong>de</strong>u aquele “gelado na bunda”, mesmo<br />

sem estar vendo sangue.<br />

Caramba, vou ser mais um <strong>de</strong>sempregado!!!<br />

Não é possível que eu percorra 60 km<br />

todo dia pra isso. Se é pra ser <strong>de</strong>sempregado,<br />

era melhor eu ficar em casa. Pelo menos economizava<br />

as passagens!<br />

Para tentar mudar meu suposto <strong>de</strong>stino<br />

trágico, cheguei a fazer faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> direito,<br />

profissão séria, mas isso é uma outra história.<br />

Falo do orgulho <strong>de</strong> fazer o que faz. De ser<br />

o que é.<br />

Meu romance com a propaganda começou<br />

como uma espécie <strong>de</strong> “blind date”.<br />

Eu não tinha a menor i<strong>de</strong>ia<br />

do que fazer no vestibular. Eu só<br />

sabia o que eu não queria fazer:<br />

medicina. Sou filho <strong>de</strong> médico e,<br />

muito sutilmente, na visão <strong>de</strong>le,<br />

meu pai dava indiretas, às vezes<br />

diretas, sobre o orgulho <strong>de</strong> ser<br />

médico, <strong>de</strong> nos ver médicos e coisa<br />

e tal.<br />

Acho a medicina uma profissão<br />

muito nobre e apaixonante, mas não era pra<br />

mim.<br />

Gente, eu sinto um ‘gelado na bunda”<br />

quando vejo sangue!!!!<br />

Aliás, minha filha sente a mesma coisa<br />

nessas ocasiões. Prova <strong>de</strong> que, se muitas vocações<br />

são hereditárias, as não-vocações também<br />

são.<br />

Eu me inscrevi no vestibular <strong>de</strong> comunicação<br />

social, com tanta convicção, SQN, que no<br />

dia da inscrição eu saí da fila e liguei <strong>de</strong> um<br />

orelhão pra minha mãe, na busca <strong>de</strong> uma confirmação<br />

<strong>de</strong> que estava fazendo a coisa certa.<br />

Não lembro do que ela disse, colocada nessa<br />

situação. Mas fui em frente.<br />

Comecei meu curso na UFRJ, Praia Vermelha,<br />

a famosa ECO. E, logo <strong>de</strong> cara, peguei<br />

uma greve <strong>de</strong> professores e funcionários. Seriam<br />

várias nos quatro anos que passei ali.<br />

“Meu roMance<br />

coM a<br />

propaganda<br />

coMeçou<br />

coMo uMa<br />

espécie <strong>de</strong><br />

‘blind date’”<br />

E como eu vi a luz? Comecei a estagiar na<br />

Artplan, como redator, numa equipe incrível.<br />

Eu criava, criava, mas nada era aprovado. E,<br />

no dia seguinte, fazia tudo <strong>de</strong> novo.<br />

Só toco. Até que um dia, emplaquei<br />

uma i<strong>de</strong>ia. Gente, foi uma<br />

revelação: ah, é isso??!!!! Entendi.<br />

Naquele dia eu não fui à UERJ,<br />

on<strong>de</strong> fazia direito à noite. Aliás,<br />

nunca mais voltei lá, para o <strong>de</strong>sgosto<br />

da minha mãe. Naquele<br />

dia eu me transformei num publicitário.<br />

Eu tinha, e tenho, um orgulho<br />

louco <strong>de</strong> ser publicitário. Enchia a boca pra<br />

contar o que estava fazendo. Ficava horas e<br />

horas atrás da melhor i<strong>de</strong>ia. Às vezes, como<br />

gato e rato, ela fugia <strong>de</strong> mim. Mas eu ia atrás,<br />

on<strong>de</strong> quer que ela fosse. Eu me sentia importante.<br />

Vaidoso mesmo, confesso.<br />

E a vida me levou a trabalhar, <strong>de</strong>pois daquele<br />

começo, com vários e vários profissionais<br />

completamente apaixonados por propaganda.<br />

Incansáveis nessa caça <strong>de</strong> gato e rato<br />

sem fim. Não vou citar nenhum, porque gostaria<br />

<strong>de</strong> citar todos.<br />

Hoje, em vários papos com criativos mais<br />

jovens, é recorrente essa analogia: “Mas você<br />

chegou na propaganda no auge da festa... A<br />

gente chegou não tinha mais salgadinho e estavam<br />

varrendo as latinhas <strong>de</strong> cerveja amassadas!”.<br />

É, o ritmo da música mudou radicalmente.<br />

Bora soltar a cinturinha e curtir.<br />

Rodolfo Sampaio é sócio e CCO da Moma Pro<br />

rodolfo@momapro.com.br<br />

50 7 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> <strong>2020</strong> - jornal propmark

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