Psicologia e Diversidade Sexual - CRP sp
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A homossexualidade não deve ser<br />
chancela para concessão de adoção,<br />
tampouco para negá-la.<br />
menina também como pai. Era a primeira vez no<br />
Brasil que os nomes dos dois pais constavam na<br />
certidão de registro civil.<br />
Embora no Rio, na época da minha pesquisa,<br />
ou seja, final dos anos 1990 do século XX, os pareceres<br />
dos psicólogos e dos assistentes sociais<br />
fossem favoráveis à adoção por homossexuais, o<br />
Ministério Público negava. Passava pelo serviço<br />
social, pela <strong>Psicologia</strong>, ambos favoráveis – salvo<br />
em casos em que havia alguma su<strong>sp</strong>eita em relação<br />
à sanidade mental do requerente ou comportamentos<br />
que revelassem risco para a criança.<br />
Chegava ao Ministério Público, que se colocava<br />
contrário, e o processo ia para o juiz, que dava<br />
uma sentença favorável. O Ministério Público entrava<br />
com um recurso, ia para segunda instância,<br />
o desembargador era favorável. E essa história se<br />
repetia em vários processos.<br />
A homossexualidade não deve ser chancela<br />
para concessão de adoção, tampouco para negá-la.<br />
São outros os a<strong>sp</strong>ectos, que não a orientação sexual<br />
dos pais, que devem estar em análise quando<br />
a questão é ser pai ou mãe.<br />
Na época da pesquisa eu buscava apenas casos<br />
de gays e lésbicas, acredito que a questão das travestis,<br />
por exemplo, seja mais complicada, gere mais<br />
preconceitos e temores. E a transexualidade é ainda<br />
outra questão, não vamos tratar das duas aqui.<br />
Então vou concentrar a minha fala pensando nas<br />
questões ligadas a gays e lésbicas, mas vou abordar<br />
rapidamente reflexões sobre parentalidade travesti.<br />
Existe o trabalho da Fernanda Cardoso, que<br />
eu recomendo. Ela também tem um artigo na coletânea<br />
que eu citei no início, que foi realizado na<br />
UFSC sob orientação de Miriam Grossi. A travesti<br />
é uma figura que tem mais dificuldade para entrar<br />
no mercado de trabalho, para acessar a Justiça e<br />
garantir seus direitos de um modo geral. O temor<br />
em relação a pessoas que em princípio escapariam<br />
mais da lógica binária marcada pelo masculino e<br />
feminino bem delimitados é maior. Inclusive por<br />
parte de psicólogos (as) pouco preparados (as)<br />
para lidar com questões que escapem aos contornos<br />
mais comuns. Se a parentalidade de gays e<br />
lésbicas hoje é um pouco mais palatável, e aí eu<br />
também estou falando entre os profissionais psi,<br />
quando entra na questão da travestilidade isso se<br />
complica um pouco mais.<br />
Tem outra coisa que aparece no campo da<br />
Fernanda Cardoso e se repete na entrevista que a<br />
gente fez com uma travesti que tinha três filhos,<br />
sobre referência de gênero. Elas falam sobre elas<br />
no feminino quase que o tempo todo, mas às vezes<br />
vão para o masculino. Então, por exemplo, essa<br />
travesti, que nós entrevistamos, tinha três filhos.<br />
Ela convivia com dois que a chamavam de pai;<br />
nunca teve contato com o terceiro filho. Um dos<br />
filhos era da empregada, que acabou deixando<br />
para a nossa entrevistada criar. Contou que um<br />
dia, seu filho estava na casa de um dos amiguinhos<br />
e comentou: “o meu pai tem vestidos muito<br />
São outros os a<strong>sp</strong>ectos, que não<br />
a orientação sexual dos pais, que<br />
devem estar em análise quando a<br />
questão é ser pai ou mãe.<br />
mais bonitos do que esses”. Nossa entrevistada<br />
ficou muito preocupada com a repercussão disso.<br />
Primeiro, porque estava revelando alguma coisa<br />
da vida dela. Depois, o que os pais do amiguinho<br />
iam fazer com essa informação? Tanto em relação<br />
a ela, quanto à seu filho e o filho deles. A entrevistada<br />
tinha uma filha mais velha, já adulta, que a<br />
chamava de pai. Eles se adotaram mutuamente, já<br />
quase adulta, embora não tivessem nenhum vínculo<br />
legal. Tem uma complexidade aí. Na verdade,<br />
a situação não parecia trazer incômodo, não tinha<br />
uma coisa de “Ah, eu queria que me chamasse de<br />
mãe, eu queria que me chamasse pelo nome”. O<br />
que a gente vai fazer com esse universo? Porque<br />
isso vai bater na <strong>Psicologia</strong> de qualquer maneira,<br />
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CADERNOS TEMÁTICOS <strong>CRP</strong> SP <strong>Psicologia</strong> e diversidade sexual