Psicologia e Diversidade Sexual - CRP sp
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vale para nós transexuais porque o psicólogo pode<br />
chegar à conclusão de que você não é transexual e<br />
não vai conseguir a cirurgia da mesma forma. E aí?<br />
Vai recorrer a quem?”<br />
Mais um depoimento: “Essa tal de transexualidade<br />
deve ser compreendida como realmente é em<br />
nossas vidas: mera e<strong>sp</strong>era pela adequação genital<br />
de qualidade e que atenda expectativas reais pela<br />
conversão hormonal, com segurança corporal e<br />
psíquica, intervenções médicas, cirúrgicas, clínicas,<br />
ditas secundárias, mas que na maioria das<br />
vezes nos basta, pelo menos por um tempo, para<br />
o conforto corporal e a saúde mental”.<br />
É muito interessante tudo isso. Até agora eu tive<br />
contato com uma maioria de pessoas transexuais<br />
que têm a necessidade de transformar o corpo.<br />
Uma vez eu tive uma discussão sobre o seguinte<br />
tema: o que obriga, o que faz com que uma pessoa<br />
transexual queira mudar tanto o corpo dela? Ela<br />
tem que ter uma vagina para ser mulher ou um<br />
pênis para ser homem?<br />
Antes de fazer a cirurgia, muitas<br />
vezes, a pessoa está no embate<br />
político de que não há a necessidade<br />
de mudar o corpo totalmente.<br />
Até agora eu tomei contato com pessoas transexuais,<br />
algumas com outras opiniões, mas elas,<br />
em sua maioria, querem transformar o seu corpo.<br />
Assim o discurso é um antes da cirurgia, muitas<br />
vezes de<strong>sp</strong>atologizante; mas essa opinião é outra<br />
depois do procedimento. É incrível isso.<br />
Antes de fazer a cirurgia, muitas vezes, a<br />
pessoa está no embate político de que não há a<br />
necessidade de mudar o corpo totalmente. Ela<br />
começa, então, com um processo, que o Ministério<br />
da Saúde está chamando de transexualizador.<br />
Vamos refletir um pouco sobre isso: o processo<br />
pode ser transformador, mas não é transexualizador,<br />
porque não tem o objetivo de “transexualizar”<br />
ninguém. Então, quando a pessoa começa a entrar<br />
nesse processo, ela inicia a hormonização.<br />
Conforme essa pessoa faz o trabalho de hormonização,<br />
ela vai se transformando naquilo que<br />
realmente sente que é, e decide fazer uma cirurgia.<br />
Quando a cirurgia é feita, na prática, ela não<br />
quer mais falar desse assunto, não quer mais ser<br />
vista como transexual, mas sim como mulher ou<br />
homem, porque existe essa pressão toda que a sociedade<br />
impõe para ser homem e para ser mulher.<br />
Então, está aqui a questão: por que é tão forte,<br />
para essas pessoas com quem eu venho tomando<br />
contato há 19 anos, a necessidade de transformar<br />
esse corpo?<br />
Quando falamos de transexual, falamos da<br />
pessoa que nasce com um corpo de homem. Por<br />
exemplo, ela desde os três, quatro anos de idade,<br />
começa a construir sua identidade sexual, já se<br />
sente em outro gênero, não se sente no gênero<br />
que ela nasceu, não se sente com o corpo com o<br />
qual nasceu. Ela vai, ao longo da vida, sentindo<br />
isso e muitas vezes até vestindo um personagem<br />
que não é para poder sobreviver, entrar em uma<br />
universidade, por exemplo, para poder ser aceita<br />
pela família. E a pressão familiar é tão grande,<br />
que essa pessoa passa a fazer até o que a família<br />
quer para ter apoio.<br />
Há pessoas que casam, têm filhos e depois<br />
de uma idade, de uma possibilidade, porque na<br />
cabeça dela sentiu que teve essa possibilidade,<br />
ela faz uma transformação total no corpo e aceita<br />
que pode fazer isso, sendo que isso, segundo ela,<br />
ficou guardado desde a infância.<br />
Esse é o processo com que eu tenho tomado<br />
contato no meu trabalho, pessoas que estão necessitando<br />
fazer uma transformação do corpo e<br />
precisam ser aceitas, isso tem a ver com transfobia.<br />
Nós falamos em homofobia, mas a transfobia é<br />
justamente isso, é esta visão de que essa pessoa<br />
está fora das normas. Ela provoca medo, ódio e<br />
muitas vezes, a visão de que a pessoa é doente,<br />
que tem que ser cuidada e tratada.<br />
Outra coisa que traz a transfobia é a não-<br />
-visão, é o não ver essa pessoa como ela se sente.<br />
Não podemos chegar para uma pessoa que se diz<br />
transexual e dizer que ela não é, sendo que é ela