Psicologia e Diversidade Sexual - CRP sp
Psicologia e Diversidade Sexual - CRP sp
Psicologia e Diversidade Sexual - CRP sp
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
mentos das forças discriminatórias e excludentes,<br />
porém nem toda travesti tem a oportunidade de<br />
ser preparada para confrontar os processos de<br />
normatização e reivindicar seus direitos. Geralmente,<br />
vivem em uma condição que apenas lhes<br />
é permitido situar-se como outsider, como fora<br />
da norma, e nesta situação perdem a crença em<br />
si mesmas, muitas vezes acreditando que só podem<br />
viver como corpos abjetos, pré-sujeitos, sem<br />
direitos de ir e vir, de circular pelo mundo como<br />
qualquer outra pessoa de direito. De acordo com<br />
Judith Butler (2000, p. 155) podemos entender o lugar<br />
da abjeção como “precisamente aquelas zonas<br />
‘inó<strong>sp</strong>itas’ e ‘inabitáveis’ da vida social que são,<br />
não obstante, densamente povoadas por aqueles<br />
que não gozam do status de sujeito, mas cujo habitar<br />
sob o signo do ‘inabitável’ é necessário para<br />
que o domínio do sujeito seja circunscrito”. É nesta<br />
direção que encontramos na máxima de Deleuze<br />
(1990), uma possibilidade de clarificação, pois:<br />
Acreditar no mundo é o que mais nos falta; perdemos<br />
o mundo, ele nos foi tomado. Acreditar no mundo<br />
é também suscitar acontecimentos, mesmo que<br />
pequenos, que escapem do controle, ou então fazer<br />
novos e<strong>sp</strong>aços-tempos, mesmo de superfície e volume<br />
reduzidos. É no nível de cada tentativa que são julgadas<br />
a capacidade de resistência ou, ao contrário, a<br />
submissão a um controle. São necessários, ao mesmo<br />
tempo, criação e povo. (DELEUZE, 1990, p. 73)<br />
(...) nem toda travesti tem a<br />
oportunidade de ser preparada<br />
para confrontar os processos de<br />
normatização e reivindicar seus<br />
direitos.<br />
Ao contrário do processo de empoderamento, as<br />
pessoas que fogem às normas de sexo/gênero/desejo<br />
regulados pela norma heterossexual, se não<br />
encontram fortalecimento nas relações positivas<br />
de pertença, tornam-se enfraquecidas diante das<br />
experiências de estigmatização que, por si mes-<br />
Apesar de não termos dados oficiais<br />
de pesquisas a re<strong>sp</strong>eito da saúde<br />
mental das travestis e transexuais, o<br />
convívio com sua comunidade permite<br />
algumas inferências preocupantes.<br />
mas, geram sensações de angústias, depressões<br />
e outros adoecimentos físicos e psíquicos.<br />
As experiências de estigmatização que enfraquece<br />
a potência de vida dessas pessoas não se<br />
restringem ao e<strong>sp</strong>aço doméstico, mas se estendem<br />
pelas vizinhanças, escolas, ho<strong>sp</strong>itais, serviços de<br />
saúde, segurança pública, enfim, se processam<br />
nos mais diversos e<strong>sp</strong>aços de circulação social<br />
das travestis.<br />
Apesar de não termos dados oficiais de pesquisas<br />
a re<strong>sp</strong>eito da saúde mental das travestis<br />
e transexuais, o convívio com sua comunidade<br />
permite algumas inferências preocupantes. Por<br />
exemplo, o grande número de pessoas travestis<br />
e transexuais que reclamam ou que se mostram<br />
em estado de depressão – dados também encontrados<br />
por Pelúcio (2005) – ou ainda, expressando<br />
graus elevados de ansiedade ou desânimo frente à<br />
vida e de total descrédito com ela. Em casos mais<br />
extremos, vemos notícias sobre altos índices de<br />
morbidade e mortalidade por overdose de drogas,<br />
ou incidências sobre práticas de suicídio, quando<br />
não são assassinadas com requintes de crueldade.<br />
Como recorte possível dentro da complexidade<br />
relacional das travestis e buscas de re<strong>sp</strong>ostas para<br />
solucionar suas demandas existenciais, apresentamos<br />
algumas reflexões para o debate.<br />
Nos últimos anos, a partir de negociações da<br />
Articulação Nacional das Travestis e das diversas<br />
organizações que a compõe, com alguns setores<br />
da organização governamental, além dos projetos<br />
voltados para a prevenção e assistências às DSTS/<br />
HIV/Aids/Hepatite, financiados pelo governo brasileiro,<br />
as problematizações em torno da violação<br />
dos direitos humanos, a emergência de uma pauta<br />
de discussão sobre os direitos sexuais e sobre a<br />
construção da cidadania deu início à um processo<br />
81<br />
CADERNOS TEMÁTICOS <strong>CRP</strong> SP <strong>Psicologia</strong> e diversidade sexual