Psicologia e Diversidade Sexual - CRP sp
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Considerando as dificuldades das travestis em<br />
estudarem (a discriminação e exclusão nas escolas<br />
também são intensas) e/ou profissionalizarem, de<br />
conseguir empregos para garantias mínimas de<br />
suas sobrevivências, são empurradas a marginalidade<br />
restando como única forma de sobrevivência<br />
a prostituição, compondo um imaginário que naturaliza<br />
a associação das travestis com a prostituição.<br />
Como contraposição, encontramos travestis<br />
que tiveram algum tipo de sorte e trabalham em<br />
diversos ofícios, inclusive em nível universitário.<br />
Deste modo, deixemos claro que travesti não é<br />
sinônimo de prostituição e que, se ocupa esse<br />
lugar no mundo, isso ocorre em consequências das<br />
diversas desigualdades sociais, políticas, raciais,<br />
sexuais e de gêneros que incide sobre seus corpos.<br />
Porém, encontramos certa negatividade moral<br />
presente nas relações humanas que acabam interferindo<br />
em um possível acolhimento das pessoas<br />
travestis, marcados pela presença de preconceitos<br />
e/ou dificuldades de lidar com as diferenças. O<br />
encontro com o estranho, o diferente, o queer, pode<br />
di<strong>sp</strong>arar sensações, pensamentos e ações de toda<br />
ordem, mesmo porque, tendemos a ficar ansiosos<br />
diante do novo. Podem emergir fantasias sexuais<br />
Considerando as dificuldades das<br />
travestis em estudarem (...) e/<br />
ou profissionalizarem (...) são<br />
empurradas a marginalidade<br />
restando como única forma de<br />
sobrevivência a prostituição (...).<br />
positivas, mas também fantasias destrutivas nas<br />
pessoas, que não só as impossibilitam de aproximação<br />
com as travestis, como também de atendê-la<br />
adequadamente, surgindo a travestifobia nas relações<br />
dos operadores da saúde e outras instâncias<br />
com as travestis, nas mais variadas intensidades.<br />
Conclusão<br />
O momento primeiro do encontro das pessoas<br />
com uma travesti é sempre perturbador, evo-<br />
cando fantasias arcaicas e atualizadas entorno<br />
das sexualidades, dos corpos e seus prazeres. A<br />
rigidez com que somos constituídos por meio de<br />
uma classificação hard dos modos masculinos e<br />
femininos de ser diante das expressões de gêneros<br />
nos impede de termos tranquilidade frente às<br />
pessoas que apresentam um sexo genital masculino<br />
e uma identidade social de gênero feminina<br />
(ou vice-versa).<br />
Para as pessoas que foram intensamente construídas<br />
pelos processos de subjetivação normatizadores<br />
e que se tornaram “viciados e dependentes<br />
de identidade”, logo, “viciados e defensores das<br />
normas”, ao se depararem com as travestis propondo<br />
identidades estranhas aos seus universos<br />
de referências, tem nos seus corpos os di<strong>sp</strong>aros<br />
de fantasias, desejos, medos e ansiedades que<br />
as tornam perturbadas, aproximando-as de um<br />
estado de ‘non sense’, no qual os códigos de inteligibilidade<br />
se embaralham e suas referências até<br />
então tidas como certas e absolutas, já não servem<br />
mais como referências analíticas.<br />
A outra entrada nos permite problematizar<br />
as travestis como expressão de resistências ao<br />
biopoder, de enfrentamento aos processos seculares<br />
de normatização e a emergência de novas<br />
expressões existenciais que se efetuam como<br />
estilísticas da existência, confirmando a leitura<br />
feita por Foucault (1985) de que onde há poder<br />
há resistência.<br />
Nossa concepção estilística da existência nos remete<br />
a pensar as travestis como pessoas que criam<br />
suas existências como um continuum exercício de<br />
liberdade, como expressão dos efeitos de subjetivação<br />
que permitem às mesmas fazerem de suas vidas<br />
admiráveis obras de arte. A construção da estilística<br />
da existência por meio de seus corpos e prazeres<br />
faz com que as travestis se tornem guerreiras da<br />
cidadania, “pero sin perder el glamour jamás”.<br />
As travestis denunciam a crise dos paradigmas<br />
e das referências sobre as identidades sexuais e<br />
de gêneros que se processa dentro de um registro<br />
binário, abalando todas as certezas que insistem<br />
na efetuação de verdades absolutas e acabadas<br />
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CADERNOS TEMÁTICOS <strong>CRP</strong> SP <strong>Psicologia</strong> e diversidade sexual