Psicologia e Diversidade Sexual - CRP sp
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O direito ao reconhecimento da vida<br />
a dois, seja lá que nome tenha, é uma<br />
bandeira e virou tema da Parada<br />
LGBT há tempo.<br />
cação. E mesmo a conjugalidade recebe diferentes<br />
nomes como casamento, parceria, parceria civil.<br />
De todo jeito, o direito ao reconhecimento da vida<br />
a dois, seja lá que nome tenha, é uma bandeira e<br />
virou tema da Parada LGBT há tempo. A parentalidade,<br />
no entanto, pelo menos nos últimos anos<br />
tem sido tratada no Rio mais como uma questão<br />
de cunho privado. Quando chega alguém em um<br />
grupo LGBT precisando de uma ajuda, de assessoria<br />
jurídica, um encaminhamento psicológico,<br />
um esclarecimento sobre parentalidade, este é<br />
prestado, mas não aparece como bandeira do<br />
movimento. Quando começamos a pesquisa, esta<br />
questão da parentalidade só aparecia quando a<br />
gente provocava. No discurso militante que encontramos<br />
pareceu haver certa hierarquização de<br />
direitos a conquistar e a parentalidade está longe<br />
do início da lista. Como se fosse preciso obter<br />
direitos básicos primeiro, que seriam os de ser<br />
re<strong>sp</strong>eitado na rua, poder andar em público com<br />
seus parceiros sem ser molestado ou violentado de<br />
formas variadas, poder manifestar carinho, amor,<br />
atração de forma mais livre. Na sequência viria a<br />
conjugalidade, benefícios e direitos decorrentes<br />
desse reconhecimento e outros a partir daí.<br />
No doutorado trabalhei com entrevistas e<br />
com análise de processos. E uma frase de uma<br />
assistente social me chamou muito a atenção. Ela<br />
dizia: “Homossexual ter filho é que nem comer<br />
bife de soja”. Essa coisa da estranheza. Como se<br />
algo estivesse errado, fora do lugar. Eu fiquei me<br />
perguntando: e qual é o discurso que aparece, que<br />
é oferecido, que é utilizado nas entrevistas que eu<br />
fiz? O discurso mais politicamente correto, que diz<br />
inclusive que não tem problema o homossexual<br />
ter filho. Tem duas questões curiosas aí que apareceram<br />
mais nos processos, mas que falam sobre<br />
o posicionamento dos técnicos. Uma é essa ideia<br />
de que essa parentalidade homossexual tem que<br />
ser monoparentalidade. Qualquer pessoa heterossexual<br />
que chegue lá na Vara para adotar uma<br />
criança vai se levar em consideração se ela consegue<br />
fazer vínculo, se ela tem um relacionamento<br />
estável, se ela já teve na vida – ela não precisa ter<br />
naquele momento, inclusive porque ela não precisa<br />
adotar em conjunto, a lei não exige um casal.<br />
Mas será que ela é capaz de manter uma relação<br />
estável? Isto é uma das questões que são avaliadas.<br />
Podemos discutir se são pertinentes ou não, não é<br />
o caso aqui, mas é uma questão importante para<br />
ser avaliada. É curioso que quando o homem se<br />
declarava gay, uma das preocupações da equipe<br />
técnica era, pelo menos do que eu pude apreender<br />
lendo os processos, se ele tinha ou não parceiro.<br />
E ter um parceiro, no caso deles, era sinônimo de<br />
risco, não era bem avaliado, como no padrão de<br />
adoção. Isso de forma sutil. No entanto, apesar de<br />
não ser dito explicitamente pelos técnicos re<strong>sp</strong>on-<br />
Uma é essa ideia de que essa<br />
parentalidade homossexual tem que<br />
ser monoparentalidade.<br />
sáveis pelas entrevistas, havia nos processos um<br />
monte de promessas dos sujeitos de que não iriam<br />
namorar, de que não teriam nenhuma relação<br />
estável até que a criança ficasse grande.<br />
Há certa subversão da ordem nesse sentido,<br />
na medida em que se escapa do script do que é<br />
detectado como bons candidatos à adoção. Esses<br />
atributos comuns e acordados não são buscados.<br />
É muito curioso, quer dizer, que mecanismo é esse<br />
que faz com que se subverta a ordem? Essa ideia da<br />
promiscuidade, esse medo do abuso sexual, isso é<br />
muito mais forte que algo que se acha importante<br />
para o exercício da parentalidade. E o sujeito fica<br />
sem saída, porque se diz que tem um parceiro, é<br />
um risco potencial de a criança ser abusada pelo<br />
casal ou por um com a conivência do outro. Se não<br />
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CADERNOS TEMÁTICOS <strong>CRP</strong> SP <strong>Psicologia</strong> e diversidade sexual