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Hipólito e Fedra nos caminhos de um mito - Universidade de Coimbra

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Do amor como <strong>de</strong>sconhecimento<br />

acaso, acaba por irritar o espectador e o leitor ao ponto <strong>de</strong> sentir justificável a<br />

vingança <strong>de</strong> <strong>Fedra</strong>, que consegue ser mais maligna ainda do que a <strong>de</strong> Cípris.<br />

Porque <strong>Fedra</strong>, ao saber do vitupério <strong>de</strong>smedido <strong>de</strong> <strong>Hipólito</strong> contra ela e<br />

contra as mulheres em geral, <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> c<strong>um</strong>prir sua sentença <strong>de</strong> morte contra si<br />

mesma – mas <strong>de</strong> modo a também estragar a vida do sujeito que a <strong>de</strong>sprezou<br />

tão acintosamente (vv. 725-731):<br />

Darei prazer a Cípris, que me <strong>de</strong>struiu, ao abandonar hoje mesmo a vida. É<br />

amargo o amor que me vitimará. Mas tornar-me-ei, ao morrer, fatal a <strong>um</strong> outro,<br />

para que ele aprenda a não ser altivo em relação à minha infelicida<strong>de</strong>. Será ao<br />

partilhar comigo da mesma doença que apren<strong>de</strong>rá a castida<strong>de</strong>.<br />

Amaldiçoada, <strong>Fedra</strong> sai da vida amaldiçoando – mas o faz como <strong>um</strong>a<br />

boa grega, isto é, pedagogicamente: “para que ele aprenda a não ser altivo”. É<br />

preciso ensinar sempre, mesmo como último gesto.<br />

Como último gesto, <strong>Fedra</strong> se enforca. Alertado pela gritaria das criadas,<br />

Teseu entra no aposento (e na peça) convenientemente nesta hora. Vê o cadáver<br />

da esposa, já estendido no leito, mas com <strong>um</strong>a pequena tábua pendurada do<br />

pulso. Ao retirá-la e lê-la, o rei exclama, <strong>de</strong>sesperado: “Esta tabuinha grita –<br />

grita coisas horrendas!” (vv. 877-878).<br />

No pequeno pedaço <strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira, <strong>Fedra</strong> escrevera que <strong>Hipólito</strong> a tomara<br />

à força na própria cama do casal. Teseu, filho <strong>de</strong> Posídon, se lembra que seu<br />

divino pai lhe prometera três graças – ou três <strong>de</strong>sgraças, como preferisse. Então<br />

ele invoca o <strong>de</strong>us dos mares para atendê-lo e aniquilar o seu próprio filho. O<br />

Coro se escandaliza, diz que em breve o rei perceberá o quanto se encontra<br />

enganado, pe<strong>de</strong>-lhe que recue do seu pedido insensato, mas o rei não aten<strong>de</strong>,<br />

ao contrário: <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> exilar o filho para que ele sofra <strong>de</strong> qualquer modo, mesmo<br />

que escape <strong>de</strong> Posídon.<br />

<strong>Hipólito</strong> chega neste momento, assusta-se com a morte <strong>de</strong> <strong>Fedra</strong> e <strong>de</strong>mora<br />

a enten<strong>de</strong>r por que o pai lhe transmite tanto rancor. Teseu, indignado com o<br />

aparente cinismo do filho, o acusa diretamente, na acusação <strong>de</strong>stacando a sua<br />

arrogância <strong>de</strong> querer sempre se mostrar melhor e mais puro do que os <strong>de</strong>mais<br />

(vv. 949-957):<br />

Com que então é como homem especial que convives com os <strong>de</strong>uses, casto e<br />

puro <strong>de</strong> qualquer malda<strong>de</strong>? Não me <strong>de</strong>ixaria convencer pelas tuas gabarolices, a<br />

ponto <strong>de</strong> atribuir aos <strong>de</strong>uses falta <strong>de</strong> inteligência. Agora bem te po<strong>de</strong>s pavonear.<br />

Com a tua alimentação vegetariana, convertes as pessoas aos cereais e, com<br />

Orfeu por senhor, <strong>de</strong>lira à vonta<strong>de</strong>; presta as <strong>de</strong>vidas honras ao f<strong>um</strong>o <strong>de</strong> muitos<br />

escritos – pois foste apanhado! Or<strong>de</strong>no a todos que fujam <strong>de</strong> gente <strong>de</strong>sta laia.<br />

Caçam-<strong>nos</strong> com palavras altissonantes, mas na verda<strong>de</strong> andam a preparar<br />

coisas vergonhosas.”<br />

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