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Hipólito e Fedra nos caminhos de um mito - Universidade de Coimbra

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Conselheiras, alcoviteiras e feiticeiras<br />

Conselheiras, alCoviteiras e feitiCeiras:<br />

semelhanças entre a personagem da ama, no <strong>Hipólito</strong> <strong>de</strong><br />

eurípi<strong>de</strong>s, e Celestina, em la Celestina <strong>de</strong> fernando <strong>de</strong> rojas<br />

Ana Cecilia Rivaben<br />

Universida<strong>de</strong> Nacional <strong>de</strong> Mar <strong>de</strong>l Plata<br />

Na história da literatura grega surgem velhas criadas que <strong>de</strong>sempenham por<br />

certo <strong>um</strong> papel tradicional: manifestam-se sempre <strong>de</strong> forma anónima à sombra<br />

da sua senhora. Ainda que estas amas fiéis não tenham sido protagonistas,<br />

ocuparam <strong>um</strong> lugar <strong>de</strong> <strong>de</strong>staque graças aos valores que <strong>de</strong>tinham, concordantes<br />

com a sua longevida<strong>de</strong>: o <strong>de</strong> serem conselheiras pru<strong>de</strong>ntes e dignas <strong>de</strong> confiança.<br />

É esse o caso, por exemplo, <strong>de</strong> Eurínome, apresentada por Homero mais como<br />

a querida ama <strong>de</strong> criação do que a velha escrava <strong>de</strong> Penélope, ou a ama <strong>de</strong><br />

Me<strong>de</strong>ia, que logo no monólogo inicial se sente aterrorizada ante a atitu<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>cidida <strong>de</strong> vingança da sua senhora, por ter sido “<strong>de</strong>sonrada” e “ultrajada” ou<br />

“h<strong>um</strong>ilhada”.<br />

Não obstante, nem todas as amas da épica e da cena teatral tiveram o<br />

papel distinto <strong>de</strong> serem “a pru<strong>de</strong>nte conselheira”. Assim, no presente estudo,<br />

por comparação com a personagem tradicionalmente virtuosa da velha criada<br />

que nunca ultrapassa as funções próprias da sua condição servil, começaremos<br />

por analisar a figura controversa da Ama <strong>de</strong> <strong>Fedra</strong> que, exce<strong>de</strong>ndo-se nas<br />

suas funções, se revela, no seu papel <strong>de</strong> alcoviteira, como o instr<strong>um</strong>ento<br />

fatídico que <strong>de</strong>senca<strong>de</strong>ará a catástrofe final: o suicídio <strong>de</strong> <strong>Fedra</strong> e a morte <strong>de</strong><br />

<strong>Hipólito</strong>, amaldiçoado pelo próprio pai. Finalmente, n<strong>um</strong> segundo momento,<br />

procuraremos <strong>de</strong>monstrar alg<strong>um</strong>as similarida<strong>de</strong>s entre esta personagem e a<br />

<strong>de</strong> Celestina, na obra homónima <strong>de</strong> Fernando <strong>de</strong> Rojas, sobretudo em dois<br />

aspetos em particular: o da intermediação e o do conhecimento <strong>de</strong> sortilégios,<br />

palavras mágicas e feitiços.<br />

A Ama como instr<strong>um</strong>ento do trágico <strong>de</strong>stino dos protagonistas<br />

“Os homens que criam as personagens da tragédia antiga conhecem o orgulho<br />

<strong>de</strong> se saberem <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> <strong>de</strong>uses, e as suas primeiras personagens foram<br />

as <strong>mito</strong>lógicas, as que <strong>de</strong>terminavam o livre arbítrio h<strong>um</strong>ano. No teatro grego<br />

(...), pela porta central apenas entravam personagens olímpicos, heróis e <strong>de</strong>uses.<br />

Pelas portas laterais os mensageiros, os subalter<strong>nos</strong>, os criados. Há, portanto,<br />

classes entre as personagens <strong>de</strong> ficção. A aristocracia que governa a cida<strong>de</strong><br />

governa também o seu reflexo cénico. (...) A honra, a dignida<strong>de</strong>, as paixões<br />

interessam apenas quando relativas às personagens elevadas (...). Contudo, para<br />

eles a dignida<strong>de</strong> é cénica. (G. Díaz-Plaja 1965: 53).<br />

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